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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007


Passagem do ano

O último dia do ano
não é o último dia do tempo.
Outros dias virão
e novas coxas e ventres te comunicarão o calor da vida.
Beijarás bocas, rasgarás papéis,
farás viagens e tantas celebrações
de aniversário, formatura, promoção, glória, doce morte com sinfonia e coral,
que o tempo ficará repleto e não ouvirás o clamor,
os irreparáveis uivos
do lobo, na solidão.

O último dia do tempo
não é o último dia de tudo.
Fica sempre uma franja de vida
onde se sentam dois homens.
Um homem e seu contrário,
uma mulher e seu pé,
um corpo e sua memória,
um olho e seu brilho,
uma voz e seu eco,
e quem sabe até se Deus...

Recebe com simplicidade este presente do acaso.
Mereceste viver mais um ano.
Desejarias viver sempre e esgotar a borra dos séculos.
Teu pai morreu, teu avô também.
Em ti mesmo muita coisa já expirou, outras espreitam a morte,
mas estás vivo. Ainda uma vez estás vivo,
e de copo na mão
esperas amanhecer.

O recurso de se embriagar.
O recurso da dança e do grito,
o recurso da bola colorida,
o recurso de Kant e da poesia,
todos eles... e nenhum resolve.

Surge a manhã de um novo ano.

As coisas estão limpas, ordenadas.
O corpo gasto renova-se em espuma.
Todos os sentidos alerta funcionam.
A boca está comendo vida.
A boca está entupida de vida.
A vida escorre da boca,
lambuza as mãos, a calçada.
A vida é gorda, oleosa, mortal, sub-reptícia.

Carlos Drummond de Andrade

.....

Que 2008 lhes seja leve!

Feliz Ano Novo

- Sim, querida, participei de esquemas de corrupção. Desviei verbas, superfaturei obras, comprei votos, lesei o erário público... mas, saiba que lá no fundo do coração, faço votos que em 2008, você fique de bico calado!

By Angeli

O exercício do pensamento está morto na mídia, hoje

Livro interessante esse "Simulacro e poder - uma análise da mídia", de Marilena Chauí (Editora Perseu Abramo, 142 páginas), que trata das mudanças sofridas pelos meios de comunicação na passagem da sociedade capitalista industrial para a pós-industrial. Um trecho:

Com o modelo fordista, o capital induzira o aparecimento de grandes fábricas (nas quais se tornavam visíveis as divisões sociais, a organização das classes e a luta de classes) e ancorara-se na prática de controle de todas as etapas da produção (da extração da matéria-prima à distribuição do produto no mercado de consumo), bem como nas idéias de qualidade e durabilidade dos produtos (levando, por exemplo, à formação de grandes estoques para a travessia dos anos).

Por outro lado, Marilena destaca os seguintes tópicos na fase dita pós-industrial:

1) a fragmentação e a dispersão da produção econômica (incidindo diretamente sobre a classe trabalhadora, que perde seus referenciais de identidade, de organização e de luta);
2) a hegemonia do capital financeiro;
3) a rotatividade extrema da mão-de-obra;
4) os produtos descartáveis (com o fim das idéias de durabilidade, qualidade e estocagem);
5) a obsolescência vertiginosa das qualificações para o trabalho em decorrência do surgimento incessante de novas tecnologias; e
6) o desemprego estrutural, decorrente da automação e da alta rotatividade da mão-de-obra, causando exclusão social, econômica e política.

Posto isso, a autora passa a analisar o impacto dessas mudanças na maneira de o cidadão comum perceber o mundo a sua volta. Prevalece o fugaz, perde-se a noção de continuidade e prejudica-se ao extremo a compreensão espaço-temporal. De modo que prevalecem o imediatismo impensado, a reação instintiva e a falta de perspectiva histórica.

Citando Maurice Blanchot:

A prática é substituída pelo pseudoconhecimento, pelo olhar irresponsável, por uma contemplação superficial, despreocupada e satisfeita. O mundo vira espetáculo do espetáculo da comunicação.

Assim podemos compreender porque as reportagens, sobretudo aquelas veiculadas pelos meios eletrônicos - veículos pós-industriais por excelência - raramente apresentam matérias contextualizadas. Os porquês desaparecem e dão lugar ao sensacionalismo, mais eficaz para prender a audiência e, consequentemente, faturar com a venda de espaços publicitários. Para exemplificar esse modo superficial de fazer jornalismo, Marilena Chauí relembra os atentados de 2001 nos EUA:

Subitamente, o Afeganistão passou a existir. Sua existência, porém, foi a de um espetáculo de rádio e televisão, tanto assim que, decorridos alguns meses e terminada a invasão norte-americana, desapareceu dos meios de comunicação e muita gente já não se lembra que esse país existe.

A autora não deixa de enfatizar o que Ignácio Ramonet já havia assinalado em seu "A tirania da comunicação", ou seja, o paradoxo que reside no cada vez maior volume de informações disponíveis em razão da evolução da tecnologia ao mesmo tempo em que as pessoas estão cada vez menos informadas. Em lugar do desenvolvimento calcado no aprofundamento e na democratização do conhecimento, o resultado foi que:

"A atenção e a concentração, a capacidade de abstração intelectual e de exercício do pensamento foram destruídas" - completa Marilena Chauí.

Pescado daqui.

.........

O PT, se não tivesse tão concentrado na prática religiosa e acrítica do lulismo planaltino e na encarquilhada política da conciliação de classes (expressa especialmente na relação promíscua com a mídia corporativa e oligárquica), poderia prestar mais atenção no que assevera Marilena Chauí neste pequeno-grande livro.


Candidatura sabão-em-pó

Paupérrimo o debate dentro do PT de Porto Alegre sobre a sucessão municipal de 2008. A disputa está entre Miguel Rossetto e Maria do Rosário. Nada substantivo. Nada de discussão sobre projetos, métodos, políticas públicas, plano de governo, requalificação do OP, experiência executiva, nada. Também é impossível encontrar um documento sequer onde se possa fazer um juízo claro sobre o que cada um dos aspirantes propõe para a cidade. Tudo fica reduzido a uma corrida de cancha reta, quem chega primeiro, vence internamente.

O objeto de disputa está estreitamente limitado a considerar se o que vale para a definição final é o prestígio interno ou o melhor desempenho nas pesquisas externas conduzidas por institutos do mercado (que fazem sondagens de intenção de voto com a mesma metodologia com que identificam o sabão em pó preferido das donas de casa).

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007




O macabro jogo da RBS

A empresa de mídia corporativa e conservadora RBS de Porto Alegre apostou um jogo com a morte. E perdeu. Um jogo faustiano perigoso, onde o prêmio seria mais prestígio social de superfície e mais humanitarismo postiço. Foi derrotada.

Semanas atrás, o grupo RBS lançou uma campanha institucional contra a violência no trânsito (leia-se violência do automóvel) com o rótulo "Isso tem que ter fim" (comentamos esse tema dias atrás, ver abaixo). Exigiu autoritariamente que todos os seus celetistas vestissem uma camiseta com os dizeres no peito e os estampou no seu principal diário, o jornal José Agá. Constrangido, o independente Luís Fernando Veríssimo saiu com cara de gato a cabresto.

Se arrependimento matasse, a sede da RBS na avenida Ipiranga seria um campo santo silencioso e reverente. Embarcaram, certamente, na conversa fácil e vazia de algum publicitário genial (plenonasmo, os publicitários sempre são "geniais"!) munido de dados seriados e curvas coloridas (que eles insistem em chamar de "estatística") para provar que este ano de 2007 haveria uma queda significativa de acidentes de trânsito e que a RBS poderia surfar essa onda positiva, já que os saldos anuais vinham de fato caindo lenta, mas constantemente. É simples, fácil, não requer prática nem habilidade, qualquer criança brinca, todo o adulto se diverte... só que o gênio esqueceu de dizer que o game era contra a morte. Um xadrez com a morte, dos outros. Resultado: morte 35, RBS zero. Nunca tantas vidas foram engolidas pelo automóvel, em tão poucos dias de feriados. O próprio editorial de José Agá admite a derrota acachapante.

Quando do lançamento da campanha "Isso tem que ter fim", a RBS exaltou a opinião de vários especialistas (que eles cultivam aos punhados), todos foram unânimes na "tagarelice" (Heidegger) acerca do tema. Um deles, chegou ao cúmulo de reclamar uma "revolução cultural" para superar o que chamava de "tragédia do trânsito". Pura tagarelice heideggeriana, blá-blá-blá irresponsável e narcísico.

