Artigo [o chamado tijolão] de Leonel Brizola publicado nos jornais Folha de S. Paulo, O Globo, Extra, Zero Hora e Correio Braziliense, em 09 de outubro de 2003.
A insólita revelação do sr. Nelson Jobim de que, na promulgação da Constituição de 1988, participou de uma fraude para introduzir no texto constitucional artigos que não foram votados pelos constituintes, deixa o hoje ministro do Supremo em posição ética e jurídica delicada, para não dizer insustentável, como integrante da mais alta corte constitucional deste país.
Como pode alguém que deliberada e conscientemente violou, no nascedouro, a Carta Magna, ser agora aquele que vai julgar, no STF, as questões constitucionais?
O absurdo é maior ainda que Sua Excelência diz que não apenas um, mas dois artigos foram introduzidos na Constituição sem o voto daqueles que, legitimamente, tinham o poder de fazê-lo. E mais: numa atitude chocante, julga-se no direito de nem mesmo revelar qual foi o segundo enxerto que praticou, dizendo que só o fará em um livro que irá lançar! O que pretende o sr. Ministro? Vender mais livros? O país e os outros ministros do STF devem esperar o que mais há de falso na Constituição?
Francamente, em qualquer país sério, um ministro do STF envolvido em tal episódio estaria, a esta altura, apresentando sua renúncia e pedindo desculpas ao país e à consciência jurídica. Alguém tem dúvidas de que seria assim nos EUA, na Inglaterra ou na França? Mas aqui, o ministro Jobim ainda se julga no direito de pavonear-se, quase que afirmando que é graças à burla da qual participou que a Constituição aperfeiçoou-se.
Depois desta revelação chocante, o que pensar dos escrúpulos do ministro Jobim em relação à verdade, ao rigor jurídico? Como pode a consciência nacional aceitar tais procedimentos? Pior, como alguém pode se sentir seguro quando Sua Excelência foi, de forma ativa e exorbitante, o patrocinador da recente abolição dos sistemas de impressão, que poderiam impedir as possibilidades de fraude na urna eletrônica? o PDT, depois desta revelação, mais do que nunca sente-se no dever de impugnar a intervenção escandalosa do ministro num processo que culminou com a revogação da única garantia de que nossas eleições não possam vir a ser eletronicamente fraudadas.
Por muito menos, pela violação do sigilo do voto dos senadores, que é um nada perto da violação do próprio texto constitucional, vimos o processo de condenação pública que se abateu sobre seus responsáveis, que os levou até à renúncia. A violação cometida pelo sr. Jobim é de natureza muito mais grave, porque alterou o próprio texto da Constituição em vigor, a cujo cumprimento todos se obrigam. Ou a pretensão de Sua Excelência é tanta que se julga acima da ética e da lei, e que ter fraudado a Constituição deve ser algo impune, apenas porque o fraudador é ele próprio? Se as instituições políticas e jurídicas deste país aceitarem que isto fique sem conseqüências, então estarão estimuladas as práticas de todo tipo de fraudes, porque nenhuma poderá ser maior que a que se fez contra a Lei das Leis.
2 comentários:
Velho, bom e que falta faz hoje.
armando
Depois de um Jobim, um Gimar Mendes...
Que tristeza!
Pobre justiça.
Claudio Dode
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