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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?

quinta-feira, 29 de março de 2012

Encontro 'Memória, Verdade e Justiça'



5° ENCONTRO LATINOAMERICANO MEMÓRIA, VERDADE E JUSTIÇA
5° ENCUENTRO LATINOAMERICANO MEMORIA, VERDAD Y JUSTICIA
CUMPRIR COM A VERDADE/CUMPLIR CON LA VERDAD
Local: Plenarinho – Assembléia Legislativa – Porto Alegre/RS
 30, 31 de março e 01 de abril 

PROGRAMA:
Sexta-feira / Viernes – 30/03/2012
09,00 hs – Credenciamento/ Acreditaciones
10,00 hs – Ato de Abertura / Acto de Apertura
12,00 hs – Tribo de atuadores Oi Nóis Aqui Traveiz
Apresenta: "Onde? Ação nº 2"
Esplanada da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul
12,30 hs – Almoço / Almuerzo
14,00 hs – Mesa 1
Conteúdo e Conseqüências das Sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos / Contenido y Consequencias del Fallo de la Corte Interamericana de Derechos Humanos. Brasil: Caso Araguaia / Uruguai: Caso Gelman.
Mediador / Moderador: Luiz Francisco Corrêa Barbosa (MJDH)
Painelistas / Panelistas: Beatriz Affonso (Cejil Brasil), Pilar Elizalde (Cejil Cone Sul /Cono Sur), Victória Grabois Olímpio (Grupo Tortura Nunca Mais RJ/Brasil) e Macarena Gelman (vítima Argentina/Uruguay), Carlos Etchegoyhen (psicanalista – Uruguay)

16,00 hs – Intervalo para café – Corte para café

16,30 hs – Mesa 2
A obrigação de adequar a legislação interna às normas da Convenção Americana sobre Direitos Humanos / La obligación de adecuar el derecho interno a las normas de la Convención Americana sobre Derechos Humanos.
Mediador / Moderador: Ricardo Breier (OAB/RS / Colegio Abogados)
Painelistas / Panelistas: Miki Breier (Deputado Estadual/RS - Brasil), Remo Carlotto (Deputado Nacional, Pres. Com. Derechos Humanos Y Garantias – Câmara Deputados - Argentina), Hugo Gutierrez (Deputado de La República – Chile), Chico Alencar (Deputado Federal – Comissão de Direitos Humanos e Minorias– Brasil) e Luis Alfredo Ilarregui (Ministério do Interior – Argentina)

Sábado - 31/03/2012
10,00 hs – Mesa 3
Imprescritibilidade dos crimes de Lesa Humanidade / Imprecritibilidad de los crimenes de Lesa Humanidad.
Mediador / Moderador: Christopher Goulart (MJDH)
Painelistas / Panelistas: Dr. Miguel Angel Osorio (Procurador / Fiscal Federal Argentina – causa Operação Condor), Drª Ana Maria Telechea Reck (Procuradora/Fiscal Nacional en lo Penal – Uruguay – causa Bordaberry), Dr. Ivan Cláudio Marx (Procurador/Fiscal Federal Brasil Coordenador do Grupo de Trabalho Justiça de Transição), Prof. Dr. Dani Rudnicki (MJDH – Brasil.

12,00 hs – Almoço / Almuerzo

14,00 hs – Mesa 4
Comissão da Verdade / Comisión de la Verdad
Mediador / Moderador: Afonso Licks (MJDH)
Painelistas / Panelistas: Alexandre Veiga (Arquivistas Sem Fronteira), Maurice Politi (Núcleo de Preservação da Memória Política/SP – Brasil), Luiza Erundina (Deputada Federal – Comissão de Direitos Humanos e Minorias – Brasil) , Vera Vital Brasil (Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça), Katia Nouten (Federação Internacional de Direitos Humanos – Bélgica).

16,00 hs - Intervalo para café – Corte para café

16,30 hs – Mesa 5
Para que não se repita / Para que no se repita
Nosso compromisso com a Memória, Verdade e Justiça / Nuestro compromiso con la Memoria, Verdad y Justicia.
Mediador / Moderador: Jair Krischke (MJDH)
Painelistas / Panelistas: Roger Rodriguez (Uruguay), Olga Flores (Coord. Interinstitucional Contra
la Impunidad - Bolívia), Dr. Paulo Abrão Pires Junior (Pres. da Comissão de Anistia – Min. da Justiça -Brasil), Baldemar Toroco (Crysol – Asociación de ex Presos Políticos de Uruguay), Adela Segarra (Deputada Nacional – Argentina).

