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segunda-feira, 10 de maio de 2010

O livro que relata as raízes do golpismo da nossa mídia


"Minha razão de viver", de Samuel Wainer, está sendo violentado

Recentemente eu reli o ótimo livro do jornalista Samuel Wainer, "Minha razão de viver". Há semanas que estava para recomendá-lo aos estudantes de Comunicação, para que conheçam um grande sujeito, um profissional exemplar e um jornalista autodidata que foi protagonista de acontecimentos cruciais da história brasuca. Resolvi fazê-lo no dia do lançamento do jornal web Sul21. Vejo que o S21 tem alguma semelhança com o jornalismo praticado pela Última Hora, já disse isso aqui, outro dia, guardadas as distâncias de tempo, veículo e tamanho do País.

Hoje, entretanto, quando comecei esse texto, fui levado por alguma intuição para uma pesquisa breve ao Google com o objetivo de verificar a quantas edições anda o livro de Wainer (a minha é a 15ª edição, 1993, editora Record). Resultado: "Minha razão de viver" está sendo vendido na primeira edição da Editora Planeta Brasil, segundo o portal da Livraria Cultura.

Vejam que há um corte epistemológico aí, como diriam os althusserianos, um gap. Para piorar, a sinopse que a Cultura estampa na página de oferta do livro de Wainer informa o seguinte:

"O relançamento de 'Minha razão de viver' traz um clássico enriquecido por requintes gráficos, documentos inéditos e imagens que virtualmente falam. As informações complementares invadem labirintos e porões do esquema de arrecadação de dinheiro destinado a financiar o contragolpe preventivo rascunhado entre meados de 1963 e abril de 1964 por partidários do presidente João Goulart. Wainer foi testemunha privilegiada e, com freqüência, protagonista dos preparativos para a ação abortada por inimigos mais ágeis."

Observem a expressão "contragolpe preventivo rascunhado [...] em abril de 1964". Quer dizer, a obra do combativo jornalista - leal a vida toda a Getúlio Vargas - Samuel Wainer está sendo vendida com o sinal trocado. Confesso que não li essa edição bastarda. Mas, é possível sentir o cheiro da traição à obra original do criador de Última Hora - o único jornal diário popular, de esquerda, que o Brasil já teve. UH que foi objeto de todo o ódio destilado pelo golpista em tempo integral, Carlos Lacerda. Quem usa a expressão "contragolpe" para designar o golpe civil-militar de 1964 são os próprios golpistas de abril de 1964. É um eufemismo. Eles não admitem que deram um golpe, deram, segundo eles próprios, um "contragolpe contra Jango". Mas estão devendo até hoje as provas que havia de fato um golpe em marcha a ser perpetrado pelos arremedos de partidos que eram o velho PTB e o então PCB. Tanto havia golpe de esquerda no Brasil em 1964, quanto havia armas de destruição em massa no Iraque de Sadam Hussein. Álibis para rasgar a Constituição, eufemismos para isentar golpistas da alcunha de "golpistas".

Fica, pois, o registro da violência que estão fazendo com a memória de Samuel Wainer, e sobretudo com um documento importante para entender parte da história do Brasil, para saber sobre a canalha que dirigia os grandes jornais brasileiros, como se formaram fortunas em nome da consigna "imprensa livre". Um documento inestimável para conhecer o entreguismo e a baixa estatura moral de sujeitos como Carlos Lacerda, Assis Chateaubriand, David Nasser e muitos outros, chamados por Wainer de "barões da imprensa brasileira".

Quem lê "Minha razão de viver" - além de se deliciar com a prosa fácil, bem escrita e fluida - vai entender melhor os motivos de o PIG ser o que é, hoje. Todos irão conhecer o verdadeiro significado do vocábulo "golpista" - uma tradição da imprensa oligárquica brasileira.

Mas, atenção: compre o livro em um sebo, edição antiga, da Record. A atual é suspeita e muito cara.

9 comentários:

Anônimo disse...

Você deve chamar a edição atual de "suspeita" porque na edição atual vem o capítulo em que ele conta como ele e todo o seu jornal eram subornados por empreiteiras e pelo governo Jango.

Esse capítulo ele deixou com sua filha, e pediu que ela liberasse apenas depois de muitos anos de sua morte. O livro é excelente para compreender as entranhas da imprensa, mas Weiner era um canalha notório, como ele mesmo reconhece no livro.

Anônimo disse...

É curioso observar como, nos últimos dias, cresceu o papo dos lulistas sobre "golpismo", diante da candidatura inconsistente de Dilma Rousseuf, que não decola nem com banda.

severo disse...

Lacerda está vivo, mora em Porto Alegre e comenta no teu blog, Feil.

Anônimo disse...

A filha com a qual ele teria deixado a "última parte de suas memórias" auto declarando-se um "canalha consumado", como diz Carlos Lacerda Jr, é a tal 'Pinky' Wainer, filha também do misto de articulista da FSP e múmia, Danuza Leão. Portanto, senhores, não há o que duvidar da fonte. É ínclita e fidedigna. É muito desprendimento do Samuel, defecar por conta própria na sua auto biografia!
Néia

Azarias disse...

Dá para perceber a infiltração dos "Trolls". Só quem não conheceu a Última Hora pode ter raciocínio reles sobre o Samuel. Citar a famigerada D.Leão e respectiva filha é não querer levar as coisas a sério.

Anônimo disse...

Olá Feil, depois de ler teu 'post', fui conferir via internet se tem o livro do Samuel Wainer(edição mais antiga) nos sebos, o unico que encontrei "tinha" na A Traça, não tem mais. Quanto ao novo, beeeeiiiiimmmm é uma edição do Augusto Nunes ( não é o cara que trabalhou na zérora?) e Pink Wainer (bleargh). Continuando, apareceu um link para o Jornal Já de um artigo do Kenny Braga sobre outro livro( mas que menciona este do Samuel Wainer), o livro em questão é Botando os pingos nos I's do Rivadavia de Souza que manifesta divergencia quanto ao que o Samuel Wainer afirmou no livro. Não os lí ainda nem os tenho ainda, só postei isso como uma informação. Talvez alguém possa complementar o que obtive via internet. Abraços Marcelo Rosa Job

Cristóvão Feil disse...

Prezado Job,

A edição a que te referes é da Editora Record, não do Augusto Nunes (ex-ZH). O Nunes, em 1993, era Coordenador Editorial da Record. Escreveu um brevíssimo "Epílogo" na obra de Wainer. A filha, Pink, escreve o prefácio. Mas nada disso importa, o livro é muito bom, mostra que o PIG é podre desde sempre, especialmente porque é contado por alguém que foi patrão em empresas de mídia. Tiveram sete "Última Hora" no Brasil, em sete cidades distintas. UH foi o único grande jornal, ou cadeia, que sustentou a luta contra o golpismo da direita, durante o segundo governo Vargas, durante a tentativa de golpe contra JK, na Legalidade e depois durante o governo Jango, até o golpe de abril de 1964.
Uma leitura e tanto. Mas repito, suspeito dessa edição atual da Planeta.

Abç.

CF

Cristóvão Feil disse...

Dica: procurar livro em sebos é melhor na "Estante Virtual".

Anônimo disse...

Gracias pelas indicações Feil. O portal "Estante Virtual" é fantástico. Abraço

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