E agora, o que fará a RBS? Nada, a não ser seguir com sua providencial cara-de-pau, fazendo olho branco para a realidade, rezando para que não fique consagrada como empresa pé-frio, e apostando na categoria de leitores tipo Homer Simpson de bombachas. Aliás, estes agora estão sendo estimulados mesmo a mandar fotografias de seus pequenos mascotes e/ou de seu automóvel em situações engraçadinhas e pitorescas.

Sem dúvida, chegamos ao ponto mais raso do que deve ser o papel social dos meios de comunicação em nossos dias.

Fotos: a governadora Yedinha (PSDB) e o prefeito de Porto Alegre, José Fogaça (PMDB) aderiram à campanha fuleira da RBS, vestindo a camiseta promocional do "espetáculo". Serão eles, assim como a RBS, temíveis pés-frios?

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007


Lula ficou na superfície

"Lula provocou uma grande decepção, um trauma nos setores do povo que acreditavam nele”, constata Ricardo Gebrim, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST –, segundo informa o jornal mexicano La Jornada, de ontem. O presidente do Brasil, afirma Gebrim, “está amarrado” e não pode aprofundar as mudanças. Ele ficou na superfície porque “quis fazer omelete sem quebrar os ovos”.

E explica: “Ele pensa que se podem fazer mudanças sem entrar em confronto com os setores dominantes, como se fosse possível romper a subordinação econômica sem tocar no essencial. Mas o momento atual já não o permite mais. Então oferece medidas compensatórias, programas sociais para os mais pobres. Os banqueiros e industriais tem lucros maiores que nos governos anteriores. A burguesia está muito feliz, mas os setores populares estão frustrados”.

Segundo Gebrim, “como todo trauma, a decepção com Lula provocou uma certa paralisação na esquerda. Uma parte seguiu como se nada tivesse acontecido e decidiu rebaixar seu horizonte de expectativas e considerou todo o resto como Utopias. A outra mudou o amor por Lula pelo ódio a ele. Nós não estamos nesses extremos. Entendemos que não vamos atingir os nossos objetivos elegendo a um candidato. Necessitamos de uma organização autônoma, lutas cada vez mais intensas, com unidade, não em torno de um líder ou uma plataforma eleitoral, mas em torno de um programa político, com consciência, com idéias claras. Um projeto popular para o Brasil”.

Falando do Movimento Consulta Popular, Gebrim diz que “neste momento, quando o povo brasileiro vive uma decepção, não vamos seguir o caminho eleitoral. Mas no nosso horizonte está a conquista do Estado. Somente que antes queremos construir o poder popular, a estrutura. É preciso gerar força, propaganda, agitação, construir condições para outros momentos da história”.


Momento Caras

A senadora petista de Santa Catarina, Ideli Salvatti, e o senador José Sarney (PMDB), no flagrante do fotógrafo Lula Marques, firmam relações que vão além do que Sérgio Buarque chamou de "relações cordiais" do brasileiro. Estão mais para o epíteto de Menem e suas relações carnais.... bem, deixa pra lá.

Eles são adultos, vacinados... e se amam! Não é lindo, gente?

Elite branca e ladra

A obra "O Retrato de Suzanne Bloch" (foto), de Pablo Picasso, foi roubada do Masp, em São Paulo, na madrugada desta quinta-feira; câmeras do museu flagraram a ação e gravações ajudarão nas investigações.

Vou dar uma pista para vocês adivinharem o perfil do beneficiário do roubo, o ladrão mesmo. Branco, bem nascido, herdeiro de alguma família cuja acumulação primitiva se deu nos ciclos econômicos do Brasíl-Colônia, movido a mão-de-obra escrava, vagabundo e portador de pálidas noções de arte contemporânea. Pronto, o resto é com vocês, ou com a PF.

Será emocionante o desfecho dessa história criminosa. Mal posso esperar.

Crê ou morre

O mandamento disjuntivo do "crê ou morre" é o imperativo dogmático primordial das religiões monoteístas. Das religiões monoteístas. Mas alguns ainda insistem que deva fazer parte do mundo pagão da política terrena e secular de nossos dias e noites.

Me explico: tenho recebido mensagens que tentam me convencer que estou pegando pesado com o presidente Lula e o PT, etc. neste modesto blog de província. A pressão é lícita, tudo bem.

Fui eleitor de Lula inúmeras vezes, na derrota e na vitória, na alegria e na tristeza, mas como não casei com o sapo barbudo, suponho que tenho a liberdade de discordar de Sua Excelência quando vejo contradições antagônicas sendo entronizadas como verdade absoluta na atual gestão governamental.

A agudização da luta de classes (algo positivo no governo Lula) faz com que caminhemos diariamente sobre um fio de navalha. É difícil distinguir com absoluta precisão e nitidez os inimigos de classe, os aliados de ocasião, os companheiros de jornada diária, os camaradas de toda a vida, e os imprescindíveis fazedores de História. Ora, a coruja de Minerva só alça vôo ao entardecer, e nós estamos apenas no mezzogiorno da luta. Para agravar, quando o sol está a pino, as sombras ficam tão pequenas!

Quero dizer que Lula não é - pelo menos para mim - um líder religioso. Votar em Lula, não me fez lulista. Não abro mão - em hipótese alguma - do meu espírito crítico (e autocrítico). Por isso estou vivo (bem) e penso (mal). O lulismo, o peronismo, o getulismo, etc., são religiões seculares, para o qual este incorrigível iconoclasta não está preparado para votar créditos de imorredoura fé, crença e esperança sagradas. Como disse santo Tomás de Aquino, a verdade religiosa é sobrenatural e suprarracional, e Pascal declara que a obscuridade e a incompreensibilidade constituem os verdadeiros elementos da religião. Estou fora. O mundo já é obscuro o bastante para eu usar essa burca lulista na frente das minhas cansadas retinas.

Os lulistas quando quiserem dialogar sobre política, por favor, me procurem, sou parceiro. Mas enquanto estiverem falando de religião enfatizo com lápis vermelho que estou fora.

Compreenderam, ou querem um esquema espacial na lousa?
"Isso tem que ter fim"

Ontem, quando vi essa frase nos veículos da RBS, pensei que eles estavam numa campanha de oposição para derrubar a governadora Yedinha. Segundos depois, me dei conta que se trata apenas de uma campanha contra a violência no trânsito. Qualquer movimento contra a violência do automóvel é altamente meritório e deve ser aplaudido. Mas partindo do grupo RBS (que apoiou o golpe de 64) é preciso que fiquemos com o pé atrás.

Neste caso, é uma campanha de fachada, uma campanha institucional que visa dar contornos humanitários ao business empresarial da mídia corporativa. Os mídias no mundo todo periodicamente fazem tais campanhas com a finalidade de aproximá-los dos seus leitores e simpatizantes. Mera questão de imagem, de aparência pública formal. Como eles passam o tempo inteiro apregoando as excelências da civilização do automóvel, exaltando de todas as formas - direta ou indiretamente - um tipo de sociedade moldada plasticamente para que o automóvel seja o feitiço central do nosso tempo, por vezes é necessário distensionar a corda e passar algumas horas lembrando das perdas que o automóvel pode causar. É o morde-assopra da mídia corporativa, que tem na indústria automobilística uma de suas principais fontes de receita. E os anúncios da indústria automoveira são verdadeiras rapsódias in blue de elogio aos valores mais fundamente atávicos e primevos do homem (como macho): velocidade, força, individualismo, convite à projeção das frustrações em objetos e extensões fetichizadas (a máquina), disputa narcísica, darwinismo social, rebaixamento objetificado da mulher, etc.

A violência no trânsito é a violência do automóvel (isso eles não dizem!), portanto, não pode ser isolada como um bacilo qualquer, e vista de forma descontextualizada e suspensa no ar irrespirável de nossas ruas. A campanha da RBS pretende exatamente isso: enxergar o trânsito, sem enxergar o automóvel (e o etos miserável que ele ajudou a moldar em nosso meio). A violência no trânsito é um sintoma de uma sociedade enferma que imola jovens a cada final de semana no altar pagão da máquina automoveira.

Neste sentido, a campanha da RBS é fake, mais falsa que nota de três dólares, mais postiça que o sorriso do lagarto, como diria João Ubaldo. Especialmente quando se sabe que o grande evento musical voltado ao público infanto-juvenil, chamado Planeta Atlântida, organizado pela empresa "RBS Eventos" é patrocinado com exclusividade por uma das maiores cervejarias do Brasil, e que no tal recinto, a bebida alcoólica é consumida por imberbes adolescentes em quantidades amazônicas - sem a menor inibição ou censura dos organizadores das libações juvenis de massa no litoral guasca.