18,00 hs – Deliberação sobre o documento “Compromisso de Porto Alegre, Brasil”.

Domingo – 1° de abril de 2012
09,30 hs – Visita à Ilha do Presídio (Porto Alegre) e homenagem aos que lá estiveram presos/Visita a Isla Penal y homenaje a los que aí estuvueran presos.

12,00 hs – Encerramento com almoço/Cierre con almuerzo.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Petrobras promove tolices privadas


Vejam só, a Petrobras promove/patrocina festas privadas e descarrega na rubrica de Responsabilidade Social e Ambiental. O convite acima se refere a uma festa de aniversário de um ator e diretor da TV Globo, chamado Jorge Fernando, certamente alguém que nutre uma folha de serviços prestados às comunidades desassistidas do Rio de Janeiro, alguém com irretocável vocação voltada para a benemerência, à assistência social (e ambiental), e ao serviço anônimo e caritativo para a população carente do estado do Rio de Janeiro. Quase uma Madre de Calcutá do pedaço.

terça-feira, 27 de março de 2012

Arapongas dos EUA têm regalias com milicos brasucas



Atual diretora de análise da Stratfor (leia sobre a Stratfor aqui), a americana Reva Bhalla não precisou gastar um tostão, grampear telefones ou pagar propinas para conseguir fácil acesso ao alto escalão da inteligência brasileira. A informação foi pescada no ótimo portal da Pública.

Em 6 de janeiro de 2011, segundo documentos internos da empresa analisados pela Agência Pública e pela Carta Capital, Bhalla foi recebida com entusiasmo pelo gabinete do ministro-chefe do GSI, o general José Elito Siqueira, menos de um mês depois de chegar ao País para sua missão em nome da Stratfor.Mais do que ser bem recebida, Bhalla obteve informações confidenciais de funcionários do GSI que são negadas até mesmo aos brasileiros.

No seu relato, ela diz ter sido levada à chamada “sala de situação”, local onde militares e agentes de inteligência se reunem com a presidência em caso de crises de segurança nacional. “Eu tive a impressão de que o Brasil não tem que lidar com esse tipo de questão com muita freqüência. Eles disseram que durante o governo Lula eles se reuniram 64 vezes. Havia mapas muito legais por todo o lugar. Eles me deram de presente um lindo mapa do mundo com Brasília ao centro (muito ambicioso? Ahaha)”, escreve.

O contato, segundo ela, teria sido armado por um “amigo diplomata” que estaria trabalhando no escritório da própria presidenta, diz ela, sem identificar o nome. “Todos, inclusive o General Elito Sequeiro (sic) - o chefe do GSI, o qual eu encontrei mais tarde no seu escritório, conhecem e lêem os relatórios da Stratfor regularmente. Eles estavam, literalmente, me dizendo sobre as notícias da Stratfor que haviam lido nesta manhã, e que quase todos ali eram membros”.

Animada com o “tour completo” que recebeu do palácio presidencial, Bhalla chegou à sala da presidenta Dilma Rousseff – mas ela estava numa reunião. “Eu queria dizer ‘olá’ em nome da Stratfor”.

A analista relata ter conversado longamente com o secretario-adjunto José Antônio Macedo Soares, cujo nome chegou a ser cotado pelo Palácio do Planalto para assumir a direção da Abin. Segundo seu relato, ele lhe explicou tranquilamente que o Brasil se esforça para não atrair atenção para si mesmo como palco de ações ligadas ao terrorismo. “Como Macedo Soares me disse, nós capturamos vários ‘terroristas’ em São Paulo – pessoas da Al Qaeda, Hezbollah, e até pessoas ligadas aos ataques de 11 de setembro. Mas nós não queremos nos vangloriar por isso e  não queremos atenção. Isso não serve aos nossos interesses e não queremos que os EUA nos empurre para esse assunto’”, escreve.

