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segunda-feira, 5 de maio de 2008


Roraima: os arrozeiros são invasores recentes, diz antropólogo

O professor do Departamento de Antropologia da Universidade Brasília (UnB), Stephen Baines desenvolve uma pesquisa sobre etnologia indígena e Estados nacionais, na qual analisa casos de Brasil, Canadá e Austrália - que enfrentam debates comuns, tais como a demarcação e a exploração das terras destinadas aos índios.

Os aborígines da Austrália têm território maior que o dos índios brasileiros; em 1999, o Canadá destinou a indígenas área contínua quase cem vezes maior que a da polêmica Raposa/Serra do Sol e isso não causou problemas; e em todas as terras indígenas abertas à mineração empresarial houve problemas ambientais e culturais. Baines acredita que qualquer decisão no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a homologação da Raposa atentará contra a Constituição e assegura: "Os rizicultores são os invasores."

Hoje, o Estadão publica esta entrevista com o antropólogo Baines:

Qual é o problema com a demarcação de terras em ilhas?

Em todos os exemplos que conheço, tem trazido problemas graves, com permanentes conflitos fundiários entre índios e fazendeiros. A demarcação em áreas contínuas dá uma garantia aos índios para desenvolverem suas terras da maneira que querem, sem pressões.

Afirma-se que os índios do Brasil já receberam terras demais.

Segundo números de 2005, 109.641.763 hectares - 12,7% do território brasileiro - são reconhecidos como terra indígena. Na Austrália, país pouco menor que o Brasil, segundo dados de 1997, cerca de 117 milhões de hectares - 15% do território - são terra indígena. Em 1999 o Canadá reconheceu o território de Nunavut, em que 85% dos quase 31 mil habitantes são nativos americanos. Nunavut tem 2.093.190 quilômetros quadrados.

Em hectares, Nunavut é quase cem vezes maior que a Raposa, de 1,7 milhão de hectares.

Correto. Trata-se de vasta área no nordeste do país.

O Congresso discute a exploração de recursos minerais em terras indígenas. Há um modelo estrangeiro para resolver isso?

Não. Em geral a exploração de minérios em terras indígenas resulta em destruição do ambiente e impactos negativos, como alcoolismo, doenças e prostituição. Em 2003, o Foro Permanente de Assuntos Indígenas do Canadá revelou que projetos desse tipo causaram destruição de ecossistemas. Na Austrália, constatou-se que atividades de mineração trazem mais prejuízos que vantagens para os povos impactados

.........

Ontem, no programa televisivo Globo News Painel, houve um debate sobre a política indigenista brasileira e a polêmica em torno da criação da reserva de Raposa/Serra do Sol, em Roraima.

Um dos convidados foi o deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Ele teve uma participação lamentável. Deu saltos mortais na retórica para dizer – ao fim e ao cabo – que é contra a demarcação das terras indígenas em Roraima. Afirmou que os arrozeiros e demais populações não-indígenas chegaram antes dos índios àquela região. Imaginem. Usou argumentos baseados em políticas adotadas pelo imperador Pedro 2º, e repetiu a tolice da direita em dizer que às Forças Armadas está vedada a entrada na reserva indígena. O que é uma grosseira mentira.

Resumo da opereta rebeliana: ele acompanha as posições reacionárias, anti-indigenistas, portanto racistas, e paranóicas do general linha-dura Augusto Heleno, recentemente manifestadas no Clube Militar do Rio de Janeiro.

Foto: menina índia de Raposa do Sol (RR).

18 comentários:

Anônimo disse...

Impressionante. Não admira que, em nível municipal, seu PCdoB namore o PPS, partido que governou Porto Alegre por um bom tempo, antes de Fogaça dele desembarcar.

Guga Türck disse...

Demarcar terras para indígenas?
Pra quê? Pra aumentar terreno dessa gente que passa bêbada e fazendo festa o dia inteiro, não trabalha e vive de cestas básicas da FUNAI e de ONGs?


Qualquer semelhança com a realidade argumentativa de alguns é mera coincidência(?)...