Assim como álcool e direção não combinam, RBS e verdade, idem.

Mas "isso tem que ter fim".

Os belgas

Principais características desses cidadãos que vivem nesse pedaço do Brasil, que convencionou-se chamar de Bélgica.

Renda

Eles têm renda acima de 20 mínimos, classe A, segundo as classificações, o que lhes dá acesso, como diria o professor Julio Groppa Aquino, ao pacote existencial: shopping, academia, condomínio fechado e escola privada. Eu acrescentaria ainda o plano de saúde, a TV paga e a internet banda larga.

Consumo

Embora tenham equipamentos sofisticados como TVs de plasma, home-theather, vídeo-games e computadores de última geração, não enxergam nenhum mal ao consumir CD, DVDs, jogos e softwares piratas.
Como são aspirantes da alta sociedade, são eles que compram os produtos de marcas de luxo falsificadas, como bolsas, relógios, jóias e roupas.

Impostos

Eles se acham os únicos que pagam impostos no país. Para dar uma aliviada, licenciam seus carros em outros estados, compram recibos médicos, omitem dados na declaração de IR e sempre conhecem algum doleiro.

Corrupção

Estão sempre indignados com a corrupção. São os primeiros a oferecer uma graninha para o guarda e a pagar "taxas de urgência" para burlar qualquer fila.

Trânsito

Para eles, esse é o maior problema do país. É difícil o tema não ser abordado em uma roda de amigos. Reclamam principalmente da "indústria de multas" que só serve para arrecadar. Quando elas chegam, o jeito é transferir os pontos para algum parente ou procurar uma "empresa especializada".
Como o rodízio atrapalha [em SP], alguns recorrem a uma fita isolante para adulterar a placa, mas só em casos urgentes.
Parar em fila dupla, cruzar o sinal vermelho, parar em cima da faixa de pedestres, fechar o cruzamento e estacionar em vagas reservadas são atitudes corriqueiras, plenamente justificadas pelo estresse.
Para equipar o veículo, admitem comprar peças no mercado paralelo, pois as originais são muito caras.
Quando em desespero, podem destruir o próprio carro ou pagar uma "taxa de sumiço" para obter o dinheiro do seguro.

Empreendedores

Alguns se tornam empresários. Como a competição é terrível, dizem que a carga tributária é um convite à sonegação. Daí nascem algumas necessidades básicas, como registrar a empresa em uma cidadezinha do interior, comprar produtos subfaturados, adulterar a mercadoria e vender sem nota.
Existem os que se arriscam a ter funcionários sem carteira assinada. A maioria acha que isso pega mal e recorre a artifícios como ter funcionários PJ, cooperativas de fachada e a pagar uma parte "por dentro" e outra "por fora".


Pescado integralmente
daqui.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007


O mito de Noel, esse pedófilo enrustido, vigarista-mor e ícone do consumismo doentio, visto por Jaguaribe.

Quem escreve átlas é grego ou atlasado

O jornalista e professor Bernardo Kucinski está se despedindo da Agência Carta Maior. Escreveu semana passada um artigo torquemadesco mesmo contra a greve cidadã de frei Cappio, e por inúmeros motivos cruzados está dando adeus às armas. Ontem, publicou o seu arremate final contra uma chusma de inimigos que ele elegeu para si. Contra o movimento ambientalista, contra a Igreja, contra padres em geral, contra críticos (pela esquerda) do governo Lula, contra o MST, contra a CPT, contra a raiz latina do vocábulo atlas, contra a lógica formal e contra si próprio. O homem está de mal com o mundo. Deve - seguramente - ser o sujeito mais ranheta da rua dele.

De qualquer forma, este blog lamenta o ocorrido. O professor Bernardo está se degolando solito como perdiz no arame. Ninguém deseja o seu afastamento, inclusive este blog que o criticou dura mas lealmente semana passada (ver abaixo). Por isso, este DG quer lançar o movimento do "volta BK", ou "BK não morreu" - como vocês escolherem. O professor BK sai por uns dias, toma umas fluoxetinas e volta no mês de janeiro ou julho, já pronto para outras refregas com os seus milhares de leitores e admiradores.

P.S: Agora eu preciso explicar o título deste post. O professor BK no artigo desta semana, fala diversas vezes em átlas (uma coleção de mapas ou cartas geográficas), com acento tônico na penúltima sílaba - uma providência inútil. Como diz o Cebolinha, na sua adorável dislalia, parece coisa de "atlasado". Salvo que o sujeito seja metido a grego, que de fato acentua o vocábulo atlas na primeira sílaba. Parece meio gago, mas que fica chique, isso fica.

Volta BK!

Quem votou pelas OSCIPS

O Projeto de Lei do Executivo no. 399/2007 que institui as parcerias entre o governo do Estado e OSCIPS, para gestão de órgãos, entidades e instituições públicas teve a aprovação de 37 deputados estaduais. Para que fique devidamente documentado e esclarecido, publicamos abaixo o nome dos parlamentares que aprovaram essa irresponsabilidade, agora legalizada. Segundo a ata da sessão plenária de ontem, os deputados que votaram a favor do PL 399, foram:

PMDB
Alberto Oliveira
Alceu Moreira
Alexandre Postal
Álvaro Boessio
Edson Brum
Gilberto Capoani
Márcio Biolchi
Sandro Boka

PP
Adolfo Brito
Francisco Appio
Jeronimo Goergen
João Fischer
Mano Changes
Marco Peixoto
Pedro Westphalen
Silvana Covatti

PDT
Adroaldo Loureiro
Giovani Cherini
Kalil Sehbe
Rossano Gonçalves

PTB
Abílio dos Santos
Aluísio Classmann
Cassiá Carpes
Iradir Pietrowski
Kelly Moraes

PSDB
Adilson Troca
Nelson Marchezan Jr.
Paulo Brum
Pedro Pereira
Zilá Breitembach

PPS
Berfran Rosado
Carlos Gomes
Luciano Azevedo
Paulo Odone

DEM
José Sperotto
Marquinhos Lang
Paulo Borges

Para ler (recortar) e guardar. Futuramente, quando começarem a aparecer os escândalos públicos com as OSCIPS privadas, esses cidadãos representantes da maioria dos eleitores do Rio Grande deverão ser chamados a responsabilidade.



Charge do Orlandeli

Vamos virar um imenso Detran

O Palácio Piratini (hoje, só um prédio histórico habitado por morcegos e roedores por dentro e pombos por fora) comemorou ontem a aprovação do projeto que permite parceria entre o Estado e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPS). O projeto, vitorioso por 37 votos a 17, era de grande importância para o governo tucano. O aval da Assembléia para as OSCIPS é uma das contrapartidas acertadas pelo Estado junto ao Banco Mundial para garantir o empréstimo de US$ 1 bilhão obtido no início de dezembro. O governo estadual irá regulamentar a lei - que acontecerá por decreto da governadora Yeda Crusius. Os critérios para a seleção das OSCIPS que querem assumir os serviços públicos também aguardam regulamentação.

A partir de agora o governo Yeda transfere a a gestão de serviços públicos para as OSCIPS, que são organizações não-governamentais (ONGs) habilitadas pelo próprio Estado, sem a necessidade de haver licitação pública. Os futuros empregados dessas entidades privadas elevadas a condição de gestoras públicas não precisarão fazer concurso público, como exige a lei para qualquer servidor, serão escolhidos por critérios particulares dos dirigentes das OSCIPS.

Este é de fato "um novo jeito de governar", afinal. Partes importantes do setor público ficarão sob a responsabilidade de entes privados, sem nenhuma responsabilidade pública, sem concurso, sem licitação, sem controle, sem ter passado pelo crivo das urnas e de acordo com critérios subjetivos e não-impessoais.

O Rio Grande a partir de ontem marcha a passos céleres para se transformar num imenso Detran - aquela autarquia que vinha sendo assaltada por malfeitores já há cinco anos, apesar de todos os controles formais as quais estava submetida. Agora, com esses controles afrouxados ou inexistentes, o Rio Grande ingressa num tempo de vale-tudo e irresponsabilidade generalizados.

Não é só o Palácio Piratini que está baldio e habitado por pequenos roedores.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007


Deputados votam hoje projeto das OSCIPS


Deputados estaduais votam hoje, na Assembléia Legislativa, o projeto do governo estadual que regulamenta as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, as OSCIPS. Se for aprovado, o governo estará autorizado a entregar a gestão de estatais e empresas públicas para entidades de caráter privado.
Na lista, estão a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, UERGS, e a Fundação de Atendimento Sócio-Educativo, a Fase, bem como outras trinta entidades públicas do Estado. Servidores públicos e sindicatos de trabalhadores irão protestar na Assembléia contra o projeto. A informação é da Agência Chasque.

