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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?

quarta-feira, 30 de abril de 2008


A morte comanda o cangaço

Não sejamos paranóicos. Mas não temos direito de ser tontos.

Quando em política se multiplicam coincidências, devemos sempre estar atentos. Enfim, o que se passa em nossas fronteiras da chamada Calha Norte?

Desde o bombardeio e invasão do Equador pelas tropas do narco-presidente colombiano, Álvaro Uribe, há um mês, seguido de uma inesperada visita da chefa do Departamento de Estado de Washington, senhorita Condoleezza Rice, fatos aparentemente isolados têm colocado as nossas fronteiras da região conhecida como Calha Norte, nas manchetes de jornais.

Depois das pressões de Miss Condie, em torno da "flexibilização das fronteiras nacionais", sempre que se tratasse da necessidade de perseguir "terroristas", a instabilidade ronda a região.

O primeiro caso foi a crise aberta pelos "arrozeiros" em parceria com o general Augusto Heleno Pereira, comandante militar da Amazônia, contra a demarcação da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol (RR).

Em seguida, a revista "IstoÉ" publica longa matéria sobre suposta guerrilha em Rondônia.

Por fim, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, anuncia – contrariando toda a política externa do Governo a que deveria servir, anuncia que, se as Farc pisarem em solo brasileiro, serão recebidas a bala.

Depois que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva homologou a Reserva Raposa-Serra do Sol (2005), os "arrozeiros já atacaram quatro comunidades indígenas, incendiaram 34 casas, espancaram e balearam índios, arrebentaram postos de saúde. Somente agora, no entanto, a crise ganharia um novo protagonista: o comandante da região, general Heleno, um militar da linha dura do regime pós-64, que ganhou notoriedade por seu envolvimento no escândalo do hoje ex-juiz Nicolau dos Santos Neto. Além disto, em 2004, pouco depois de assumir seu posto de chefe da Força de Estabilização do Haiti (Minustah), atribuiu a violência naquele país às críticas do então candidato democrata à Presidência dos EUA, John Kerry, contra a deposição do presidente Jean-Bertrand Aristide pelo consórcio Washington-Paris. A declaração gerou um incidente diplomático. No ano seguinte (2005), o general foi acusado, em documento lançado pelo Centro de Justiça Global da Universidade de Harvard, de dar cobertura à campanha de terror da Polícia Nacional do Haiti, e de violação (pela própria Minustah) de direitos humanos.

Agora, com suas declarações, o general violou triplamente a Constituição: primeiro, por que esta define que os oficiais da ativa devem obediência a seus superiores na cadeia de comando, em cujo topo está o presidente da República; segundo, por que a Constituição consagrou (artigo 231) o direito dos índios às terras que tradicionalmente ocupem; finalmente, por que é papel das Forças Armadas zelar pela aplicação da Carta. Assim, ele – e não os índios ou a Reserva – colocou em risco a Segurança Nacional. Mais que isto, clubes militares se manifestaram, abaixo-assinados circularam, o DEM cerrou fileiras.

Acontece que as terras demarcadas e outrora propriedade dos arrozeiros é uma área entre duas cadeias de montanhas, única passagem, naquele estado, de acesso à Venezuela.

A suposta guerrilha em Rondônia, denunciada pela revista "IstoÉ" há duas semanas, é outro mistério. De acordo com a "IstoÉ" de Daniel Dantas (Banco Opportunity), a Liga dos Camponeses Pobres (LCP), estaria implantando uma guerrilha naquele Estado. A revista descreve supostos acampamentos, homens e mulheres usando passa-montanhas, descreve ações que teriam sido levadas a cabo na região, supostos contatos com as Farc, etc.

Algo difícil de acreditar. Implantar e ativar uma guerrilha hoje, no Brasil, soaria tão suspeito quanto o atentado do 11 de setembro de 2001 contra as Torres Gêmeas, ou o Incêndio do Reichstag na Alemanha dos anos 1930.

Um documento lançado pela LCP, dias depois que a revista começou a circular, denunciou um massacre a um dos assentamentos de camponeses organizados pela Liga, com dezenas de mortos e outro tanto de desaparecidos.

Em documento entregue ao desembargador José Gercino Filho, da Ouvidoria Agrária Nacional, e ao deputado Anselmo de Jesus, o sacerdote e advogado Afonso Maria das Chagas, também membro da coordenação da Comissão Pastoral da Terra de Rondônia (CPT-RO) desqualifica a reportagem pela sua falta de clareza, sensacionalismo e por "passar a impressão de agir com poderes de polícia". Refere-se ainda a um fato constatado na região onde "um grupo de 'funcionários' efetuou uma reintegração judicial (sic) à força, para não dizer à bala, sem que nada os afetasse".

De acordo com o documento, "Tornou-se pública a nota encaminhada pela Secretaria de Segurança (...) informando que, em momento algum, por parte do Estado, foi dito sobre a existência de guerrilha na região de Campo Novo, Buritos, Jacinópolis".

O texto diz ainda que o tipo de informação veiculada pela revista só pode ter como objetivo lançar uma cortina de fumaça sobre os problemas do Estado, e criminalizar os movimentos camponeses. Ainda que grave, gostaríamos de acreditar que o objetivo da publicação do senhor Dantas seja apenas esse.

Rondônia – encravada entre o Amazonas e o Mato Grosso, tem uma vasta fronteira com a Bolívia.

