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segunda-feira, 10 de dezembro de 2007


Por que o PT não foi, não é e jamais será social-democrata - parte 1

O marxismo renegado

Durante o Terceiro Congresso do Partido dos Trabalhadores, que se encerra de forma melancólica no próximo dia 16, circulou um debate (hoje, quase algo subversivo dentro do PT) clandestino sobre a social-democracia e quetais. Quem chama o PT de partido social-democrata não conhece nem o PT nem a social-democracia européia. Nesta série de três pequenos artigos veremos por que o PT nunca foi, não é e jamais será social-democrata.

Já vimos que o marxismo foi alienado (expropriado) do seu conteúdo original, por obra do stalinismo. Agora veremos o marxismo ser renegado, por obra da social-democracia.

A denominação social democracia origina-se de organizações partidárias de meados do século 19 que propugnavam pelo socialismo. Na época, o socialismo era doutrina e política dos movimentos organizados e dos partidos que buscavam o poder pela revolução, como na Rússia, ou a maioria no parlamento como na Inglaterra e na Alemanha, ou pelo controle dos sindicatos como na Espanha e nos EUA.

A partir de 1910 o movimento social-democrata começa a dividir-se, embora estivesse organizado internacionalmente sob o nome de Segunda Internacional, pelo menos desde 1875. A Primeira Internacional perdeu o seu significado quando, por iniciativa de Marx, transferiu-se para Nova York, para evitar a acirrada luta interna promovida principalmente pelas alas anarquistas que se digladiavam mutuamente. A divisão do movimento confirma-se em tres grandes tendências: os revisionistas, aliados confessos do imperialismo alemão; a esquerda, formada por Rosa de Luxemburg, Franz Mehring, Karl Liebknecht e Anton Pannekoek; e o centro, formado por Kautski e Bernstein.

A primeira guerra mundial que inicia em 1914 vai resolver esse impasse. A esquerda é presa, a direita corre para o lado do Kaiser, e Kautski declara (sursum corda!) o cancelamento provisório da luta social, já que, segundo ele, o Partido e a Internacional eram instrumentos essencialmente para períodos de paz, e não para tempos de guerra.

Rosa escreve da prisão: "Esta é uma atitude de eunuco. Agora que Kautski o completou, poderá se ler no Manifesto Comunista: 'Proletários de todos os países, uni-vos em tempo de paz, matai-vos em tempo de guerra'".

Rosa irava-se não só com Kautski, mas com os 110 parlamentares do partido social-democrata no Reichstag alemão, em um total de 397 cadeiras (27% de votos); que em 4 de agosto de 1914 votaram a favor dos créditos de guerra. Medida essa que liberou a possibilidade da Alemanha fazer a primeira guerra mundial. Esse fato dividiu para sempre o movimento socialista; demarcando a opção pela linha parlamentar (que Lênin debocha como social-patriotas), e a linha revolucionária.

Bernstein e Kautski seguem sendo os intelectuais orgânicos do revisionismo, nesta altura fortalecidos pela crescente adesão popular através do sufrágio, do movimento sindical e da luta parlamentar. É a gênese do moderno sistema partidário da democracia liberal, com tinturas desmaiadas de socialismo.

Bernstein, após a sua revisão do marxismo, afirma que o socialismo não encontra mais base material nas contradições do capitalismo e da luta de classe; o seu fundamento deverá ser buscado nos princípios imutáveis da moral, do direito e da justiça. Briga com a moça fogosa revolução, para casar-se com a provecta moral. Esse conúbio insólito foi prolífico, gerou muitos filhos e netos, uma família numerosa que alcançou até os nossos dias.

Kautski prefere perder-se na tautologia a achar-se no satanizado caminho revolucionário: "o partido socialista é um partido revolucionário; ele não é um partido que faz revoluções. Sabemos que nossos fins só podem ser realizados por uma revolução, mas sabemos também que não está em nosso poder fazer a revolução, como não está em poder de nossos adversários impedí-la. Conseqüentemente, não sonhamos nunca em provocar ou preparar uma revolução".
Já em 1891, Kautski, redator do programa de Erfurt do Partido Social Democrata alemão, descobria "o socialismo como uma finalidade resultante de uma necessidade natural". Quase uma necessidade fisiológica! É a forma socialismo-como-dor-de-barriga de fazer política. Essa opção pelo reformismo que parcela das lideranças "socialistas" escolheu não se deve a diletantismos subjetivos. Tem uma objetividade bem definida apontada pelo crescimento da acumulação na base econômica da sociedade européia, do final do século 19.

É um oportunismo com bases fincadas na conjuntura econômica, seja do capital, seja do próprio movimento sindical (ainda trade-unionista). A prosperidade posterior desse modelo explica-se parcialmente pelo fantasma bolchevique que assombrava a burguesia européia, depois de 1917. A pauta das concessões burguesas certamente ficou mais pródiga face à ameaça bolchevique, especialmente, após a Segunda Guerra, com o pesadelo atômico e a guerra fria. A cooptação sistêmica da representação operária foi um capítulo surdo da guerra fria e tarefa estratégica de geopolítica.

A formulação social-democrata não é uma abstração de intelectuais pequeno-burgueses temerosos da revolução. Ou de meros traidores da classe operária, podem até sê-lo, mas ficar nisso é tornar opaco o entendimento que devemos ter desse processo.

Assim como o bolchevismo fez a revolução e criou uma base social para o fenômeno stalinista; também o reformismo criou a sua base social, com a colaboração de classes, sem fazer a revolução.

A colaboração de classes consistiu em trazer o operário sindicalizado à integração no sistema capitalista, ainda concorrencial. Como recompensa, o poder de Estado à burocracia social-democrata. Enquanto houve excedente a ser repartido, tudo funcionou.

Continua amanhã...

Um comentário:

Carlos Eduardo da Maia disse...

O PT hoje está muito mais perto de Bernstein e Kautski do que para Rosa Luxemburg e Karl Liebknecht.

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