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Esse projeto das OSCIPS encaminhado pela governadora tucana Yedinha Crusius é de uma imoralidade única. Teremos no Rio Grande dez, vinte, trinta Detrans sangrando os cofres públicos e o contribuinte, contratando empregados pagos pelo Tesouro e burlando a legislação do concurso público. Não haverá o mínimo controle público sobre essas novas entidades privadas que administrarão fatias inteiras do Estado.

Uma ameaçadora nuvem de irresponsabilidade paira sobre o Rio Grande!

O Executivo está pedindo um cheque em branco à Assembléia Legislativa, hoje. Caso a AL aprove esse projeto das OSCIPS estará legalizada a invasão privada no setor público estadual. Não ficará pedra sobre pedra ou cofre sobre cofre. Teremos dez, vinte, trinta Detrans com licença livre para gerir, arrecadar, vender, comprar e bem entender dos limites complacentes entre o público e o privado.

A sorte está lançada!


Confirmado: Campo Majoritário venceu com 62% dos votos

O deputado federal Ricardo Berzoini, de São Paulo, foi reeleito presidente nacional do Partido dos Trabalhadores. A nova gestão será para os anos de 2008 e 2009 e confirma a manutenção do Campo Majoritário na direção do PT. Segundo as finais divulgadas ontem, Berzoini obteve 62,3% dos votos válidos. O seu concorrente, o deputado federal também paulista, Jilmar Tatoo, ficou com 37,7% dos votos.

O presidente reeleito afirmou que em sua nova gestão, o PT deverá se voltar à construção de um programa para as eleições de 2010. O Campo Majoritário, grupo representado por Berzoini, já está há mais de 12 anos na direção da legenda. Integram o grupo nomes de peso do governo atual, como o presidente Lula, e os ex-ministros José Dirceu e Antonio Palocci. As informações são da Agência Chasque.

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Visitei hoje alguns blogs e páginas de militantes e parlamentares petistas para verificar a repercussão do encerramento do Terceiro Congresso e a vitória do Campo Majoritário no PED.

Nada. Há um silêncio sepulcral, um recolhimento de avestruz.

Pelo menos poderiam lembrar a velha Canção do Tamoio, de Gonçalves Dias. Já seria um lenitivo para a alma sangrada e ressangrada por um partido que já não existe mais.

Não chores, meu filho;
Não chores, que a vida
É luta renhida:
Viver é lutar.
A vida é combate,
Que os fracos abate,
Que os fortes, os bravos
Só pode exaltar.

[...]

Novas previsões catastróficas para o planeta

Uma nova pesquisa internacional alerta que o nível dos oceanos pode subir duas vezes mais do que o previsto pelos cientistas do Painel Intergovernamental para Mudança Climática (IPCC).

O IPCC indica que haverá, no máximo, um aumento no nível do mar de 81 centímetros neste século.
Mas a pesquisa do Centro Nacional de Oceanografia da Grã-Bretanha junto com centros de pesquisas em Tübingen – na Alemanha –, Cambridge e Nova York, publicada na revista Nature Geoscience, afirma que o número verdadeiro pode chegar a mais do que o dobro do proposto pelo IPCC, ou 163 centímetros.
Os cientistas analisaram o que aconteceu na Terra há mais de 100 mil anos, a última vez que o planeta esteve tão quente como atualmente. A informação é da BBC Brasil.

A taxa de aumento do nível dos mares é uma das incertezas nas projeções de cientistas para o futuro do planeta com o aquecimento global. Este novo resultado seria a primeira documentação mais sólida a respeito das taxas nas quais o nível do mar subiu tanto naquela época. "Vários pesquisadores já apresentaram teorias mostrando que as taxas de aumento do nível do mar projetadas por modelos em avaliações recentes do IPCC são baixas demais", disse Eelco Rohling, do Centro Nacional de Oceanografia da Grã-Bretanha, em Southampton. "Isto acontece porque a estimativa do IPCC tem como preocupação principal a expansão térmica e o derretimento do gelo de superfície, sem determinar o impacto dos processos dinâmicos das camadas de gelo."

No último estudo, os pesquisadores conseguiram fazer as estimativas ao analisarem o período interglacial – entre 124 e 119 mil anos atrás – quando o clima da Terra era mais quente do que atualmente, devido a uma configuração diferente da órbita do planeta em volta do Sol. Os pesquisadores descobriram que a média de aumento do nível do mar foi de 1,6 metro a cada século deste período.

Este também foi o período mais recente no qual os níveis dos mares e oceanos ficaram cerca de seis metros acima dos níveis atuais, devido ao derretimento das camadas de gelo da Groenlândia e Antártida.

Neste período a Groenlândia tinha temperaturas entre 3ºC e 5ºC mais quentes do que atualmente, o que é parecido ao período de aquecimento nos próximos 50 a cem anos, segundo Rohling. "A média da taxa de aumento (do nível do mar) de 1,6 metro por século que descobrimos é cerca de duas vezes maior do que a estimativa máxima do relatório do IPCC, então oferece a primeira avaliação potencial da dinâmica das camadas de gelo, que não foi incluída entre os valores (avaliados) pelo IPCC", explicou Rohling.

Mapa do Pampa ajudará na conservação ambiental do RS

Cerca de 41% da cobertura vegetal do Bioma Pampa ainda está conservada. Esse foi um dos resultados do Mapeamento da Cobertura Vegetal do Bioma Pampa, lançado ontem em Porto Alegre. O estudo foi realizado pelo Departamento de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) em parceria com o Ministério do Meio Ambiente (MMA). A pesquisa traz informações inéditas sobre os tipos de vegetação nativa ainda conservada e sobre as áreas alteradas por atividades como plantio de soja, milho e árvores para produção de celulose. A informação é da Agência Chasque.

O responsável pelo projeto, o geógrafo Heinrich Hasenack, conta que os trabalhos foram realizados entre 2004 e 2006. Ele considera que este levantamento é o mais completo que já se fez sobre o bioma, já que utilizou imagens de satélites e contou com a supervisão técnica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De acordo com o especialista, as informações devem servir de base para a definição de políticas públicas e para criação de áreas de conservação, entre outros fins.

“O objetivo não era contrapor alguma coisa, e simplesmente mostrar um mapa mais recente, porque todas as bases que se discutiam era em cima de um mapa de vegetação mais antigo. A gente quis trazer uma informação mais atual”, diz.

O Pampa corresponde a 63% do território gaúcho e cerca de 2% do espaço brasileiro. São mais de 178 mil hectares, que abrigam 3 mil espécies de plantas e mais 400 espécies de aves. Para Hasenack, é preciso um esforço para conservar o que ainda existe desse bioma.

A preservação da biodiversidade do Pampa também foi defendida pela presidente da Associação Permanente de Entidades de Defesa do Meio Ambiente (Apedema), Káthia Vasconcelos. Ela acredita que a definição das áreas degradadas vai auxiliar no regramento das atividades na região, servindo com um complemento para o zoneamento elaborado pelos técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam).

“Nós temos uma área grande aí que poderia ser utilizada para fins econômicos, e utilizar mais ou menos 40% da área também para fins econômicos, mas de baixo impacto. É um instrumento importante para tentar fazer um contraponto a quem quer fazer agricultura em larga escala, tem que pensar onde está fazendo, seja essa agricultura arroz, soja ou plantação de árvores”, afirma.

Os resultados do mapeamento estão disponíveis no ícone Biodiversidade na página do Ministério do Meio Ambiente (MMA), www.mma.gov.br.

Além de divulgar os resultados, a cerimônia marcou o dia 17 de Dezembro como Dia do Bioma Pampa. A data foi instituída por meio de um decreto, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva neste mês. A escolha é uma homenagem ao ambientalista José Lutzemberger, que completaria 81 anos nesta segunda-feira.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007


Escolinha do Professor Barrionuevo

Deu hoje no RS Urgente.