Editorial do jornal Brasil de Fato, edição 270, de 29 de abril de 2008.



Deu piti em dona Yedinha, ontem

Dona Yedinha é do balacobaco, uma farrista que não tem compromisso nem com o seu próprio governo. Não é que ontem, em Brasília, ela baixou o sarrafo no governo federal por causa da morosidade de um repasse de recursos para a irrigação, na ordem de 10 milhões de reais.

A senhora bravateira está numa situação de penúria fiscal e penúria moral, mas ainda assim encontra disposição para simular uma briga com quem pode tirá-la do desvão no qual se encontra – menos no desvão ético-moral.

Qual será mesmo o propósito de uma pessoa que age desta forma?

Vejam só: ela inventou esse negócio de irrigação durante a campanha eleitoral, prometeu que no Rio Grande irrigado o mel escorreria nos campos. Chegando ao Piratini, não fez nada para implantar o seu projeto retórico, além de vasculhar recursos federais que pudessem sustentar o seu impulso demagógico-eleitoral. Conseguiu, existem os recursos federais para projetos de irrigação e conservação de bacias. No entanto, os repasses estão morosos, porque os projetos dos municípios a serem atendidos são inconsistentes ou falhos.

Dona Yeda, então, surta. Suas ansiedades, neuroses, desadaptações desabam sobre o governo Lula, o endereço mais impróprio e inadequado para despejar os seus fantasmas. No momento delicado, na hora em que necessita ver aprovado seu pleito de um bilhão de dólares junto à União, ela dá piti.

Quer dizer, a senhora é uma pândega – não pode, de fato, ser levada a sério. Hoje à noite viaja para um recreio obscuro nos States. A única coisa que está clara é que ela vai se encontrar com Arnie Schwarzenegger, o velho e bom Exterminador do Futuro. Leva um fotógrafo oficial para acompanhá-la.

Mal posso esperar pelas fotografias.



Quem não sabe quem é Lair Ferst?

Quem não sabe quem é Lair Ferst? Ele é uma figura da mais alta periculosidade”.
Sanchotene Felice (PSDB), prefeito de Uruguaiana

Conheço a ficha do Lair. Quando eu estava no Palacinho ele era proibido de entrar. Jamais o recebi”.
Antonio Holhfeldt (PMDB), ex-vice-governador do RS

É um companheiro”.
Governadora Yeda Crusius (PSDB)

Pescado do blog RS Urgente

terça-feira, 29 de abril de 2008


O declínio dos jornais

Saíram novos números de circulação nos EUA e o "New York Times" de papel caiu 3,9%, contra a redução de 1% do "Wall Street Journal". Mais dramaticamente, a "Advertising Age" iniciou ontem uma série sobre o "declínio" dos jornais em geral intitulada "vigília da morte" (death watch). A informação é do jornalista Nelson de Sá, na Folha, hoje.


Angeli

Turismo para a terceira idade

Leio que a governadora tucana Yedinha Crusius vai passar o próximo final de semana em Nova York. Vai a um evento de governadores, onde espera encontrar o seu colega da Califórnia, Arnie Schwarzenegger. Segundo Rosane de Oliveira, jornalista e abelhinha, la Crusius é admiradora de Arnie, embora não fique claro a qual Arnie ela é tiete.

Mike Davis, professor de Teoria Urbana no Instituto de Arquitetura do Sul da Califórnia, no seu livro recentemente lançado Apologia dos Bárbaros (Ed. Boitempo, com ilustrações de Latuff), assegura que Arnold Schwarzenegger mudou da água para o vinho, depois de novembro de 2005. Eleito pelos republicanos neoconservadores em 2004, Arnie enfrentou e perdeu um referendo público, onde sua popularidade caiu a níveis intoleráveis. Ele reagiu à maneira keynesiana, trocando os assessores neocons, de republicanos para democratas, e lançou títulos públicos para financiar 68 bilhões de dólares em escolas (viu, dona Yeda!), rodovias, canais de irrigação e energia alternativa, e ainda teve o topete de desafiar Bush com um mega programa de combate ao aquecimento global.

Mas por que eu estou falando nisso? Bobagem! Dona Yeda quer mesmo ir à NY ver o velho Schwarzenegger, aquele protagonista de O Exterminador do Futuro. E como está fazendo turismo mesmo, e o Estado que governa está quebrado, ela certamente não está queimando recursos públicos neste recreio particular, vai usar o programa Viaja Mais Melhor Idade, do governo Lula.

Boas fotos com Arnie, dona Yeda!



O dedo podre

Um amigo memorioso me contou sobre o início da carreira política de dona Yedinha Rorato Crusius, a mesma carreira que por ora parece estar chegando aos capítulos finais.

Vou abreviar bastante, para não enfastiar ninguém com tanta gente chata.

Em 1993, logo depois de ter assumido a presidência, Itamar Franco (1992-1995), queixa-se ao senador Pedro Simon (PMDB-RS) de que precisava escolher uma mulher para o seu ministério, em especial para a pasta do Planejamento, Orçamento e Coordenação. Simon, que gaba-se de não ter o dedo podre (bem ao contrário do que se sabe dele), saltou e disse numa torrente de perdigotos:

- Presidente, eu conheço uma moça do Rio Grande, uma comentadora de TV que fala sobre economia para as donas de casa, economista, professora da Federal e bonita. Acho que pode lhe servir. Que tal?

Itamar pensou um pouco, ajeitou as idéias sob os cabelos rebeldes, e respondeu satisfeito:

- Me parece perfeito, senador Simon. Mande chamá-la.