Agora, um problema é sério com o que ocorre em áreas indígenas, por exemplo, no RS.
Ali em Nonoai (maior reserva do estado), com os kaingangs, há um grande conflito interno porque grande parte das terras viraram plantações de soja executadas pelos próprios índios cooptados pelo white way of life.
Mas por que isso?
Porque praticamente não há mais área de mata nativa na reserva, fruto de décadas de exploração do latifúndio...
Quer dizer, não adianta tirar as terras e repassá-las sem um programa de reflorestamento das áreas, porque a aculturação torna-se mais fácil até pela necessidade - já que eles precisarão tomar atitudes para sobrevivência a partir do uso da terra. Lembrando sempre que índios não têm costumes de cultivo extensivos de grãos nem de criação de animais.
E aqui no RS isso tudo tem se tornado um dilema, de um lado aqueles que procuram se manter índio raiz e outros que precisam se virar virando agricultores ou, inclusive, migrando para os centros urbanos por falta de alternativas.

Anônimo disse...

Tudo bem, Guga, mas todos esses problemas acontecerão com terra ou sem terra. Então, o certo é assegurar a terra a eles, originais donos dela, mesmo quando ainda a expressão "dono" ainda não tinha a conotação patrimonialista (egoísta) que tem hoje. Antes, tudo era Natureza, certo?
O fato é que há uma dívida étnico-social dos brancos para com os autóctones. É preciso pagá-la, de qualquer forma. Quem está contra, está a favor de um segundo genocídio.
A propósito: porque só se fala de Holocausto judeu? Na América houve o Holocausto indígena, onde mais de 20 milhões de aborígenes foram exterminados física e culturalmente. Vamos falar também do HOLOCAUSTO INDÍGENA. Ou não falamos porque não existe lóbi indígena e a força do capital financeiro-sionista para sustentar o mito do Holocausto?

Callado

Guga Türck disse...

Claro, concordo com tudo que expuseste.

Jean Scharlau disse...

A indiazinha de biquini deve ser filha de um daqueles índios de camiseta calça jeans. Por favor, alguém diga lá pra eles que tinham que estar vestidos com penas e pele de onça. Já pensou se os pais da indiazinha quiserem que ela faça segundo grau e faculdade? Provavelmente terão que abandonar a reserva, afinal, índio autêntico e que se preza não tem que fazer 2º grau nem faculdade, não é mesmo? Tem que caçar onça no mato.

E esse Stephen Baines aí inclusive parece que é índio grosso lá da Bossoroca, diz que até parente do Olívio ele é - pode confiar em tudo que ele diz, gente sincera e honesta. Ele e o Mulholand, ex-reitor da UNB talvez brincassem juntos quando eram pequenos, mas isso faz muito tempo.

Se o exército teve que entrar na justiça para fazer uma construção numa reserva, isto não lhes diz nada?

Duas questões que me parecem fundamentais e que não estão sendo focadas:
1 - Lá na raposa, os índios conseguiram um nível de transição harmonioso entre sua cultura e a nossa. Há essa idéia de que devam voltar atrás. Não vai acontecer, a não ser que sejam isolados em redomas de vidro ou grades.

2 - O problema fundamental da demarcação não é a reserva ser contínua, mas ir até a fronteira. Isso é coisa de tolinhos, para dizer o mínimo, ou então de espertalhões que têm amigos que se chamam Baines, Mulholand, Sam...

Anônimo disse...

pô Feil, quando o Maia não vem manda os locos dele

jp

Guga Türck disse...

Jean, se tu quiseres te mando o documentário que produzi sobre a questão indígena. Aliás, aqui na Catarse tem dois! Um sobre Kaingans (Índios Urbanos) e outro sobre Guaranis (Kuaray do Sul). O primeiro fala bem disso, da aculturação, do sofrimento nas cidades, de como eles se encontram em um limbo cultural tendo que lutar por terra na Lomba do Pinheiro porque lá em Nonoai não se sentem mais índios. Paradoxal isso, não?
O índio ter que migrar pra cidade pra se sentir índio...

Tens o meu contato.

Jean Scharlau disse...

Não tens como dispor no blogo TV?

Acho que aí tem um erro crucial nosso (governo e instituições direcionadas ao índio, inclusive ONGs), que é pensar o índio só de duas maneiras, na verdade uma única ou sua exclusão: o bom selvagem de Rousseau. Ou isso ou o limbo. Pensar em mediar a transição do índio do paraíso selvagem para a interação saudável e 'sustentável' com os de fora do paraíso, nós, é sacrilégio, sujeito à fogueira e açoite intelectual.