A informação, prontamente repassada para a rede de analistas da Stratfor, confirma uma revelação feita pelo WikiLeaks em 2010, nos primeiros documentos diplomáticos sobre o Brasil publicados pela organização. Os despachos traziam o então embaixador dos Estados Unidos em Brasília, Clifford Sobel, a dizer, ainda em 2008, que a Polícia Federal “frequentemente prende pessoas ligadas ao terrorismo, mas os acusa de uma variedade de crimes não relacionados a terrorismo para evitar chamar a atenção da imprensa e dos altos escalões do governo”. O mesmo telegrama de Sobel cita dois exemplos. Em 2007, a PF teria capturado um potencial facilitador terrorista sunita que operava primordialmente em Santa Catarina sob acusação de entrar no País sem declarar fundos – e estaria trabalhando pela sua deportação. A operação Byblos, que desmantelou uma quadrilha de falsifcação de documentos brasileiros no Rio de Janeiro para os libaneses também é citada como exemplo de operação de contra-terrorismo.


Histórias sobre prisões de suspeitos de terrorismo no Brasil haviam pipocado antes do vazamento dos documentos diplomáticos. Em maio de 2009, a PF prendeu um libanês acusado de propagar pela internet material racista. À época, o colunista da Folha Jânio de Freitas escreveu que, para preservar o sigilo, a PF atribuiu a prisão, inclusive internamente, a uma investigação sobre células de neonazistas, enquanto o libanês seria na verdade suspeito de ligação com a Al Qaeda. Quase um mês depois, o Gabinete da Segurança Institucional da Presidência criou um grupo de prevenção e combate ao terrorismo, com a finalidade oficial de exercer o “acompanhamento de assuntos pertinentes ao terrorismo internacional e de ações” para “a sua prevenção e neutralização”.
Foi exatamente no GSI e com funcionários do órgão que Bhalla teve reuniões pessoais que renderam relatórios de inteligência privada, para alimentar os boletins a clientes no mundo todo.
Naquele encontro, ela teria perguntado ainda sobre a capacidade do GSI em vigiar e capturar esses ‘terroristas’. “A resposta não me pareceu tão confiante assim. Ele disse basicamente que isso é muito difícil. São Paulo tem uma população estrangeira muito grande. Fronteiras são difíceis de controlar: essa é a atitude brasileira em relação a isso”. Segundo a analista, eles teriam reonhecido que há alvos de terrorismo no Brasil. E teriam citado uma misteriosa “casa noturna israelense” em São Paulo como um exemplo.
Eu levantei a questão do terrorismo, já que Macedo Soares é basicamente o único brasileiro que foi citado pelo Wikileaks. Eu perguntei a ele se isso causou algum tipo de problema e ele riu e disse “só inveja”! Aparentemente, vários oficiais brasileiros ficaram seriamente com ciúmes de que ele tenha ficado com toda a fama, haha”, relata Bhalla no seu email. Macedo Soares foi interlocutor do ex-embaixador Sobel nos primeiros documentos diplomáticos vazados.
A conversa não parou por aí. Bhalla chegou a ser convidada a visitar um posto militar na Amazônia na sua próxima visita, “coisa que eu definitivamente vou fazer”. Ouviu do alto escalão do GSI que “a corrupção nesses postos é mais concentrada na polícia do que nos militares”.
Um deles levantou um ponto interessante, dizendo que uma coisa que o Brasil tem feito muito bem é controlar a qualidade dos precursores químicos que entram no país. Então, a cocaína produzida na Bolívia, por exemplo, não é ‘classe A’ que os compradores de NY querem. Ao invés disso, são de baixa qualidade, crack, que é vendido em São Paulo. Então essa é uma conseqüência não-intencional para eles: drogas mais baratas e de baixo valor permeiam o mercado brasileiro”, descreveu.
No fim da mensagem, a analista diz ter desgostado da capital federal, no mesmo tom informal que marca os demais emails da Stratfor publicados pelo WikiLeaks. E envia uma foto sua diante da catedral de Brasília.
A correspondência com Macedo Soares não terminou aí, como mostra a esfuziante mensagem sobre o mapa com o Brasil no centro, reenviado a Bhalla dois meses depois da visita.
A reportagem procurou o GSI através da sua assessoria de imprensa, mas recebeu como resposta que o ministro José Antônio de Macedo Soares está de férias no exterior e se disponibilizaria a esclarecer o assunto depois do dia 30 de março. A assessoria confirmou, no entanto, que o ministro-chefe José Elito Siqueira “recebeu, em 06 Jan 11, a Sra. Reva Bhalla para cumprimento protocolar durante a sua visita ao GSI”.