A professora Yeda durou setenta dias no ministério do Planejamento. O presidente Itamar sequer lhe comunicou a sua exoneração. Ela ficou sabendo que já não era mais ministra através do Diário Oficial da União.


A barriga do Correio do Povo

O jornal do grupo midiático Record, de propriedade da Igreja Universal do Reino de Deus, Correio do Povo, também cometeu uma barriga rombuda, hoje.

Na capa, o CP (des)informa que Yeda tenta garantir o empréstimo do BID. A governadora tucana não quer nada do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), ela quer sim um empréstimo do BIRD (Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento ou simplesmente Banco Mundial, The World Bank).

O letramento nas redações do PIG está alcançando os níveis mais baixos da história. Já está ficando constrangedor.



A barriga de Zero Hora e o golpismo branco da governadora tucana

A manchete de Zero Hora, hoje, na página 6, comete um erro vulgar. Não é o STF (Supremo Tribunal Federal) que deve avalizar o empréstimo do governo estadual junto ao Bird (Banco Mundial). Quem avaliza, afiança, garante a idoneidade e abona o recurso tomado ao banco é o governo federal através do Ministério da Fazenda, mais precisamente a Secretaria do Tesouro Nacional, que observa os aspectos legais e técnico-financeiros da operação bancária internacional.

Ora, se ano passado o Estado tinha despesas com pessoal superior ao limite máximo admitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal – e tinha – é certo que está inabilitado para assumir o compromisso do empréstimo.

Neste caso, o avalista – o governo federal, e não o STF como quer o jornal da RBS –, recua das suas intenções. É o impasse atual.

A governadora tucana Yeda Crusius foi ontem ao presidente do Supremo, seu companheiro de ideal partidário, Gilmar Mendes, como forma de atalho para conseguir o empréstimo de um bilhão de dólares. Atitude inútil, perigosa e desinteligente – como afirmamos aqui ontem, em outro post (abaixo), pelos motivos já comentados.

A reação pelo alto – recorrendo à mais alta corte do Judiciário – para solucionar problemas que não foram tratados a tempo e lugar, está sendo um gesto típico da direita brasileira. Alijada do Executivo, a direita trata de recorrer ao Poder Judiciário para garantir direitos e privilégios que julgam inalienáveis e quase naturalizados.

O gesto da governadora tucana é típico desta solução pelo alto. Ela não consegue compreender que vivemos em um Estado republicano, onde prevalece a repartição funcional dos poderes e que existem prerrogativas e responsabilidades que não podem ser desconstituídas com uma simples liminar preventiva concedida pelo Judiciário. Este, se o fizer, estará golpeando a Constituição.

Vou repetir o que foi dito aqui, ontem: “dona Yeda vai estabacar-se novamente” – por pura incapacidade de ler os códigos da política republicana.

Mas antes disso, estabacou-se o jornal Zero Hora, com a barriga de hoje. E não é barriga de chope.


segunda-feira, 28 de abril de 2008


Transgênicos produzem menos, diz estudo norte-americano

Um novo estudo conduzido durante os três últimos anos pela Universidade do Kansas, nos Estados Unidos, comprovou que a soja transgênica produz cerca de dez por cento a menos do que a soja convencional. A informação é da Agência Chasque.

O novo estudo confirma uma pesquisa anterior feita na Universidade de Nebraska, que demonstrou que uma outra variedade transgênica da transnacional Monsanto produziu seis por cento menos que a sua similar.

De acordo com a matéria do jornal inglês The Independent, a transnacional declarou estar surpresa com o tamanho da queda de produtividade demonstrado pelo estudo do Kansas. No entanto, a empresa reconheceu que a soja transgênica pode ser menos produtiva do que a convencional, já que ela foi modificada para tolerar a aplicação de herbicida. A Monsanto relatou que agora está desenvolvendo uma soja para ser mais produtiva.


ZH não vai cobrir as gauchadas em Roraima?

Tarda a cobertura de Zero Hora sobre os sul-rio-grandenses que colonizam o norte de Roraima, plantando arroz em território indígena e cometendo barbarismos de toda a ordem e tamanho.

Eu cobro a matéria da RBS porque esta se notabiliza no esforço chauvinista de dar destaque a tudo que diga respeito a “gaúchos e gauchadas”, seja o que fôr, as maiores idiotices cometidas por alguém nascido no Rio Grande, tem destaque garantido nos seus veículos, tudo de forma absolutamente acriteriosa e patrioteira.

É hora, pois, de ZH mandar aqueles seus repórteres investigativos de hotel averiguar o que passa com os seis guascas que estão brutalizando o extremo Norte do Brasil.

Segundo denunciou o reconhecido antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, ainda no domingo (20/4) ao jornal Estadão, “as notícias que temos são as de que, desde a homologação [das terras indígenas], produtores rurais que estão fora da lei já atacaram quatro comunidades indígenas, incendiaram 34 casas, arrebentaram postos de saúde, espancaram e balearam índios.”

O antropólogo completa a denúncia nominando um “gaúcho” como um dos responsáveis pelas brutalidades: “Paulo César Quartiero, o arrozeiro-mor, foi preso na semana passada por desacato à autoridade. Já está solto, mas, enfim, esse é o clima de hostilidade que reina por lá.”

