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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?
terça-feira, 25 de maio de 2010
Em 2009, 36% da receita foi para pagar juros
Quem lucra com os juros altos? Os bancos, os rentistas, os parasitas de sempre
Hoje, a dívida pública brasileira é dividida em duas partes: externa e interna. A dívida externa estava em 282 bilhões de dólares em dezembro de 2009. Já a dívida interna estava em mais de dois trilhões de reais no mesmo período. Se somarmos as duas dívidas, chegamos perto de três trilhões de reais. Esta dívida está consumindo a maior parte dos recursos da União. No último ano, os gastos com a dívida consumiram 380 bilhões de reais, que correspondeu a 36% de todo o orçamento da União, sendo disparado o maior gasto. Enquanto isso, foram destinados em recursos 4,8% para a saúde e, 2,8% para a educação. A dívida pública brasileira está muito elevada, consumindo uma grande quantidade de recursos e deixa toda a sociedade sacrificada.
Recentemente, o governo anunciou mais um corte de dez bilhões de reais para gastos públicos. Mas, enquanto isso, os juros estão subindo. É importante lembrarmos que a dívida pode ser um importante financiamento para o Estado, só que, no caso brasileiro e nas investigações da CPI, apuramos que ela é meramente de juros sobre juros. Desde o final da década de 1970, quando houve a alta unilateral das taxas internacionais, esta é uma dívida que cresce em função dos elevados juros. Muitas vezes, mesmo com muito sacrifício, não se chega a cumprir todo o pagamento dos juros, e uma parte deles vai se incorporando ao estoque.
O Brasil é o destino dourado dos grandes especuladores mundiais
Por definição, a dívida externa é em moeda estrangeira e é contraída junto ao exterior. A dívida interna é aquela contraída em reais e devida a residentes do país. Essa é uma definição clássica, mas hoje esses conceitos já não valem na realidade. O Brasil já fez várias emissões de título da dívida externa em reais que tiveram grande aceitação no Estado internacional. Isso porque o dólar estava em flagrante queda no mercado internacional, enquanto os títulos em reais garantiam a esses estrangeiros uma quantidade de dólares cada vez maior.
Esses conceitos clássicos hoje estão sob questão porque temos títulos da dívida externa em reais, e grande parte da dívida interna está nas mãos de estrangeiros que vêm ao país em busca de uma moeda que está se valorizando frente ao dólar. Na projeção dos últimos anos, o dólar teve uma queda muito grande, e a desvalorização cambial já significou um ganho para o estrangeiro.
Os títulos da dívida interna brasileira são os que pagam os maiores juros do mundo. Em meio à crise financeira mundial, o mundo inteiro está com preços baixíssimos, próximo de zero, e os juros no Brasil estão subindo inexplicavelmente. Fora isso, o estrangeiro que aplica em títulos da dívida ainda tem isenção tributária. Todo esse conjunto de coisas está transformando o Brasil no destino dos grandes especuladores internacionais que buscam alta rentabilidade, isenção tributária, e a total liberdade de capitais que temos aqui. Isso está influenciando muito nas contas públicas, está provocando um crescimento enorme da dívida e uma exigência de pagamentos de juros, pois, quanto maior é a dívida, maiores são os juros.
Corte nos gastos sociais objetiva sobrar dinheiro para os parasitas
Dos cortes de gastos sociais, de investimentos, da redução das possibilidades de reajuste. No meio disso, vimos, no Congresso, uma briga tremenda para um reajuste ínfimo para os aposentados, entre 7 e 7,7%. Enquanto isso, os juros subiram de 8% para 9,5%, e agora há uma proposta de subir para 11,5% no fim do ano.
Vemos uma total disparidade de tratamento entre a questão financeira da dívida, e a questão social, a respeito dos trabalhadores, da classe carente que precisa do serviço público de saúde e de educação. Vemos cada vez mais dificuldades em cumprir com esses direitos sociais, além do privilégio cada vez mais escandaloso para esse setor financeiro.
O que é superavit primário
O superavit é uma “economia” que se faz para reservar uma parte dos recursos que servem de garantia para o pagamento de juros. Dizemos “economia”, pois ela é feita, por exemplo, por meio da Desvinculação de Receitas da União (DRU). Esta é uma lei aprovada pelo Congresso que garante que seja retirado até 20% do orçamento da seguridade social – saúde, previdência e assistência –, por exemplo, para cumprir a meta de superávit primário. Assim, várias outras rubricas sofrem contingenciamentos. Deste modo é que acontece essa “economia”, tirando recursos das outras áreas e reservando para servir de garantia para o pagamento de juros.
Trechos de entrevista de Maria Lucia Fattorelli ao portal IHU/Unisinos (cada vez melhor!). Ela é auditora fiscal da Receita Federal e coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida pela Campanha Jubileu Sul. É graduada em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais e em Ciências Sociais pela Faculdade de Ciências Contábeis Machado Sobrinho, em Juiz de Fora. É especialista em Administração Tributária pela Fundação Getúlio Vargas e organizadora do livro “Auditoria da Dívida: Uma Questão de Soberania” (Rio de Janeiro: Contraponto, 2003).
Leia a entrevista na íntegra aqui.
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