Oficialmente, o governo sempre negou a existência de atividades terroristas no Brasil – e continua negando, mesmo depois das revelações do Wikileaks. Já os militares brasileiros parecem ficar bem mais à vontade quando falam do assunto com americanos – sejam eles diplomatas, militares, ou arapongas como os da Stratfor.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Há um crucifixo no meio do caminho da nossa república





Territórios livres


Imagine que você é o Galileu e está sendo processado pela Santa Inquisição por defender a ideia herética de que é a Terra que gira em torno do Sol e não o contrário. Ao mesmo tempo, você está tendo problemas de família, filhos ilegítimos que infernizam a sua vida, e dívidas, que acabam levando você a outro tribunal, ao qual você comparece até com uma certa alegria. No tribunal civil, será você contra credores ou filhos ingratos, não você contra a Igreja e seus dogmas pétreos. Você receberá uma multa ou uma reprimenda, ou talvez, com um bom advogado, até consiga derrotar seus acusadores, o que é impensável quando quem acusa é a Igreja. Se tiver que ser preso, será por pouco tempo, e a ameaça de ir para a fogueira nem será cogitada. No tribunal laico, pelo menos por um tempo, você estará livre do poder da Igreja. É com esta sensação de alívio, de estar num espaço neutro onde sua defesa será ouvida e talvez até prevaleça, que você entra no tribunal. E então você vê um enorme crucifixo na parede atrás do juiz. Não adianta, suspiraria você, desanimado, se fosse Galileu. 


O poder dela está por toda a parte. Por onde você andar, estará no território da Igreja. Por onde seu pensamento andar, estará sob escrutínio da Igreja. Não há espaços neutros.Um crucifixo na parede não é um objeto de decoração, é uma declaração. Na parede de espaços públicos de um país em que a separação de Igreja e Estado está explícita na Constituição, é uma desobediência, mitigada pelo hábito. Na parede dos espaços jurídicos deste país, onde a neutralidade, mesmo que não exista, deve ao menos ser presumida, é um contrassenso – como seria qualquer outro símbolo religioso pendurado.

É inimaginável que um Galileu moderno se sinta acuado pela simples visão do símbolo cristão na parede atrás do juiz, mesmo porque a Igreja demorou mas aceitou a teoria heliocêntrica de Copérnico e ninguém mais é queimado por heresia. Mas a questão não é esta, a questão é o nosso hipotético e escaldado Galileu poder encontrar, de preferência no Poder Judiciário, um território livre de qualquer religião, ou lembrança de religião.Fala-se que a discussão sobre crucifixos em lugares públicos ameaça a liberdade de religião. É o contrário, o que no fundo se discute é como ser religioso sem impor sua religião aos outros, ou como preservar a liberdade de quem não acredita na prepotência religiosa. Com o crescimento político das igrejas neopentecostais, esta preocupação com a capacidade de discordar de valores atrasados impostos pelos religiosos a toda a sociedade, como nas questões do aborto e dos preservativos, tornou-se primordial. A retirada dos crucifixos das paredes também é uma declaração. No caso, de liberdade.


Artigo de Luis Fernando Veríssimo, publicado hoje no jornal O Globo.



Fotografias de cima a baixo: 1) gabinete do presidente da República, no tempo de Lula; 2) plenário da Câmara dos Deputados; 3) Presidenta Dilma, vice Temer, e presidente do Senado, José Sarney, no plenário da Câmara; 4) Plenário do STF, órgão máximo do Poder Judiciário, em Brasília. 

quarta-feira, 21 de março de 2012

Jorge Gerdau constitui um grande erro político da presidenta Dilma




A manchete principal do jornal Folha de S. Paulo informa que a presidenta Dilma convocou 27 grandes empresários brasileiros com a finalidade de cobrar-lhes investimentos, face ao desempenho pífio do PIB brasuca no ano passado. A iniciativa da presidenta cumpre uma tarefa política de dupla finalidade: mostrar dinamismo reativo do Planalto quanto à necessidade premente de acelerar o investimento produtivo - única maneira de gerar emprego e riqueza social - e, ao mesmo tempo, empanar a crise institucional provocada pelas (eternas) insatisfações da base aliada - leia-se PMDB.

Muito bem, muito correto, não fora o nome escolhido pela presidenta para coordenar a reunião com os campeões do PIB brasileiro: Jorge Gerdau. O empresário do setor siderúrgico assessora a presidenta na área de gestão e competitividade e, segundo o diário da família Frias, "ajudou a elaborar a lista" que irá se entrevistar com Dilma. Gerdau ocupa um cargo não-remunerado no Planalto e se refestela em uma sala próxima ao gabinete presidencial no recinto mesmo do Poder Executivo nacional.