Outras notícias informam que a “gauchada” se salienta por inúmeras especialidades, além de plantar arroz em áreas duplamente ilegais (por serem indígenas e por praticarem o desmatamento irregular), como o de trabalharem com madeira ilegal, comércio clandestino de armas e munições, plantio de soja em áreas irregulares, e o famigerado “modo de produção gaúcho”, como já é denominado por lá o plantio extensivo de monoculturas de grãos, aplicação maciça e indiscriminada de defensivos químicos, desrespeito às matas ciliares e fontes de aguadas, uso de trabalhador análogo à escravidão, derrubada ilegal da mata para implantação de pecuária extensiva, grilagem de áreas devolutas, falsificação de documentos, manutenção de milícias armadas, etc.

Como se pode notar, é uma pauta e tanto!


Yeda vai estabacar-se novamente

Rosane de Oliveira, jornalista e abelhinha, comenta em sua coluna hoje em ZH que “o governo gaúcho precisa ter garantias de que a União não vai tentar embargar o acordo com a alegação de não cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal em relação a gastos com pessoal”.

No permanente tom de quem não só explica, mas justifica os atos tucanos no Piratini, Rosane continua:

“Foi isso o que o governo tentou fazer com um pedido de liminar negado à época em que a governadora estava em Washington. Para tentar derrubar a decisão, Yeda vai a Brasília hoje conversar com o presidente do Supremo, Gilmar Mendes.” – completa a jornalista da RBS.


........

A governadora – como se diz – está procurando sarna para se coçar. Certamente, vai se estabacar outra vez, o quadragésimo tropeço em menos de dois anos de governo.

O que dona Yeda quer fazer? Vai ratificar o erro anterior, o de ter entrado com uma liminar preventiva para conseguir que o empréstimo seja aprovado pela Secretaria do Tesouro. Ou seja, a governadora quer que o Judiciário obrigue o Executivo a aprovar o empréstimo internacional para o RS. Depois de tratativas difíceis, morosas, mas sempre amigáveis, dona Yeda quer agora desencravar o dinheiro a golpes de torquês.

Mas não satisfeita com o primeiro erro (grave), dona Yeda desta vez vai conversar (ou constranger) o ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, para quem sabe torná-lo um aliado do Piratini.

Esforço inútil, perigoso e desinteligente. Inútil, porque Gilmar Mendes se não é um tucano de direito, o é de fato, haja vista a caravana tucana semana passada, quando da sua posse na presidência do Supremo. Perigosa, porque dona Yeda, com essa atitude, está desafiando o Ministério da Fazenda com uma demonstração desrespeitosa de assédio ao Judiciário. Desinteligente, porque quer fazer prevalecer suas relações cordiais com Gilmar Mendes sobre atos administrativos que são da inteira responsabilidade do Executivo.

O que quer Yeda? Que o Judiciário intervenha no Executivo, só porque a governadora padece de ansiedades?

Rosane de Oliveira, sem querer, está fazendo a crônica anunciada da próxima estabacada da governadora. Mais uma, para a sua coleção de tombos e trombadas.

domingo, 27 de abril de 2008


Dez mais sete

Um amigo me telefona, está lendo “Hiroxima”, livro do jornalista John Hersey, um dos expoentes do chamado jornalismo literário, muito cultuado pelo público norte-americano.

Ele, o meu amigo, conta que Hersey informa que em Hiroxima, lá pelos anos 80, tinham precisamente 753 livrarias. A cidade que foi destruída pelos norte-americanos no final da Segunda Guerra, hoje tem cerca de um milhão de habitantes.

Porto Alegre tem 1,3 milhão de habitantes. Aqui, o número de livrarias, que às vezes são papelarias, é dezessete, 17, o número cardinal logo acima de 16.

Isso pode explicar muita coisa.

sábado, 26 de abril de 2008


Ah, as cruas verdades que levo no íntimo!

Ao perguntar pelo senador Pedro Simon me vem à lembrança um pequeno escrito de Jorge Luis Borges, uma prosa poética dos anos setenta publicada na The New Yorker. O nosso poeta Paulo Hecker Filho, falecido em 2006, se não estou enganado, selecionou este texto borgiano para o seu livro Só poema bom (Editora Alcance, 2000).

Vejamos se não tem a cara do senador – o responsável indireto, a meu ver, pelo acanalhamento da política guasca, nos últimos anos, e padrinho eletivo de notáveis especialidades como Antonio Britto, José Fogaça, Germano Rigotto (que a direita maragata está cevando novamente para 2010) e a indizível Yedinha Rorato Crusius.

Cada vez que leio algo escrito contra mim, não apenas compartilho da idéia, como sinto que eu próprio podia expressá-la melhor. Talvez devesse aconselhar aos potenciais inimigos que me enviem antes as suas queixas que garanto receberão minha ajuda e apoio. Cheguei a querer escrever em segredo, com pseudônimo, uma implacável diatribe contra mim mesmo. Ah, as cruas verdades que levo no íntimo!

Jorge Luis Borges (1899-1986)

A propósito, o senador Simon não vai mesmo se pronunciar sobre esse furacão guasca, provocado pelo maior assalto aos cofres públicos da história meridional, enquanto a governadora recém eleita comprava uma casa valiosa em condições muito obscuras? Simon, como farol que ilumina a política rio-grandense-do-sul há quatro décadas, e influi decisivamente nos rumos (errantes) do Estado, precisa escrever a diatribe contra si mesmo.