Quando deixou a coluna Página 10, do jornal Zero Hora, José Barrionuevo passou a dedicar-se ao marketing político e começou a prestar serviços como consultor político e gestor de imagem. “Gestão de imagem” é o conceito central no site de Barrionuevo que, se por um lado, não tem quase nada de conteúdo, por outro, é pródigo em elogios ao jornalista. A carreira de Barrionuevo como gestor de imagem, porém, sofreu pelo menos dois duros golpes em 2007. Dois parceiros e/ou clientes importantes foram alvo de pesadas denúncias. Primeiro foi José Fernandes, diretor da empresa Pensant, preso pela Polícia Federal na Operação Rodin e indiciado como membro da quadrilha que operava um esquema de fraudes no Detran. Em parceria com Cezar Busatto, Barrionuevo assinou um livro sobre o tão badalado quanto inócuo Pacto Pelo Rio Grande, que teve a participação da Pensant como consultora.

Agora, é a vez do prefeito de Canoas, Marcos Ronchetti (PSDB), denunciado pelo Ministério Público Federal no esquema da fraude da merenda escolar. O MP quer cassar o mandato e os direitos políticos de Ronchetti, um dos principais clientes de Barrionuevo em sua carreira como gestor de imagem. O jornalista trabalhou como consultor da campanha que levou Ronchetti à prefeitura de Canoas.

Em novembro deste ano, o nome de Barrionuevo circulou como cotado para assumir secretariado de Comunicação do governo Yeda. Indagado sobre o assunto pela jornalista Rosane de Oliveira, de ZH, garantiu que não havia nenhuma chance: “Não nasci para ser franciscano”, resumiu. Diante do destino de alguns de seus clientes e parceiros, o jornalista poderá ter que rever seus conceitos religiosos e existenciais.

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Vale a pena vocês visitarem o saite do professor Barrionuevo. Lá, o cara é simplesmente o "másquimo" - uma fusão de Alberto Roberto (foto) com professor Raymundo, aqueles personagens hilários do Chico Anísio. Aliás, este deveria cobrar direitos autorais.

E os fiadores das excelências profissionais do professor Barrionuevo, então? Nada menos que dois ex-porta-vozes de ex-presidentes, o ditador Figueiredo e o defenestrado Collor, e a louraça de José Agá, dueña Amélia Lemos, expert em papeleiras, transgenia, agrobusiness, carne maturada for export e jornalista nas horas vagas.


Yedinha tem pior avaliação entre governadores

A governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius, teve a pior avaliação do país em um levantamento do Instituto Datafolha. A pesquisa mostra que Yeda ficou com média 4,2%. Já o primeiro lugar do ranking ficou com o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, também do PSDB. Ele obteve média de 7,7. O levantamento foi realizado com 11.500 pessoas em 9 Estados e no Distrito Federal no final do mês de novembro. A informação é da Agência Chasque.

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Como não se chuta cachorro morto, não faremos comentários.

O momento Lênin

A propósito da reacomodação do Campo Majoritário na hegemonia do PT, acontecido ontem com o final melancólico do Terceiro Congresso, quero sugerir a leitura do ensaio de Chico de Oliveira, chamado "O Momento Lênin", escrito ainda em 2006.

Este artigo retoma o processo que culminou na chegada do Partido dos Trabalhadores ao governo federal. Em síntese, descreve como os primeiros anos da administração petista, calcada no continuísmo em relação ao governo anterior, relacionam-se a um contexto mais amplo marcado por bases classistas em decomposição, populismo emergente, predominância do capital financeiro, estatização dos partidos e da política e privatização da economia e da vida.

Leitura imperdível para quem quer conhecer as razões que levaram o PT a resvalar em definitivo para a condição de partido da ordem tradicional brasileira.

Leia o texto na íntegra aqui.

Renasce o Campo Majoritário do PT

Com a vitória praticamente assegurada, ontem por volta das 23 horas, o atual presidente petista Ricardo Berzoini reacomoda o antigo Campo Majoritário numa situação confortável na legenda. Até aquele momento, Berzoini recolhia cerca de 60% das preferências eleitorais das "bases" partidárias que votaram no segundo turno do PED, ontem encerrado.

"O apoio do presidente Lula é uma honra e uma demonstração de que ele confia no meu trabalho”, anunciou ontem Berzoini com a alma lavada e enxaguada.

Legitima-se, assim, agora em definitivo, depois do forte abalo ético-moral havido em 2005, o velho Campo Majoritário outrora liderado pelo ex-deputado José Dirceu, responsável pelos rumos do PT, pelo menos desde 1995.

Berzoini, que tinha contra si um voto de desconfiança do próprio presidente Lula, segundo se comentou meses atrás, acaba dando a volta por cima e desfaz as sombras de dúvida que haviam contra ele quanto a sua capacidade de conduzir a legenda no sentido de se constituir como um partido da ordem e da velha tradição partidária brasileira.

Agora, portanto, está assegurado, o Partido dos Trabalhadores provou de uma vez por todas que está preparado para ser - de fato e de direito - uma grande legenda tradicional e democrática do sistema representativo brasileiro. E nada mais.

domingo, 16 de dezembro de 2007


Apanhadas no Chão

- De um amigo meu, no bar: "Trabalho tanto que não tenho tempo para nada; à noite, bebo um pouco para lembrar as minhas mágoas."

- De um vendedor de cinzeiros de barro em Belém: "Se eu escrever com C, em vez de S, ninguém vai comprar."

- De um conhecido meu, quando lhe disse que certo homem público, embora de poucas luzes, era grave e honesto: "O jumento também é grave e honesto."

- Do mais preto, passando por mim, quando o menos preto lhe disse que ele só pensava em mulher: "Ué, pensar então em quê?"

- De uma expressão mineira: "Fala mais que pobre na chuva."

- Do finado Humphrey Bogart: "Um homem está sempre duas doses abaixo do normal."

- De um forjador de provérbios: "Caranguejo idoso pensa muito e brinca pouco."

- De um velhinho, ante o ar conjectural do caixeiro, quando pediu na livraria um manual sobre limitação de filhos: "Não é para mim; é para papai."

- Do matuto para o médico: "Foi tiro e queda, doutor: a pílula desceu e parou direitinho na casa da dor."

- De um velho do interior ao provar soda pela primeira vez: "Tem um gostin de pé dormente."

- De Jaime Ovalle: "O importante não é saber se a pessoa gosta de uísque, mas se o uísque gosta da pessoa."

- De Camilo Paraguassu, em um poema: "Vista de Paquetá, a lua é linda."

- De Garrincha, muito absorto, meio segundo antes de ser dada a saída no jogo do Brasil com o selecionado soviético em 1958: "Olha ali, Nilton, aquele bandeirinha é a cara de seu Carlito..."

- Do mesmo, contando ao colega onde comprara uma gravata (Roma): "Foi naquela cidade onde seu Zezé levou aquele tombo no vestiário."

- Do mesmo para um companheiro de pelada: "Quer parar de driblar!"

- De Osvaldo Cabeça de Ovo, no dia em que seu time de areia perdia de cinco a zero: "Arrecui os arfe para invitar a catastre."

- Do treinador, também de praia, Trindade: "A missão do centrefór é atrapaiar os beque."

- De um outro treinador para o goleiro: "Carambolou, arreia."

- De um torcedor a meu lado, vendo uma jogada magistral do enciclopédia Nilton Santos, errando, paroxismado, na tônica: "Dá-lhe, catédra!"

- De Graciliano Ramos, quando ouviu pela primeira vez um rouxinol: "Eta passarinho chato!"

- Do cabo Firmino, na revolução de 30, promovido pelo comandante da Força Pública Mineira, por ato de bravura em batismo de fogo: "Uai, seu coronel, tava pensando que era manobra."

- De Hemingway sobre a famosa modelo Kiki de Montparnasse: "A única mulher que nunca dormiu em sua própria cama."

- De um estudante para mim: "Escritor é o Euclides! Olha só: O sertanejo é — vírgula! — antes de tudo — vírgula! — um forte — ponto!"


Paulo Mendes Campos (1922-1991)

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007


Agora vamos ver qual é a prioridade do governo Lula

Ao vetar a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e manter a Desvinculação de Recursos da União (DRU), o Senado cortou a verba destinada à saúde e manteve o dinheiro público que alimenta o sistema financeiro. A opinião é do diretor da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong), José Antonio Moroni. A informação é da Agência Brasil/Radiobrás.

“O Senado derrubou a CPMF com o discurso de que o Estado gasta demais”, afirma. Mas, destaca, o tributo que foi derrubado pelo Senado atende, principalmente, à saúde e assistência social. “E, na mesma noite, aprova a DRU, que joga 20% de todas as receitas do governo federal para o pagamento de juros da dívida, ou seja, para girar o mercado financeiro.”

De janeiro a outubro, segundo ele, a DRU retirou R$ 38 bilhões da seguridade social: saúde, assistência social e Previdência. “É quase uma CPMF”, afirma o diretor, referindo-se à estimativa de arrecadação de R$ 40 bilhões com o tributo.