A decisão de guindar Jorge Gerdau à condição em que se encontra no centro do poder planaltino é um equívoco grosseiro da presidenta Dilma. Um mega engano político, uma rombuda insensatez econômica e uma rotunda imprudência institucional.

Jorge Gerdau é um símbolo das estrepolias privatistas do tucanato no País, adquiriu a preço de cachaça ruim, em 1992, a antiga Aços Finos Piratini, fundada pelo então governador Brizola, em Charqueados, no Rio Grande do Sul. Gerdau assumiu a direção da aciaria e de plano demitiu cerca de 60% dos 3 mil trabalhadores da siderúrgica sulina. Hoje, o Rio Grande importa aço plano e para construção mecânica (que serve para indústria automotiva, ônibus, máquinas e equipamentos agrícolas, indústria naval e indústrias de energia eólica e outras).

Um dos grandes gargalos do desenvolvimento produtivo no RS - hoje - é a falta de aço, e o "planaltino" Jorge Gerdau se recusa a investir no seu estado de origem, onde fez a sua acumulação primitiva e de onde se projetou como boss do aço em inúmeros países de três continentes. Gerdau prefere investir no Canadá. A presidenta Dilma talvez não saiba disso, mas se sabe, agrava o seu espetacular erro político em convidá-lo para tão importantes missões do governo brasileiro.

Voltaremos ao assunto.

segunda-feira, 12 de março de 2012

“Os Descendentes” e a alienação da vida cotidiana



De chegada quero dizer que “Os Descendentes” é um grande filme. O roteiro e a direção estão a cargo de Alexander Payne, que dá um tratamento leve – mas comprometido – a temas complexos da vida cotidiana. O personagem que o tempo inteiro está em cena é Matt King, herdeiro de um baronato de terras no valioso Havaí, onde nasceu o presidente estadunidense Barack Obama. Informe-se que o arquipélago foi descoberto pelos portugueses, mas os EUA, depois de invadirem militarmente as ilhas no finalzinho do século 19, anexaram ao seu território. Hoje, é um dos tantos estados dos EUA.

King, vivido pelo correto George Clooney, é um advogado rico, que não amadureceu, tem duas filhas muito jovens, e a mulher vive seus últimos dias em coma profundo, depois de um grave acidente de lancha, possivelmente durante uma bebedeira tão juvenil quanto irresponsável.

Todos os que aparecem na tela de “Os Descendentes” são indivíduos imaturos e despreparados para a vida adulta. Mesmo o veterano pai da comatosa mulher de Matt King, apesar de avançado nos anos, dá um soco no olho de um menino, por este ter dito um disparate imbecil acerca de sua mulher portadora do mal de Alzheimer. Repito: todos são juvenis, homens e mulheres improvisados para a vida adulta.

Vejam os muitos primos do protagonista vivido por George Clooney: herdeiros de uma riqueza ancestral, baseado na posse de uma terra usurpada aos nativos, aparentemente não trabalham, flanam por aí com copos na mão, camisas havaianas (sim, no Havaí, se usam camisas havaianas!) esperando ficarem mais ricos do que já são. A cena – quase no final – na qual os primos se reúnem para decidir sobre a venda de suas terras, deliberação essa que cabe ao advogado da família, Matt King, é risível e urdida com leveza pelo diretor Alexander Payne, com simplicidade e objetividade, mostrando-os em grupo, nunca individualmente, como uma pequena manada, todos em traje informalíssimo (alguns com camisas havaianas), aguardando bovinamente o momento em que poriam a mão em mais bufunfa, talvez nem mesmo sabendo o quê fazer com aqueles excessivos dólares.

Quando Matt King/George Clooney recebe a notícia do médico sobre o estado clínico terminal de sua mulher, parece que ele acorda de um longo sono letárgico, na direção oposta da mulher, portanto. Essa condição é confirmada quando sua filha de 17 anos lhe informa que a mãe/esposa estava tendo um caso afetivo com um corretor de imóveis. King ao ser informado da aventura da mulher corre desabalado pelas ruas do bairro residencial onde mora, uma cena entre o hilário e o tenso, porque o diretor é um craque e consegue fundir elementos aparentemente conflitivos num mesmo trecho narrativo e faz disso enlevo, arte e fruição, dotando a cena de grande densidade e força dramática.