Senador, o Rio Grande lhe aguarda! Já sei, está encabulado, ainda não é o momento blá-blá-blá. Faz o seguinte, então: usa um pseudônimo.

Farsa por farsa...


sexta-feira, 25 de abril de 2008


Os blogs contra o PIG (Partido da Imprensa Golpista)

PT versus Lula?

A Executiva Nacional do PT – hoje dominada por um arranjo que restituiu a hegemonia ao velho Campo Majoritário – proibiu ontem uma coligação com o PSDB à Prefeitura de Belo Horizonte, contrariando negociação entre o atual prefeito da capital mineira, Fernando Pimentel (PT), e o governador de Minas, Aécio Neves (PSDB).

A proibição abre uma crise entre a Executiva e Pimentel, que considerou o veto "um desrespeito" e uma "decisão politicamente equivocada". Os petistas mineiros não descartam recorrer à Justiça caso não consigam derrubar a decisão no partido.

A decisão da direção partidária se choca com a engenharia político-eleitoral que está sendo cerebralmente montada pelo presidente Lula, visando 2010.

Lula, se fôr questionado, negará, mas é certo que prepara três cenários para a sua própria sucessão. Um, com Aécio Neves na cabeça, filiado ao PMDB. Dois, com a ministra Rousseff na cabeça. Três, com o deputado Ciro Gomes na cabeça. Na primeira e na terceira opção, a ministra mãe do PAC seria a candidata a vice.

O domínio quase pleno do lulismo na macro conjuntura atual e a sua projeção estratégica nos cenários futuros levam a direita e o PIG, em especial, à beira de um ataque de nervos. Só assim é possível entender a repercussão da fala de um general da ativa criticando ações administrativas do governo em faixas de fronteira e vaticinando absurdamente que em Roraima se instala um novo Kosovo.

Em vista disso, é de estranhar muitíssimo que o petismo chapa-branca (desculpem o pleonasmo!) manobre no sentido de desautorizar ações políticas que, em última instância, são articuladas com zelo e coordenadas com perícia (sem entrar no mérito) pelo próprio presidente Lula. Salvo que esses dirigentes sejam suicidas políticos, ou aloprados demais para ignorarem o que passa defronte os seus narizes. Ou ambos.




Yeda sente o chão mole a seus pés

Está havendo um pequeno, mas sensível deslizamento na base de aliados do governo tucano no Rio Grande do Sul. A RBS sai da ortodoxia de apoiar Yeda Crusius em qualquer circunstância e passa a oscilar num movimento pendular de vaivém. A Operação Rodin e a CPI do Detran minam cada vez mais as forças de um governo anêmico e vacilante, cuja titular comete o erro primário de adquirir uma casa valiosa às vésperas de assumir a direção do Estado.

Hoje, ZH chega a abandonar sua militância PIG, ainda que num relâmpago, para fazer um jornalismo comme il faut, ao informar sobre o estranho encontro entre o secretário Culau e o indiciado e super-lobista Lair Ferst (foto). Aliás, a governadora, se agisse como se espera do ocupante da cadeira do robespierreano Júlio de Castilhos, mandaria o ingênuo Ariosto Culau ir tomar chopp para sempre longe da secretaria e perto dos seus amigos temerários.

Ontem, também, a governadora aproximou-se do empresário Jorge Gerdau, um dos padrinhos da sua candidatura e um dos orientadores espirituais de nove entre dez governos de direita no RS. Yeda assinou um convênio sobre excelência na educação com a corporação Gerdau, muito mais um ato simbólico do que algo que vá efetivamente fazer a diferença no caos do ensino público no Estado. Espetáculo puro, e uma exibição em cena aberta de que o padrinho ainda aposta no yedismo trololó.

De qualquer forma, sentind0 o chão ficar mole a seus pés, a governadora trata de reforçar as costuras da aliança que a fez chefe do Executivo.

O loteamento das OSCIPS, que administrarão cerca de 35 entidades e órgãos públicos estaduais, é um fator de coesão político-social (movido pelo velho clientelismo repaginado) da sua base de aliados e permite um fôlego prolongado a um governo sem projetos e sem realizações. Tanto isso é verdade, que a propaganda yedista na tevê exalta o pólo naval de Rio Grande como se fôra fruto do empenho e tenacidade do tucanato guasca, quando se sabe que trata-se de investimento federal que vêm se juntar a inúmeros outros – sempre da área federal – para sacudir o Rio Grande e tirá-lo do marasmo a que foi imposto pelos governos Rigotto-RBS-Farsul-Fiergs-Gerdau-Yeda.

Foto: Marcos Nagelstein/ZH

quinta-feira, 24 de abril de 2008


Santiago

A sintonia entre Lugo e Tabaré

O presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo, se sente espelhado no presidente uruguaio, Tabaré Vázquez. “Tenho uma sintonia absoluta com meu querido amigo o presidente Tabaré, com quem compartilho a mesma idéia de fortalecer a unidade continental e a integração regional”, afirmou Lugo ao jornal uruguaio La República, de segunda-feira passada (fac-símile).

“Existe uma grande coincidência entre a Aliança Patriótica (que encabeça Lugo) e a Frente Ampla, salvando as diferenças, porque a Frente Ampla tem 30 anos de construção e nossa Aliança tem somente oito meses”, disse Lugo. “Nossa grande inspiração em todo este processo foi, precisamente, a experiência uruguaia da Frente Ampla”, enfatizou. “Foi uma grande alegria a chamada de Tabaré, que me transmitiu os melhores votos”, disse o bispo.

