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segunda-feira, 10 de maio de 2010

O documentário "Utopia e Barbárie"



Ontem, fui assistir ao documentário de Silvio Tendler, "Utopia e Barbárie" (2009), na ótima sala de cinema do Sindicato dos Bancários, no centro de Porto Alegre.

Tendler confirma o seu talento para costurar a colcha de retalhos do documentário político. Sua capacidade narrativa através de imagens já ficara provada nos documentários Os Anos JK (1980), Jango (1984), Marighella (2001) e Encontros com Milton Santos (2007), este último mostrando a força das ideias do grande geógrafo e pensador brasileiro.

"Utopia e Barbárie" é um painel do século 20, quando a humanidade perdeu cerca de 60 milhões de pessoas exterminadas nas sucessivas guerras - expressão mais aguda da luta de classes e extensão trágica da política por outros meios.

Não se trata de um documentário exclusivamente sobre o Brasil, mas também sobre o Brasil e os demais cenários mundiais onde a luta política foi levada ao extremo da dor e da grandeza humana. A luta colonial na África, as ditaduras na AL, maio de 68 no mundo, a Guerra Fria, a guerra do Vietnã, a revolução chinesa, a guerra entre palestinos e israelenses, e inúmeros outros fatos históricos do Brasil e do mundo, sempre pontuado por depoimentos de personagens que comentam o vivido. Predominam os cineastas, certamente amigos e camaradas de Tendler. Tem aparições interessantes de gente como Franceso Rossi (O caso Mattei), Gillo Pontecorvo (A guerra da Argélia), Fernando Solanas (Memória do Saqueio), Denis Arcand (As invasões bárbaras), os intelectuais e escritores Susan Sontag, Augusto Boal e Eduardo Galeano. Igualmente comentam o tema proposto - utopia e barbárie - a economista Dilma Rousseff e o jornalista Franklin Martins.

No decorrer da projeção, me preocupei que Silvio Tendler pudesse ter cometido o equívoco de entrevistar duas figurinhas carimbadas quando se fala em luta contra a ditadura civil-militar de 1964/85, a saber: Fernando Gabeira e José Dirceu. Mas, não. Tendler surpreende positivamente pela lucidez política e o discernimento histórico de evitar os gigolôs da resistência democrática, os corifeus do pragmatismo e do desbunde ideológico. Só é de lamentar que a Ferreira Gullar tenha se dado demasiado espaço para os seus deboches e ceticismos de classe média ascensional. Eu suponho que Tendler o fez de propósito, para não parecer que estivesse incensando demais as ideias do foquismo deformado em militarismo acrítico. De qualquer forma, sempre é desagradável ter que ver Gullar - com cabelos demais e dentes demais - recitando sua prosa de justificação da justificação do desbunde pusilânime.

Menos mal que, ao falar em poesia, tenha evitado Gullar, e preferido Neruda, Moacyr Felix e Paulo Leminsky, sem esquecer o prosador mais poetizado das Américas, Eduardo Galeano.

Silvio Tendler - mais uma vez - fez um bom documentário, digno de ser passado aos jovens, seguido de comentários e debates sobre a vastidão de temas tratados no filme. Como alguém lembra no filme, "a memória é um espaço de luta política". Ora, se isso é verdade. E é. Silvio Tendler logrou ocupar um vasto espaço em nome daqueles que sempre combateram pela liberdade, dos que não querem o esquecimento como trincheira dos algozes ocultos dessa mesma liberdade.

3 comentários:

Lucas Jerzy Portela disse...

Por gentileza, corrija-se: muito antes de ser brasileiro, Milton Santos e um geográfo bahiano, de Brotas de Macaúbas na Bacia do Paraguaçú, palco que foi da Guerra de Independência do Brasil (que teve seu fim na Batalha das Colinas de Pirajá, ao 2 de julho de 1823).

Milton Santos não pensaria o que pensava se não fosse bahiano. Tanto assim sua tese de doutorado, verdadeira obra prima, é sobre O Centro da Cidade do Salvador.

Cris Rodrigues disse...

Pensei a mesma coisa, que deve ser passado aos jovens, exibido em colégios. Faz uma discussão aprofundada, política, sem ser chato, maçante. Vale muito.

E olha a coincidência, publiquei ontem: http://somosandando.wordpress.com/2010/05/09/entre-a-esperanca-e-a-frustracao-da-utopia-e-da-barbarie/

Abraço

barcelosmarcio disse...

Quando vi o Ferreira Gular dando os pitacos dele pensei: "Putz, lá se foi uma boa idéia"... mas... de fato, o documentário é bem bom...

Ferreira Gullar é ridículo... aliás, essa turminha, que ainda conta com figuras do naipe do Gabeira, do Jabor, do Roberto Freire, o que dizer deles?? lixo...

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