Nestas pequenas soluções de roteiro é que o cara mostra o talento, seja de diretor, seja de roteirista mesmo. Outra cena que impacta, agora pela beleza plástica e poética, é quando Alex, a filha mais velha de King, recebe a notícia da irreversibilidade do estado da mãe e, na piscina, submerge chorando, o que parece agravar tanto o sufoco que sente quanto a depressão do momento. Cinema, como dizia Hitchcock, é mais imagem que palavra. As palavras são acessórios de uma linguagem narrativa fundada sobretudo na imagem e no impacto visual.

Quando se confirma que a mulher de King não tem volta, que basta desligar os aparelhos para que ela finalmente morra, todos os personagens crescem em cena, o pai, as duas filhas, e até o namoradinho de Alex, a fiha de 17 anos. O rapaz é a imbecilidade andante, uma versão engordurada de Beavis e Butthead, e no entanto, subitamente passa a ingressar na fileira dos adultos.

Esse, a meu ver, é o traço essencial do filme de Alexander Payne. A expressão descendente, em latim, significa o "que desce". Todos descem e chapinham na depressão e na mediocridade cotidiana, até que Payne coloque a inflexão catártica determinada pelo coma da mulher do protagonista principal. A partir daí ocorre o ascenso, a subida, a progressão existencial no rumo da autoconsciência, da lucidez e da desalienação da vida cotidiana. Matt King já não quer mais vender a terra ancestral, em que pese a pressão dos primos. Ele não quer mais se comportar como um ser mecânico que cumpre de forma alienada com um roteiro secreto onde não há reflexão, onde não há espaço para a dúvida e por conseguinte para a liberdade. King já não está mais disposto a fazer o que o sogro espera dele, o que os primos esperam dele, ou o que a sociedade espera dele. 

Ele que fora "um homem devorado por seus papéis", como diz a socióloga Agnes Heller, dá uma cambalhota moral-existencial e começa a entender o que está a sua volta. A consciência de King agora quer fazer a "condução da vida" para buscar a auto-realização através da autofruição da personalidade. O personagem de Clooney quer elevar-se acima de si mesmo, onde o cume disso é representado pela catarse (purgação) da conjugação de fatos cotidianos inexoráveis e esmagadores para qualquer indivíduo.

Há um provérbio dos índios Guaranis, habitantes autóctones do Brasil meridional que diz o seguinte: Quando se corre muito, há que parar e esperar pela alma”. King/Clooney "corre" muito no filme "Os Descendentes", então pára para refletir e esperar a sua alma. Ele precisa reencontrar a sua humanidade perdida, recompor os cacos do seu ser genérico, remontar a sua integridade moral e reconstituir-se como homem completo. Goethe dizia que todo homem pode ser completo, inclusive na sua cotidianidade.

A belíssima cena de despedida de Matt King da mulher vegetativa no leito de morte é um ponto alto do cinema contemporâneo: ele já está mudado, sem rancor, elevado, terno, adulto, comovido (sem pieguice) e ao mesmo tempo realista e íntegro - desalienado, enfim. 

sexta-feira, 2 de março de 2012

Serra, Cerra, Çerra, Çerrote



Este programa foi ao ar na noite de 01 de março de 2012. Serra, como se pode notar, está cada vez mais Cerra, quase passando a Çerra. O eterno candidato a tudo representa a quintessência da direita brasileira: arrogante, estreito e exageradamente ambicioso (na razão inversa da sua capacidade intelectual e cognitiva).

quinta-feira, 1 de março de 2012

O passado não conhece o seu lugar, está sempre presente



Responsabilização
O Christopher Hitchens disse certa vez que se fizera uma promessa: não leria mais nada escrito pelo Henry Kissinger até que fossem publicadas suas cartas da prisão. O Hitchens já morreu, o Kissinger continua escrevendo (seu último livro é sobre a China) e são poucas as probabilidades de que venha a ser julgado, o que dirá preso, pelo que aprontou – no Chile e no Vietnã, por exemplo. Sua posteridade como estrategista geopolítico e conselheiro de presidentes está assegurada, ele morrerá sem ser responsabilizado por nada e não serão seus inimigos que escreverão seu epitáfio.