......

É conhecida de todos a moderação do presidente Tabaré Vázquez, que transita sobre a linha tênue que separa o que se chama de neoliberalismo fraco e um progressismo tartamudo.

Quanto a Lugo... a ver.



General Heleno reconhece ligações com o juiz Lalau

O jornalista Janio de Freitas, em sua coluna de hoje na Folha, lembra passagens da vida do valente general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, e que no último dia 16 fez um pronunciamento provocativo e indisciplinado contra o governo Lula acerca dos recentes conflitos em áreas indígenas no extremo Norte do País.

Janio lembra das ligações do general Heleno com o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, o Lalau (foto). Diz o jornalista:

“O general Augusto Heleno Pereira, tido como identificado com a velha linha dura, constitui-se em uma figura polêmica. Chegou ao noticiário por ocasião das investigações em torno do (ex) juiz Nicolau dos Santos Neto, quando foram descobertos quase 200 telefonemas desse hoje condenado para o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, cerca de metade reconhecida pelo general como destinada a ele”.

Mais adiante, Janio lembra outros fatos envolvendo o general indisciplinado, assim:

Em junho de 2004, o general Augusto Heleno Pereira assumiu a chefia da Força de Estabilização do Haiti (chamada Minustah), tropa composta pela ONU com 6.500 soldados de 12 países para deter a desordem posterior à derrubada, pelo governo Bush, do presidente (eleito) Jean-Bertrand Aristide. Em março de 2005, porém, foi lançado nos Estados Unidos e na Suíça o relatório "Mantendo a paz no Haiti?", do Centro de Justiça Global e da Universidade Harvard, com críticas severas envolvendo o comando do general brasileiro. Eis um trecho:


"A Minustah tem dado cobertura à campanha de terror da polícia nas favelas de Porto Príncipe. E mais impressionante do que a cumplicidade com abusos da Polícia Nacional do Haiti são as acusações de violações de direitos humanos perpetradas pela própria Minustah". Seguiam-se casos, com dados. O general, como esperado, refutou as críticas. Mas já provocara um incidente internacional, alguns meses depois de chegar ao Haiti: atribuiu a violência no país ao então candidato democrata à Presidência dos EUA, John Kerry, que criticara a derrubada de Aristide. O general, como foi dito à época, "recuou das declarações".


Com apenas um ano e dois meses no Haiti, o general Augusto Heleno Pereira deixou o comando. Sua explicação pessoal para a volta, ao chegar, foi de pedido seu, por já ter "ficado bastante lá" (a tropa e os brasileiros estão até hoje no Haiti). No discurso de passagem do comando, fizera emocionado agradecimento à família pela "força dada diante das críticas injustas".
Com sua manifestação para a platéia do Clube Militar, o general Augusto Heleno Ribeiro Pereira reabriu portas para o que pode ficar como polêmica mal posta, mas há quem prefira involuí-la para crise.

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, por sua vez, ainda não se manifestou sobre a indisciplina de um general seu subordinado. Já se passaram oito dias do grave discurso proferido pelo general Heleno no Clube Militar do Rio de Janeiro.



O mito “Tiradentes” enfrenta um novíssimo mito (reacionário) - o “1808”

História contrafactual

Dois poderosos símbolos históricos brasileiros estavam em exibição nesta semana, ou deveriam estar. Em resumo, "Tiradentes", de um lado, e "1808", do outro.

Trata-se de mitologias em certa medida inventadas: o mito cultivado pela Velha República, no século 19, em torno do alferes Joaquim José da Silva Xavier, ante a nova mitologia que vem emergindo com a reabilitação do príncipe herdeiro dom João no bicentenário de sua chegada ao Rio de Janeiro a fim de estabelecer uma corte européia transoceânica em solo brasileiro.

Os mineiros modernos fazem tudo o que podem a cada Dia de Tiradentes, como fizeram na segunda-feira, para fazer da solene lembrança de aspirações tragicamente abortadas de independência, república progressista e constitucional e soberania nacional -defendidas por Tiradentes e seus colegas de conspiração em 1789- um circo político paroquiano. Os cariocas, enquanto isso, fizeram da celebração do 1808 uma desculpa para "re-portuguesar" a historiografia do período e celebrar todas as coisas que Tiradentes havia tentado rejeitar e repudiar: monarquia, deferência e sujeição às preocupações e envolvimentos europeus.

Estranhamente, não sabemos que aparência tinha Tiradentes. Os fragmentos de documentação que sobrevivem do século 18 indicam, porém, que era carismático, persuasivo, contencioso, inimigo das convenções e corajoso. Para "1808", por outro lado, temos um rosto definido com muita clareza em múltiplos retratos: o príncipe regente, dom João, era certamente desprovido de carisma, cronicamente indeciso, muito acomodado e excessivamente gordo e feio.

Mas um desses homens, Tiradentes, fracassou, enquanto o outro, dom João, apesar de toda a sua indecisão, agiu quando era necessário agir e tomou a extraordinária medida de transferir a corte portuguesa ao Brasil -onde ele estaria seguro contra as ameaças de Napoleão e do exército deste, bem como mais independente da Grã-Bretanha e de sua poderosa marinha. Tiradentes tentou mudar a história; dom João conseguiu.

As conseqüências desse fracasso e desse sucesso, sem dúvida, ajudaram a fazer do Brasil o que ele é. O legado de dom João envolvia continuidade, autoridade, centralismo, burocracia e unidade territorial. O caminho da rebelião, democracia, federalismo e cidadania participativa que Tiradentes propunha não foi seguido.