Para Moroni, as decisões da madrugada de ontem (13) do Senado também obrigam o governo a tomar uma decisão. “Agora vamos ver do governo qual é a prioridade? Se vai tirar dinheiro da dívida para cobrir os programas sociais ou se vai continuar fazendo o inverso.”

A DRU, aprovada em 2000 no Congresso Nacional, permite investir até 20% da arrecadação em áreas diferentes das determinadas pela Constituição, como educação, saúde e seguridade social.

Palocci continua muito influente no Planalto

Ontem, antes de viajar para a Venezuela, o presidente Lula repassou uma ordem expressa ao ministro Guido Mantega (Fazenda): a meta de superávit fiscal do governo –3,8% do PIB anualmente— é “intocável”. A informação é do blog do jornalista Josias de Souza, no UOL.

A redução do superávit era, até então, uma das soluções que o ministério da Fazenda planejava incluir no rol de providências que terão de ser adotadas para compensar a perda da arrecadação anula de R$ 40 bilhões da CPMF. Quem está por trás da determinação do presidente é o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci (PT-SP), hoje deputado federal.

Acionado por Lula para auxiliar na frustrada negociação que o governo tentou estabelecer com o PSDB, Palocci voltou a freqüentar as cercanias dos ouvidos de Lula. E, a exemplo, do que fazia à época em que estava sentado na cadeira ocupada por Mantega, ele aconselhou Lula a não tocar no superávit.

O superávit fiscal é a economia que o governo faz para pagar os juros da dívida pública. Parte da equipe de Mantega, considera que uma redução da meta atual de 3,8% para algo entre 3,3% ou 3,5% reduziria o ritmo de liquidação da dívida, mas não comprometeria o rigor fiscal do governo.
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O deputado Antonio Palocci (PT-SP), permanente aliado e fiel guardião dos interesses hegemônicos do sistema financeiro, é um dos indivíduos mais perigosos da República brasileira.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

O lulismo parece que desaprendeu alguns truques

Este blog era favorável à prorrogação da CPMF, pelo simples motivo que é um tributo que os ricos não podiam sonegar. Agora, com a derrota de ontem, foi-se a vaca com a corda. Saem prejudicados os milhões de beneficiários de programas sociais do governo Lula. Era isso e somente isso que queriam, aspiravam e sonhavam os dráculas do povo brasileiro, atualmente liderados pelo tucanato do professor Cardoso (cada vez mais, o Farol de Alexandria dos trópicos modernos).

Mas o governo Lula errou duas vezes, no caso da CPMF, e um erro potencializou o outro.

Primeiro erro: antecipou a agenda de 2010, dando um toque de disputa eleitoral a tudo que se refere aos interesses do Planalto. Para a tucanalha, a derrota da CPMF se transformou quase em vencer o primeiro turno de 2010.

Segundo erro: conduziu pessimamente as negociações no Congresso, deixando contaminar a pauta da votação da CPMF pelos interesses subalternos e particulares de tipos como Renan Calheiros e aqueles líderes de ocasião que o Planalto tem escolhido dentro do Congresso, especialmente o episódio da defenestração de Walfrido dos Mares Guia.

Depois de cinco anos de Planalto, o lulismo parece que está desaprendendo certos truques básicos de Brasília.

Em Tempo: E o senador Pedro Jorge Simon, hein? Esperneou mas votou com o governo Lula, ontem. No início, ele faz todo um gestual, fala grosso, pisa forte, negaceia, mas depois se entrega como uma afogueada noiva em núpcias (foto). Esse é o grande líder do Rio Grande - pai político de nove entre dez ex-governadores do Estado, não por acaso os mesmos que afundaram o Rio Grande.



Petrobras censura atriz militante

A atriz Letícia Sabatella disse que tentaram cortar o som do seu microfone quando lia uma carta do bispo dom Luis Cappio, que faz greve de fome contra a transposição do rio São Francisco, em comemoração ao Dia Mundial dos Direitos Humanos em Salvador (BA), no domingo. O evento foi organizado pelo governo da Bahia - que é do PT e apóia a transposição - e patrocinado pela Petrobras. O ator Marcos Winter, que estava lá, contou que ouviu de um organizador: "Esse ator nunca mais sobe no palco". A Petrobras e o governo da Bahia negam que houve o problema.

Procurada por um repórter da Folha, Letícia (foto) comentou sobre o episódio, assim:

Eu tinha acabado de encontrar dom Cappio em Sobradinho. Eu não perguntei se poderia ler [a carta]. Não fui totalmente educada. Mas não imaginei que seria tão inconveniente em se tratando de uma questão relacionada a direitos humanos. O diretor do evento ficou chocado no primeiro momento. Ele falou: "Isso é uma sacanagem. Isso não foi combinado". Eu respondi: "Sacanagem é ele [dom Cappio] não poder ser ouvido". Aí ele falou: "Você foi autoritária". "Autoritário é impor um projeto de cima para baixo, sem debate", respondi. Fizemos um atentado cultural. Brinquei com Marcos: "Talvez a gente nunca mais receba apoio da Petrobras".

Uma cena insólita

Falando em empresário guasca, vou contar um fato que eu presenciei meses atrás. Por razões que não vem ao caso, eu estava numa cidade uruguaia da fronteira com o Brasil. Caminhando pela rua principal da pequena cidade, ouço uma música altíssima vinda de uma picape imensa que estava estacionada defronte a um bar-restaurante. A caminhonete não estava abandonada, ao contrário, sobre a caçamba do vasto utilitário havia uma mesa com cadeiras plásticas brancas. Nas "sillas" havia uns sujeitos obesos escarrapachados, e sobre a mesa, muitas garrafas de cerveja, aquelas de litro. Cada um dos fofos ostentava um copo na mão e um vastíssimo chapéu de caubói na cabeça. O ar era de deleite e fruição estética, haja vista, a música estridente que proporcionavam generosamente aos viventes de muitos quarteirões adjacentes. Uma cena insólita.

Embasbacado e apontando com o queixo, perguntei ao garçom do bar-restaurante:

- Ih?

Ele me respondeu com cara resignada:

- Ellos son industriales de Rio Grande del Sur!

De fato, a placa do veículo indicava a procedência de uma cidade industrial coureiro-calçadista do Rio Grande. Saí de fininho e encabulado.

Getúlio Quem?

O governador tucano de Minas Gerais, Aécio Neves, o Aecinho, esteve em Porto Alegre, ontem. Ninguém sabe ao certo o que ele veio fazer aqui.

José Agá, o principal jornal da RBS, informa que Aecinho "deixou nos seus interlocutores a convicção de que está em campanha para ser o sucessor de Lula". Grande novidade!

Mas permanece a questão: veio fazer o quê? Posar ao lado de dona Yedinha, a lilliputiana? Cuidado! Pode se queimar, com a "popularidade" de seu governo, o volume e a densidade de suas "realizações", Aecinho corre risco de dano grave à saúde político-eleitoral.

Rosane de Oliveira informa que o governador mineiro "se desdobrou em el0gios a Getúlio Vargas", em visita a empresários na Federasul. Nada mais inútil. Como se os empresários, por serem guascas do Rio Grande, tivessem algum apreço por Vargas ou conhecessem minimamente o homem que realizou a revolução burguesa no Brasil. Não conhecem, e se conhecessem repudiariam Vargas. Essa gente é semi-alfabetizada, ou francamente analfabetos funcionais, tocam as coisas de orelhada, mal sabem se vestir decentemente, e à mesa, brigam com talheres e copos, falam de boca cheia e mal. Acham que unha polida e esmaltada é sinal de requinte e distinção. Um coisa horrorosa.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007


"Vedado o acesso ao conteúdo"

Quando alguém tenta acessar o blog Diário Gauche numa certa estatal federal do Rio de Janeiro, aparece uma tela com a advertência acima. Começou hoje.

Aqui no RS, em órgãos públicos do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, já havia essa censura contra o blog, mas na área pública federal é inédito.

A quem estamos aborrecendo? Por que os nossos quatorze leitores esclarecidos e críticos não podem acessar e ler este modesto blog de província?

A medida faz parte da política de comunicação social do governo Lula? A mesma política que mobiliza líderes petistas a visitarem a redação da RBS em Porto Alegre para informar sobre o andamento da disputa interna do PT no curso do Terceiro Congresso Nacional?

O santo ofício particular de Bernardo Kucinski

Agressivo e desproporcional o artigo do professor Bernardo Kucinski contra o frei Luís Cappio. Julgou e condenou um cidadão que luta por direitos. Está lá, agora, no portal da Agência Carta Maior. Dá até para sentir cheiro de carne queimada.

