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sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A hora das políticas sociais responsáveis


Mesmo na crise, o Brasil tem agora oportunidade de diminuir fortemente a pobreza

Os governos enfrentam e enfrentaram as crises e as dificuldades das instituições financeiras se utilizando de diversos instrumentos. Até o momento, foram bem sucedidos. Os keynesianos aplaudiram as políticas de resgate das instituições e o enfrentamento das dificuldades no âmbito da economia financeira porque sabem da necessidade do sistema financeiro para que haja um bom funcionamento do sistema produtivo. Keynesianos sabem que o sistema financeiro não produz um prego sequer, mas sabem que sem ele nem sequer um prego será produzido. Muitos, entretanto, aplaudiram os governos simplesmente porque ganham quando o setor público privatiza seus ativos ou quando estatiza as dívidas privadas.

O mundo encontra-se numa segunda fase da crise. A crise saiu do âmbito da economia financeira. Já contaminou decisões empresariais de investimento e decisões de gasto por parte dos trabalhadores. O risco é que haja uma parada súbita de fluxos monetários e reais. A política fiscal de gastos deve ser utilizada como estabilizadora da trajetória de crescimento econômico. Quando o setor privado está gastando de forma intensa, o setor público deve reduzir os seus gastos. Quando o setor privado ameaça estancar o seu fluxo de gastos, o setor público deve elevar os seus gastos. Essa formula é velha. Foi ensinada pelo economista que virou fashion: J. M. Keynes. Mas a fórmula keynesiana não se restringe a realizar ou cortar gastos públicos.

A fórmula relaciona quantidade à qualidade do gasto. Terá maior qualidade aquele gasto que tem o maior efeito multiplicador na economia. É considerado um gasto de baixa qualidade aquele gasto que se transforma em renda daqueles que não têm uma alta propensão a gastar aquilo que recebem, porque tem um baixo multiplicador. O investimento em obras públicas contrata vastos contingentes (elevada quantidade) de trabalhadores que gastam tudo o que recebem (alta qualidade). As políticas sociais para Keynes não são políticas que deveriam estar relacionadas com os ciclos econômicos. Elas deveriam estar relacionadas com o objetivo de redução plena das vulnerabilidades sociais.

Entretanto, dadas as evidentes vulnerabilidades da grande parte da população brasileira, a ampliação da cobertura dos programas sociais, assim como o aumento real dos benefícios previdenciários e sociais, cujo valor do salário mínimo é parte integrante, tornam-se nesse momento uma política fiscal de gastos anti-cíclica. Em outras palavras, políticas sociais são indissociáveis de um projeto de desenvolvimento de longo prazo.

Contudo, hoje no Brasil, frente à ameaça de uma crise de parada brusca dos fluxos monetários e reais, o aprofundamento das políticas sociais cumprirá o objetivo macroeconômico de curto prazo de auxiliar a manutenção da rota de crescimento, tal como a política de investimentos públicos do PAC. Políticas sociais realizam gastos em volumes consideráveis e realizam um gasto de alta qualidade.

Para evidenciar tal assertiva, simulamos duas dinâmicas diferenciadas de evolução do valor dos rendimentos do trabalho, aposentadorias e pensões e também benefícios assistenciais, a partir dos dados da Pnad 2007. Na primeira simulação, limitamo-nos a um reajuste linear de 12,3% para todos esses rendimentos, índice obtido tomando-se o INPC acumulado no período outubro de 2007 a outubro de 2008, e a inflação futura estimada para 2009 (4,5%). A segunda simulação envolveu variações distintas para cada tipo de rendimento, levando em consideração a proposta do governo de elevar para R$ 464,78 o valor do salário mínimo em fevereiro de 2009, bem como a recente decisão da Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado que, ao aprovar substitutivo ao Projeto de Lei n. 58/03, concede às aposentadorias e pensões até o teto previdenciário, reajuste igual ao do salário mínimo.