Será que o Brasil teria se saído melhor caso Tiradentes tivesse triunfado? É impossível dizer. Mas certamente teria sido diferente.

Artigo do historiador britânico Kenneth Maxwell, publicado hoje na Folha.


Valei-me santo Expedito!

Ontem, a governadora tucana, Yeda Crusius foi convidada pelos seus parceiros da RBS para uma entrevista no chamado “Jornal do Almoço”, que vai ao ar ao meio-dia pela RBS TV.

Foi um diálogo ameno, entre compadres e comadres (não parecia um programa com propósitos jornalísticos). Respirava-se uma atmosfera entre o cinismo e a falsa serenidade. Só faltou a legenda “Os Cães Ladram e a Caravana Passa”.

Lá pelas tantas, dona Yeda manifestou seus conhecimentos enciclopédicos sobre o instituto religioso da santidade, assim:

- Ninguém é santo. Santo é aquele que a Igreja diz... pronto, vamu lá!... este protege a saúde, outro protege as causas impossíveis... o governo não é uma causa impossível! Mas eu chamo sempre o santo Expedito, não tenho dúvida disto.



Na fronteira da legalidade

Num ato de massa, diante de 3.500 convidados, entre os quais os cavalheiros da fotografia acima, e grande parte do mundo tucano de Brasília, assumiu ontem o novo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Gilmar Ferreira Mendes. Ele ocupou uma cadeira no STF em 2002, nomeado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), presente na seleta platéia.

Ontem, Mendes agradeceu publicamente seu padrinho tucano, pela indicação, e aproveitou para cobrar “firmeza” das autoridades em virtude de agressões à comunidade em geral, numa referência à ação de movimentos sociais que, de acordo com ele, atuam, "às vezes, na fronteira da legalidade".

A propósito do ministro Gilmar Mendes, vejam o que diz dele o respeitado antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, em entrevista que recomendamos ontem aqui (e cujo link para leitura está aí logo abaixo):

“Sabe quantos são os arrozeiros que exploram terras da reserva [em Roraima]? Seis. Não há dúvida de que o que se quer são poucos brancos, com muita terra. Outra inverdade: as terras da reserva são dos índios. Não são. Eles não têm a propriedade, mas o usufruto. Porque as terras são da União. E a União tem o dever constitucional de zelar por elas. Já os arrozeiros querem a propriedade. As notícias que temos são as de que, desde a homologação, produtores rurais que estão fora da lei já atacaram quatro comunidades indígenas, incendiaram 34 casas, arrebentaram postos de saúde, espancaram e balearam índios. Paulo César Quartiero, o arrozeiro-mor, foi preso na semana passada por desacato à autoridade. Já está solto, mas, enfim, esse é o clima de hostilidade que reina por lá.” [...]

A declaração do ministro Gilmar Mendes a esse respeito é espantosa. Ele defende a demarcação de ilhas, e não de terras extensas. Em primeiro lugar, não sabia que ministro do Supremo é demarcador de terras. Demarcar é ato administrativo, cabe ao governo, não ao Judiciário. Em segundo lugar, as terras indígenas já são um arquipélago no Brasil. Acho curiosa essa expressão: demarcar em ilhas. Significa ilhar, isolar, separar. Demarcar de modo que um mesmo povo fique separado de si mesmo.”

Será que a menção aos que estão “na fronteira da legalidade” tem a ver com os barbarismos cometidos por arrozeiros fora-da-lei contra os indígenas de Roraima?


quarta-feira, 23 de abril de 2008


Eugênio Neves

A natureza é contínua, e o espírito, descontínuo

O que significa o “perspectivismo amazônico” do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro (conforme ele próprio explica na excelente entrevista abaixo indicada)?


”Fiz um trabalho teórico que não é só meu, é dos meus alunos também. Faço uma experiência filosófica que no fundo é muito simples. Temos uma antropologia ocidental, montada para estudar os outros povos, certo? O que aconteceria se vocês imaginassem uma antropologia feita do lado de lá, ou seja, do ponto de vista indígena? Foi isso que me levou a entender que, para os índios, a natureza é contínua, e o espírito, descontínuo.

Os índios entendem assim: há uma natureza comum e o que varia é a cultura, a maneira como me apresento. Daí a preocupação de se distinguir pela caracterização dos corpos. E as onças, como se vêem? Como gente. Só que elas não nos vêem como gente, mas como porcos selvagens. Por isso nos comem. Enfim, para os indígenas, cada ser é um centro de perspectivas no universo. Se eles fizessem ciência, certamente seria muito diferente da nossa, que de tão inquestionável nos direciona a Deus, ao absoluto, a algo que não podemos refutar, só temos de obedecer. Os índios não acreditam na idéia de crer, são indiferentes a ela, por isso nos parecem tão pouco confiáveis (risos).

No sermão do Espírito Santo, padre Antonio Vieira diz que seria mais fácil evangelizar um chinês ou um indiano do que o selvagem brasileiro. Os primeiros seriam como estátuas de mármore, que dão trabalho para fazer, mas a forma não muda. O índio brasileiro, em compensação, seria como a estátua de murta. Quando você pensa que ela está pronta, lá vem um galho novo revirando a forma.”