Guga Türck disse...

Não acho isso, Jean.
O que escrevi é uma descrição do próprio sentimento deles.
O pensamento de "eles lá e nós aqui" é expressado pelos, digamos assim, brancos da cidade - e isso está nos depoimentos do documentário.
E quem diz que precisou ir para a cidade para se sentir índio foram eles mesmos! E isso é interessantíssimo.
No caso dos Kaingangs, houve uma certa capacitação, inclusive, de lideranças para lutarem pelos seus direitos em condição de igualdade lingüística e de direito. Há, ainda, uma tendência deles se utilizarem das cotas para indígenas na formação de algumas pessoas em Direito - chegamos a contatar uma das filhas de um cacique que advogava em favor dos Kaingangs em diversas questões. E isso não é considerado aculturação - nem por mim, nem por eles.
Podes apostar que há bem a ciência nos grupos que defendem os indígenas e nos próprios do que seria um processo de intersecção cultural e o que seria a depredação dos valores de um povo.
Por isso fica mais evidente o despreparo de um cara como o Rebelo comentando a questão. Frases vindas de sua bocarra soam maniqueístas dentro da lógica do Russeau, que mencionaste, mas se proferidas por quem está inserido nessa luta soa como argumentação.
Esse é um dos grandes problemas do Brasil: políticos profissionais - não sabem nada de nada, porque param de evoluir em outros ofícios, mas dão pitaco em tudo.

Ah! E sobre o blogo tv, vou fazer o upload dos docs, sim.

Anônimo disse...

Toda a balbúrdia em Roraima se deve a cretinice de meia dúzia de plantadores de arroz, brancos (não o arroz) e predadores.
Agora, para piorar, fica na mão do provinciano Gilmar Mendes. Demarcação já!

armando

Carlos Eduardo da Maia disse...

A patrulha ideológica, a STASI gaudéria, não deixa o Aldo Rebello Pc do B (que deve adorar o Hoxa) exprimir a opinião dele.... Francamente.

Anônimo disse...

"capital financeiro-sionista"

Callado, o nazista loquaz.

Anônimo disse...

Callado dixit "o mito do Holocausto"...

O Holocausto foi um mito?

Concordas com isso, Feil?

Jean Scharlau disse...

Perdão, Guga, no aí, não me referia ao que disseste, ou aos que estão contigo nesse trabalho, mas ao que se diz por aí, aqui, acolá. Ao contrário, o que disseste vem ao encontro do que penso, que o índio, assim como qualquer um de nós, não quer o isolamento, mas o respeito na interação, coisa que a 'sociedade branca' presunçosa e preconceituosa não admite - essa sociedade continua vendo o índio como uma espécie animal que corre risco de extinção. Não vê o índio como gente, como igual no direito e diferente apenas nas características étnico culturais. Acho perfeitamente compreensível que o índio sinta-se índio na cidade, pois aí sua identidade e seus valores , por comparação com o diferente, lhe saltam aos olhos. É assim também conosco, obviamente.

Já a questão de reserva em faixa de fronteira não é coisa que interesse apenas ou principalmente aos índios, mas a todos os brasileiros (e estrangeiros também). É interessante o relatório da comissão externa da Câmara sobre essa reserva, relatada em 2004 pelo deputado Lindberg Farias (PT) - o link está disponível lá no meu blog em post com a entrevista do Aldo. Há também depoimentos dos Generais-de-Exército comandante e ex-Comandante Militar da Amazônia aqui: http://www.cpdoc.fgv.br/projetos/militares-amazonia/htm/documentos.htm

Anônimo disse...

MITO (dicionário Houaiss):

Rubrica: antropologia.
relato simbólico, passado de geração em geração dentro de um grupo, que narra e explica a origem de determinado fenômeno, ser vivo, acidente geográfico, instituição, costume social etc.

Callado

Anônimo disse...

O holocausto não foi mito, torna-se mito pela sua utilização, triste e infelizmente.

Anônimo disse...

A linha que separa os "comunistas" do PC do B do pensamento da direita conservadora brasileira (desculpem a redundância) é muito tênue.

Anônimo disse...

Quando alguém quer sobreviver e manter sua cultura, e outro quer destruir toda a diversidade natural e cultural para acumular capital nem deveria haver discussão.

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