Em nome do quê, mesmo?

Ora, da defesa (incondicional e acrítica) de um projeto recheado de irregularidades e suspeitas. Um projeto cuja essência ninguém é contra, a integração do rio São Francisco às populações do semi-árido do Nordeste. Ninguém é contra essa integração. Ninguém. Apenas se apresentam objeções a uma modalidade de integração que privilegia o hidrobusiness de exportação. Um projeto que trata igualmente os desiguais. Esse é o ponto. Repito: um projeto que trata igualmente os desiguais, conservando portanto as gritantes desigualdades da vasta região nordestina. Um projeto que vai custar o dobro de recursos e favorecer a metade da população, por conseguinte, um projeto cobertor-curto no social e cobertor-longuíssimo no custo financeiro (pago pelos contribuintes do País inteiro). Mais: um projeto gerenciado por ninguém menos do que o peemedebista Geddel Vieira Lima, o roliço ministro da Integração Nacional, tradicional jacaré-engomado da subpolítica oligárquica baiana e que mereceu do falecido ACM uma observação de caboclo que conhece a aldeia: "É um sujeito de ar agatunado!"

Geddel Vieira Lima está certamente regulando as idéias de Bernardo Kucinski. Só pode. Vejam a desproporção da resposta de Bernardo ao frei grevista. Acessem a Carta Maior e leiam com atenção. Alinhou todo um rol de crimes da Igreja católica contra o frei, jogou tudo na cara e na conta do frei. Conectou o frei ao terror religioso e obscurantista de séculos de irracionalismo e barbárie. Desde a Inquisição, passando pelo genocídio inca e maia, até os extermínios de Ruanda... e segue o baile bernardista. Uma coisa insana (e burra)!

Todo esse esforço intelectual (e moral) para simplesmente aderir ao pensamento e às ações (interessadas) de um sujeito com ar agatunado.

Coisas da vida.

Por que o PT não foi, não é e jamais será social-democrata - parte 3 (final)

A social-democracia opta pelo neoliberalismo

O mal denominado socialismo democrático, da Segunda Internacional, não querendo romper com a ordem do mercado, adapta-se a ele, reformando-o por dentro; com isso supunham estar em trânsito para o socialismo. O reformismo pode não levar ao socialismo, mas certamente conduz a uma boa discussão.

Adam Przeworski sustenta que "as reformas levariam ao socialismo se e somente se fossem (1) irreversíveis, (2) cumulativas em seus efeitos, (3) conducentes a novas reformas e (4) orientadas para o socialismo". Ora, diz esse professor da Universidade de Chicago, as reformas são reversíveis. O neoliberalismo desfez muitas conquistas importantes do movimento social, nos últimos anos, tanto no Brasil, mas, principalmente, na Europa. As reformas, de outra parte, não são necessariamente cumulativas. Um sem-número de novos problemas são demandados diariamente pela produção-reprodução do capital. Problemas que sequer eram cogitados no início do século 20, hoje fazem parte de um pesadelo social, resultante do "papel civilizador do capital" como: o comprometimento ambiental; a autonomia do dinheiro e a heteronomia dos indivíduos; a violência horizontalizada; as máfias localizadas que competem com o Estado e atuam na lógica do valor; a esfera da subjetividade e os cacos de fascismo capilarizado nas relações interpessoais, familiares, profissionais, religiosas, étnicas, cuja usina geradora é a alienação do trabalho e a "valorização do valor" (Marx). "O sistema do direito, o campo judiciário são canais permanentes de relações de dominação e técnicas de sujeição polimorfas", conforme aponta Foucault. Menos do que uma legitimidade a ser estabelecida, o direito (a lei) é um procedimento de sujeição. A questão central do direito, a soberania do Estado e a obediência dos indivíduos, deve ser traduzida como dominação, heteronomia e sujeição.

Outra questão: nem todas as reformas são conducentes a novas reformas. Em várias situações, observa Przeworski, reformas que satisfazem demandas imediatas dos trabalhadores prejudicam possibilidades futuras. Ele lembra Rosa de Luxemburgo: "No grau em que os sindicatos têm condição de intervir no setor técnico da produção, são capazes somente de opor-se à inovação técnica. [...] Nesse aspecto, agem em uma direção reacionária". Hoje, pelo menos na Europa, o inimigo oculto da diminuição da jornada de trabalho são os sindicatos dos trabalhadores plenamente empregados. Oculto, por que não o dizem de frente, mas colocam empecilhos e pautam outras demandas que acabam inviabilizando a adoção da medida.

Finalmente, objeta o professor polonês, "mesmo que as reformas fossem irreversíveis, cumulativas e mobilizadoras, aonde elas conduziriam?" Certamente também não conduziriam ao socialismo. Reformas, no limite, conduzem a mais reformas, não ao socialismo. A questão do pleno emprego é uma demanda, hoje, de difícil atendimento. Mesmo que conquistada, tem como conseqüencia o retardamento das possibilidades de liberação do trabalho do jugo da alienação. Como o trabalho vivo está cada vez mais escasso, o movimento trabalhista e seus equivalentes partidários propugnam pela quixotesca medida de socializar o tempo de trabalho entre vários indivíduos, como forma de atender a mais trabalhadores. Isso aumenta a concorrência entre os trabalhadores jogando para o espaço a antiga solidariedade de classe e o "internacionalismo proletário", já que o indivíduo da China compete com o trabalhador de Igrejinha (RS).

O reformismo é o caminho inevitável dos socialistas em geral, mesmo os revolucionários pós-leninistas com franjas de poder; entretanto, tem que ser entendido nas suas limitações, como uma esfera que só tenha movimento de rotação (em volta do próprio eixo), onde está ausente o movimento de translação ao "céu socialista". E esse movimento de translação, de trânsito, é o busílis; como diz um personagem do Rubem Fonseca.

A adoção de reformas no exercício do poder executivo ocorre no marco da contingência política consubstanciada numa ação consciente face a relações desiguais de força. Contudo, no plano teórico não se pode borrar o horizonte das nossas determinações, e nem inventar sucedâneos com pedaços desconexos da realidade. O resultado, quase sempre, é um frankenstein-teórico de vida tão longa quanto as "células" que o compõem.

O sucedâneo da intuitiva metáfora de Adam Smith sobre a "mão invisível" do mercado, que tudo ajustará à sua lógica prosaica de melancias em carroça; seria a "mão visível" do mercado que, por um controle panóptico de técnicas infalíveis, teria o condão de instaurar o socialismo sem a abolição do mercado. O socialismo-com-mercado, então, seria uma questão de mais visibilidade ou menos visibilidade: o rebaixamento da teoria social a uma mera lei da ótica. No PT temos vários exemplos de filiação a esse bizarro socialismo-panóptico-de-mercado.

Se para os socialistas sinceros, ainda que infecundos, do maio de 68, o socialismo é a imaginação no poder; para o social-positivismo prevalece o postulado que rebaixa a imaginação à simples observação e controle gerencial do mercado. Reservando à imaginação tarefas tão criativas quanto ver televisão e consumir.

A contradição social-democrata ilustrada pela profissão de fé "marxista" em um socialismo baseado na luta parlamentar e num processo "natural" de superação do capitalismo não dava base de sustentação à gestão do Estado. Era preciso sustentar teoricamente o edifício de areia kautskiano. A primeira vitória nacional efetiva, pelo voto, dos social-democratas foi na Suécia, em 1920. Confrontaram-se, então, com a realidade, e foram socorrer-se de Keynes para imprimir alguma pecualiaridade diversa da política clássica do liberalismo.
"O keynesianismo forneceu o alicerce para o compromisso de classes, dando aos partidos políticos representantes do operariado uma justificativa para exercer cargos políticos em sociedades capitalistas", modelo do qual eles não queriam se afastar.

Agora havia uma razão para estarem no poder. A eliminação do "hiato do pleno emprego", assegurando que não haveria desemprego de homens e máquinas. Como? Aumentando o consumo. Com isso, refaz-se um círculo de legitimidade entre o pensamento distributivista social-democrata e a racionalidade keynesiana. Há uma convergência complementar de interesses entre o anseio "particularista" de consumo das classes assalariadas e o interesse "universal" da produção de mercadorias.