Greenhalgh está um-pote-até-aqui-de-mágoas

Muito ruim, lastimável a entrevista do advogado Luiz Eduardo Greenhalgh publicada hoje no jornal Valor.

Greenhalgh foi advogado do MST por muitos anos, e deputado federal pelo PT de São Paulo, apoiado pelo MST. Foi candidato à presidência da Câmara dos Deputados para o biênio 2005/06, tendo sido derrotado pelo famigerado deputado Severino Cavalvanti, por pura inabilidade e cupidez.

Hoje, ainda ressentido, Greenhalgh atribui a sua derrota para Severino ao MST, e não ao PT, que lançou burramente dois candidatos na época. Em 2006, sem os votos do MST, ele não conseguiu sequer se reeleger deputado federal por São Paulo. O movimento, de fato, considerou o advogado muito chapa-branca, por ter feito uma opção política acriteriosa e submissa em favor de todas as medidas (e omissões) do governo Lula.

Agora, está como um-pote-até-aqui-de-mágoas falando e se queixando tardiamente do MST e do mundo ingrato, dizendo:

- Tenho muito medo que o MST vire um partido político. Eu defendo a reforma agrária, que se avance nesse projeto, mas não defendo o desbordar do limite, a descaracterização do movimento.

Greenhalgh certamente quer que o movimento social fique sentado placidamente nas ante-salas dos ministérios e dos Incras da vida esperando a burocracia do Estado formalizar o direito inalienável dos cidadãos e cidadãs à propriedade. Para ele, as mobilizações na luta pela terra e pelos direitos de cidadania são “desbordes do limite” e “descaracterização do movimento”.

Coisas da vida.



Antropólogo contesta general alarmista

Eduardo Viveiros de Castro, professor do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é considerado "o" antropólogo da atualidade. Dele diz Claude Lévi-Strauss, seu colega e mentor, seguramente um dos maiores pensadores do século 20: "Viveiros de Castro é o fundador de uma nova escola na antropologia. Com ele me sinto em completa harmonia intelectual". Quem há de questionar o mestre francês que, nos anos 50, sacudiu os pilares das Ciências Sociais com a publicação de Tristes Trópicos, relato de experiências com os índios brasileiros nos anos 30?

Pois muitos questionam Viveiros de Castro. E muitos o criticarão por esta entrevista ao caderno Aliás [suplemento da edição dominical do Estadão]. Numa semana em que os conflitos entre índios e rizicultores (informalmente tratados de "arrozeiros"), lá na distante reserva Raposa Serra do Sol (Roraima), ganharam estridência e manchetes de jornais, o professor sai em defesa dos macuxis, wapixanas e outros grupos indígenas que habitam uma faixa de terra contínua de 1,7 milhão de hectares, palco de discórdias que sintetizam 500 anos de Brasil. A estridência ficou por conta de uma palestra do general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, feita no Clube Militar do Rio de Janeiro. O general foi contundente: disse que a política indigenista é lamentável e caótica, ganhando imediata adesão de seus pares. Augusto Heleno, que chefiou a missão brasileira no Haiti, também bateu pesado ao reagir contra a decisão da Justiça que determina a saída dos não-índios da reserva: "Como um brasileiro está impedido de entrar numa terra porque ela é indígena? Isso não entra na minha cabeça."

Também não entra na cabeça de Viveiros de Castro que os indígenas possam ser vistos como ameaça à soberania nacional. Ao contrário, entende que eles contribuem com a soberania. Atribui tanta polêmica ao alto grau de desinformação em torno das reservas existentes no País e, em particular, da Raposa Serra do Sol. "As terras não são dos índios, mas da União. Eles têm o usufruto, o que é bem diferente. Já os arrozeiros querem a propriedade." O entrevistado contesta números, analisa o modelo de colonização da Amazônia e tenta desfazer discursos que, na sua opinião, são alarmistas. Mas é condescendente com o general: "Ele está sendo usado neste conflito. É claro que o Exército tem de atuar lá, defendendo nossas fronteiras. Mas o que está em jogo são os interesses em torno de uma questão fundiária".

Ex-professor da École de Hautes Études en Sciences Sociales, de Paris, da Universidade de Chicago e da Universidade de Cambridge, Viveiros de Castro é autor de vários livros, entre eles, “Arawete, os Deuses Canibais” (Zahar), que resulta de pesquisa de campo com índios do Pará, e “A Inconstância da Alma Selvagem” (Cosac & Naify), uma coletânea de ensaios que revela sua principal contribuição para a antropologia. Trata-se do "perspectivismo amazônico", a proposição teórica que guia todas as suas formulações.

Leia a entrevista na íntegra aqui.



E Jobim?

Onde anda o ministro Nelson Jobim, com a sua fantasia de militar na selva e poses circenses?

Até o presente momento ele não cumpriu com o seu dever ministerial e a expressa determinação do presidente Lula de pôr cobro à hostilidade havida no Clube Militar do Rio de Janeiro contra as corretas políticas governamentais de demarcação de terras indígenas na área de Raposa/Serra do Sol.

Hoje, faz uma semana que o general da ativa, Augusto Heleno, vestindo simbolicamente uniforme de campanha, pronunciou-se de forma irreverente contra determinações do governo a que serve constitucionalmente e ao qual deveria obedecer de maneira leal e disciplinada.

Nelson Jobim, ministro da Defesa, exonerou-se de suas obrigações e renunciou à sua autoridade na área militar? Onde anda o homem, ao menos? - já que o ministro virou pó de traque.


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