O juiz espanhol Garzón, aquele que mandou prender o Pinochet, estava mexendo com o passado franquista da Espanha, também atrás de responsabilização, e bateu de frente com a reação. Recorreram a um tecnicismo de legalidade duvidosa para barrá-lo. Lá também se invoca uma Lei da Anistia para impedir uma investigação dos crimes da ditadura. Anistia não anula responsabilização. A partir do tribunal de Nuremberg que julgou a cúpula nazista no fim da II Guerra Mundial, passando pelos julgamentos de tiranos em cortes internacionais desde então, o objetivo buscado é a responsabilização, que não tem nada a ver com retribuição, vingança ou mesmo justiça. Até hoje discute-se a legalidade formal, de um ponto de vista estritamente jurídico, dos processos em Nuremberg, mas era impensável, diante da enormidade do que tinha acontecido, e sob o impacto das primeiras imagens dos corpos empilhados nos campos de concentração nazistas recém liberados, que eles não se realizassem. Alguma forma de responsabilização era uma necessidade histórica. Com alguma grandiloquência se poderia dizer que a consciência humana a exigia.

A tal Comissão da Verdade que se pretende no Brasil responderia à mesma exigência histórica, além da necessidade de completar a história individual de tantos cujo destino ainda é desconhecido. A julgar pela rapidez com que, aos primeiros protestos de evangélicos e bispos católicos, o Gilberto Carvalho correu para lhes dizer que a posição do governo em relação ao aborto continuaria retrógrada como a deles, pode-se duvidar da disposição do governo para enfrentar a reação que virá, como na Espanha do Garzón, ao exame do nosso passado e à responsabilização dos seus desmandos. Vamos torcer para que, neste caso, a espinha do governo seja mais firme.

Pois, sem responsabilização, as histórias ficam sem fim, soltas no espaço como fiapos elétricos, e o passado nunca vai embora.
Artigo de Luis Fernando Veríssimo, publicado hoje no jornal O Globo.

"O passado não conhece o seu lugar, está sempre presente" - é uma das frases definitivas de Mário Quintana, o maior poeta menor do Rio Grande do Sul.  


Presidenta Dilma determina punição a treze generais de pijama



O fato é inédito. A presidente Dilma Rousseff decidiu aplicar uma "repreensão" aos 98 militares da reserva que assinaram um novo manifesto reafirmando as críticas feitas a ela por não ter censurado suas ministras que pediram a revogação da Lei de Anistia.

No meio da tarde de ontem 
Dilma determinou ao ministro da Defesa, Celso Amorim, que os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica aplicassem a repreensão a todos os signatários do novo manifesto (o primeiro havia partido do Clube Militar), "nos limites do regulamento disciplinar". O texto diz também que não reconhece a autoridade do ministro Celso Amorim.

Conforme a lei 7.524, de 17 de julho de 1986, assinada pelo ex-presidente 
José Sarney, os militares da reserva podem se manifestar politicamente e não estão sujeitos a reprimendas.

O general de Exército da reserva, 
Gilberto Barbosa de Figueiredo, ex-comandante Militar da Amazônia e ex-presidente do Clube Militar, o único quatro estrelas a assinar a nota, até o início da noite de ontem não tinha sido comunicado da repreensão. Ele disse ao Estado que, se receber a repreensão vai consultar seu advogado para possivelmente recorrer da punição, que considera "inaceitável". "Se eles não dessem pelota pro fato, ele já tinha se encerrado. Mas não vou aceitar ser cerceado do meu direito de expressar minha opinião", afirmou.

presidente Dilma, ao tomar conhecimento que novo manifesto estava sendo publicado, desta vez com a assinatura de 98 militares, sendo 13 generais, determinou a Amorim que checasse qual a importância e influência de cada um dos assinaram a nota. Assim que recebeu a informação, avisou a Amorim que mandasse os comandantes repreender quem subscrevera o documento.

No meio da tarde, 
Amorim convocou os três comandantes do Exército, Enzo Peri, da Marinha, Moura Neto, e da Aeronáutica, Juniti Saito, determinando que aplicassem punição aos 98 signatários do documento, a fim de "cortar o mal pela raiz".

No novo "alerta à Nação", informado pela Folha de S.Paulo, intitulado 
Eles que venham, por aqui não passarão, os militares avisam que o Clube Militar "é uma associação civil, não subordinada a quem quer que seja, a não ser à sua diretoria". A informação é do Estadão de hoje.


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