O casamento do keynesianismo com a social democracia foi exitoso até o final da década de 60. O declínio keynesiano corresponde à crise do capitalismo democrático, como assegura Przeworski. A ideologia neoliberal passa, então, a hegemonizar o conjunto das políticas econômicas do final do século 20, quando a social democracia não hesita em adotá-lo como base material de sustentação de uma fórmula de gestão que já não ruboriza-se em corresponder à integralidade dos interesses fetichizados da mercadoria. Onde, Tony Blair, do partido trabalhista inglês, e ex-primeiro-ministro da Inglaterra, pontifica como síntese acabada de um processo que transforma o indivíduo em estranho a si próprio, em favor de um personagem que suspeita dominar, mas que é por ele arrastado e subjugado.

A opção idealista, moralista e "naturalista" pela economia de mercado exauriu os remanescentes conteúdos "socialistas" da ideologia social-democrata. Tal como a taxidermia "empalha" animais para representá-los vivos à nossa memória; assim também a ideologia social-democrata representa um socialismo empalhado e nostálgico de um passado que nunca se faz futuro. E paralisa-se num eterno presente de divinização do mercado. Tributário dos próprios temores, se pereniza comovedoramente na ordem que só ousou contestar com frases respeitosas, sem verbo e sem predicado. Os ideais audaciosos estão arquivados na gaveta da resignação.

O neoliberalismo é a maquiagem refeita de uma velha ideologia que já foi tolerante com a democracia consentida pelo capital. A crise estrutural do sistema acentua-lhe a face autoritária e mal disfarça o sentido repúdio que sempre votou à democracia da forma liberal. "Os proprietários do capital rejeitam abertamente um compromisso que implica influência pública sobre o investimento e a distribuição de renda. Pela primeira vez em muitas décadas, a Direita possui um projeto histórico próprio: libertar a acumulação de todas as cadeias impostas pela democracia. Porque a burguesia não conseguiu completar a sua revolução." - finaliza Przeworski.

Irregularidades paralisam obras de integração do São Francisco

Por decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região em Brasília (DF), estão suspensas as obras de integração do rio São Francisco. O TRF acatou um pedido do Ministério Público Federal (MPF) que aponta irregularidades na aprovação do projeto pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos que aconteceu em janeiro de 2005. Uma delas seria que o projeto viola o Plano de Recursos Hídricos, pois utiliza o aproveitamento da água para fins econômicos. A informação é da Radioagência NP.

Na decisão emitida nesta segunda-feira (10) pelo TRF “as obras do Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias do Nordeste Setentrional ficam paralisadas, até que sejam cumpridas conforme a lei todos os procedimentos irregulares que antecedem a aprovação do projeto pelo Conselho”. Com a paralisação das obras, ficam suspensas todas as ações e medidas realizadas após a aprovação da obra entre elas, o Certificado de Sustentabilidade Hídrica emitido pela Agência Nacional de Águas em setembro de 2005. Este certificado garante ao empreendedor a disponibilidade do recurso hídrico para o uso proposto.

Movimentos populares de todo o país estão em campanha permanente pelo cancelamento deste projeto do governo. Segundo eles, o projeto é inviável economicamente, sendo que ele custará aos cofres públicos aproximadamente R$ 6 bilhões. Outra reivindicação é quanto à falta de debate com a sociedade sobre os impactos que a obra trará. Este foi outro argumento utilizado pelo Ministério Público Federal para paralisar as obras.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007


E agora, José Agá?

Muito bem, José Agá, o diário do grupo RBS, fez nos últimos dias uma radiografia dos sindicatos de empregados cujos dirigentes prevaricam e/ou se perpetuam no poder de suas entidades classistas. Muito bem. Aguarda-se, agora, que José Agá, faça a mesma radiografia no chamado Sistema S (Sebrae, Senac, Senai e Sesc), mantido com verbas estatais e das entidades patronais. Mais: pode aproveitar e passar um pente-fino também nos sindicatos patronais, federações e confederações de defesa dos interesses dos empregadores.

Os desvios encontrados nos sindicatos de empregados são lilliputianos, perto dos desvios gulliverianos dos patronais.

Aguardamos impacientes.

MST: "Entre Lula e o bispo, ficamos com o bispo"

Dom Luís Cappio recebeu ontem a visita do dirigente nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra) João Paulo Rodrigues. O líder dos sem-terra anunciou a adesão do movimento à campanha contra a transposição. "O MST entra agora com toda a sua força política nessa luta", afirmou. "Entre Lula e o bispo, ficamos com o bispo. Não queira Lula fazer o teste. A partir de agora vamos iniciar a luta contra as empresas transnacionais e em defesa do rio São Francisco. A briga vai ser boa." A informação está na Folha de hoje.

A estratégia do MST é nacionalizar o tema e desenvolver atividades, sobretudo no Rio. Ontem mesmo, nove pessoas iniciaram às 9h, em Campos (RJ), uma greve de fome de 24 horas em solidariedade ao bispo. Três deles são do MST e três da Comissão Pastoral da Terra. Um dos manifestantes é o padre T. G. Fonseca, de 83 anos. Os nove em jejum se reuniram desde cedo na praça São Salvador, a principal de Campos. Ao longo do dia, outros 50 manifestantes permaneceram no local em solidariedade ao bispo e aos manifestantes.

A transposição da maldição

O Governo através do Ministério da Integração Nacional declarou que "vai sair do campo da retórica" e já vai proceder a licitação das obras, orçadas nesta etapa, em R$ 100 milhões em vista da transposição do rio São Francisco. Derrubadas as liminares na Justiça, dissuadido o bispo que fez greve de fome, dom Luiz Flávio Cappio e com o discutível aval do Instituto Brasileiro de Agricultura e Meio Ambiente(IBAMA), pretende o Governo realizar agora a transposição. O argumento de base é emocional: "não se pode negar uma caneca de água a 12 milhões de vítimas da seca".

É exatamente no afã de dar água ao triplo de vítimas da seca que se deve questionar o projeto. Baseio meus dados num artigo publicado no dia 23 de fevereiro [2007] em O Estado de São Paulo do respeitável jornalista Washington Novaes "Um novo desfile e a mesma fantasia" e em outras fontes.

O apoio principal do projeto foi dado pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, onde o governo federal, sozinho, tem a maioria dos votos. Ao contrário, grandes especialistas na área como os professores Aziz Ab'Saber e Aldo Rebouças da Universidade de São Paulo, Abner Curado da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, João Suassuna da Fundação Joaquim Nabuco mostraram que o problema no Semi-Árido é mais de gestão do que de escassez.

A Agência Nacional de Águas (ANA) provou que é possível abastecer os municípios sem precisar da transposição do rio. O IBAMA que deu o aval, forneceu, sem querer, argumentos contra o projeto. Reconhece que 70% da água seriam para irrigação e 26% para o abastecimento de cidades; que a maior parte da água transposta iria para açudes onde se perde até 75% por evaporação; que 20% dos solos que se pretendia irrigar "têm limitações para uso agrícola"e "62% dos solos precisam de controle, por causa da forte tendência à erosão".

O Tribunal de Contas da União diz que o projeto não beneficiará o número de pessoas pretendido. Efetivamente, as comparações entre os projetos do Governo e da ANA, feitas por Roberto Malvezzi, bom conhecedor da bacia do São Franscisco, mostrou que o do Governo custaria R$ 6,6 bilhões, atenderia apenas a quatro Estados (Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará) beneficiando 12 milhões de pessoas de 391 municípios, enquanto o projeto da ANA custaria 3,3 bilhões, atingindo nove estados (Bahia, Sergipe, Piauí, Alagoas, Pernambuco, Rio do Norte, Paraíba, Ceará e Norte de Minas), beneficiando 34 milhões de pessoas de 1.356 municípios.

O próprio Comitê de Gestão da Bacia que conhece bem as questões do rio, foi por 44 votos a 2 contra a transposição; diz ainda que esta atende a menos de 20% do Semi-Árido e que 44% da população do meio rural continuaria sem água. São razões de grande peso.

Se o Governo quiser efetivamente levar água aos sedentos do Nordeste deve reabrir a discussão pública ou então encampar o projeto da ANA. Caso não ocorrer, podemos contar com nova greve de fome do bispo dom Luís Flávio Cappio. Entre o povo que não quer a transposição e as pressões de autoridades civis e eclesiásticas, ele ficará do lado do povo. E irá até o fim.

Então a transposição será aquela da maldição, feita à custa da vida de um bispo santo e evangélico. Estará o Governo disposto a carregar esta pecha pelo futuro afora?

Artigo de Leonardo Boff, teólogo. Publicado no diário carioca, Jornal do Brasil, em 26 de fevereiro de 2007, e em outros 60 diferentes jornais do Brasil, com versão em espanhol e em inglês.

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