Assim, corrigimos esses benefícios previdenciários em 17%, combinando o reajuste de 5% de 2008 e o previsto em 2009 para o salário mínimo, acompanhando a decisão da CAS. Demais valores de remuneração do trabalho - diferentes de um salário mínimo - foram reajustados em 14,8% (além de incorporar a inflação acumulada e a prevista, considerou 1,5% de aumento real médio dos salários observado em 2008 e mais 1% para 2009). Os benefícios assistenciais foram corrigidos pelo índice de 12,3%. Porém, dada a importância do crescimento econômico na geração de novos postos de trabalho, estimamos, com base na variação do PIB para 2008 e 2009, a criação de 10,2 milhões de empregos. Destes, perto de 55% seriam formais, com remuneração pelo piso salarial (projeção conservadora posto que 92,1% dos empregos criados no decorrer deste ano estão na faixa de até 3 salários mínimos), enquanto os informais receberiam o valor médio observado em 2007, mas atualizado para 2009, pelo INPC. Na simulação 2, estes empregos foram distribuídos aleatoriamente centenas de vezes entre os desocupados e os trabalhadores precários, até obtermos uma distribuição média.

O paralelo entre a simulação 1 e a simulação 2 demonstrou que preservar a trajetória de recuperação do mínimo e atualizar os benefícios assistenciais e previdenciários tem retornos significativos do ponto de vista do consumo agregado e do bem-estar da população, contribuindo para manter aquecida a atividade econômica.

Assim, constatamos que a simulação 2 leva a um aumento importante da renda familiar per capita média nos décimos inferiores da distribuição, exatamente aqueles cuja propensão a consumir é elevadíssima. É factível considerar, apoiados em resultados da POF 2003, que até o sétimo décimo da distribuição tal propensão seja superior a 90%. Ou seja, 70% da população, cerca de 128,8 milhões de indivíduos, terão um aumento real médio de sua renda mensal per capita da ordem de 21%, que vai se transformar em mais consumo. Isso significa R$ 6 bilhões mensais a mais na economia real, ou R$ 72 bilhões ao longo do ano de 2009.

Não bastasse o multiplicador do consumo ser ampliado, haveria uma forte redução da pobreza, pois o percentual de pessoas vivendo abaixo da linha do Bolsa Família cairia de 17%, registrado na simulação 1, para 13,5%, resultado alcançado na simulação 2. São 5 milhões a menos de pobres.

Tudo isso é para agora, se for possível ao governo governar para superar a crise em prol do emprego e da atividade econômica. A hora das políticas sociais responsáveis, no seu escopo, escala e qualidade, é essa.

Artigo do professor João Sicsú, economista do IPEA, vinculado ao Ministério do Planejamento.

9 comentários:

Anônimo disse...

Excelente artigo.

Carlos Eduardo da Maia disse...

Eu não entendo mais nada. Ali abaixo este blog disse que o sistema financeiro é "uma classe de parasitas". E agora aqui, neste post, o Sicsu diz que é necessário "o sistema financeiro para que haja um bom funcionamento do sistema produtivo." Também achei bom o artigo, mas, como sempre, a "teoria na prática é outra". E que bom que certa esquerda está aprendendo a falar a linguagem correta do tipo: temos sim que qualificar os gastos públicos. Esse tipo de linguagem, há algum tempo, era de gente "neoliberal".

Anônimo disse...

Anta das antas, o Sicsú cita Keynes, sua anta atolada.
Keynes.

Ali abaixo é Marx.

Olha o alemão....

Carlos Eduardo da Maia disse...

Zozé, definitivamente Marx está superador por Keynes.

Anônimo disse...

Maia, o rádio supera a TV? Ou se junta a ela e fazem uma comunicação mais universal?

Anônimo disse...

E vocês ainda respondem ao bichinho escroto da maia, aquele que leu e não entendeu, (ou se faz de bobo para passar bem)!

Carlos Eduardo da Maia disse...

Bela resposta, Prieb. Vamos a essa luta. Nessa luta estou dentro.

Anônimo disse...

Acabei de voltar da palestra do Sicsú no sindbancários. Muito ruim. Sinceramente, no atual estágio, o Keynesianismo serve para sustentar o regime e o capital. Para eles não existe contradição nenhuma. Assim como Obama da nouva roupagem ao império, Keynes é a nova (velha) roupa do rei. Uma pena que ele está pelado... Voltemos ao fordismo? Não foi o esgotamento deste que levou ao crescimento do bolo financeiro? Kurtz e Chomsky seguem uma linha mais correta. Aliás qlquer marxista.

Faço um apelo para qem ainda é de esquerda aqui, Keynes foi útil na era neoliberal, na sua crise, ABEMOS MARX!!!!!!!!!!!

Anônimo disse...

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