O grande circo midiático-digital
Ontem foi inaugurado pelo presidente Lula o piloto da televisão digital no Brasil. Foi dada a largada para a completa e integral midiatização da nossa vida social. É hora, pois, de refletirmos sobre isso, afinal, não é ao entardecer que a coruja de Minerva levanta o seu vôo?
É curioso mas não é estranho que o presidente Lula, um ex-operário, ex-sindicalista combativo, tenha protagonizado esse conjunto de fatos que resultaram no ato público de ontem. Foi um ato espetacularizado, na linha do "por que me ufano do meu País", aliás, como sói acontecer no mundo midiático emergente. Na fala presidencial não há um grão de crítica ao sistemão de comunicação social que temos no País, sabidamente um sistema deformado e deformador, totalmente editorializado, inclusive nos programas mais tolos (eu diria, adredemente tolos), e missionário da religião do mercado, considerado como forma única, inexorável e final da existência humana.
O presidente Lula assimilou o grande fetiche da televisão. Não há dúvida. Está enfeitiçado pelo meio, supõe que o meio é a mensagem, adotando o vaticínio de Marshall McLuhan como máxima de bolso. Supõe que a televisão seja um festivo eletrodoméstico voltado para o lazer e o entretenimento das massas, e não uma arma poderosa de construção de mitos e ideologias. Talvez porque o mundo guttenberguiano, a cultura meramente tipográfica e visual da leitura/escrita, por ter sido vedada ao ex-retirante, lhe seja adversa, ele se entregue assim tão acriticamente ao novo mundo da integração sensorial da imagem/som televisiva. Seria a televisão a vingança branca e mansa dos iletrados? Quem poderá saber?
O fato é que o governo Lula está sendo pautado pelo fetiche tecnológico da mídia corporativa local e da grande indústria high-tech internacionalizada. Adota o gadget da hora sem qualquer contrapartida analítico-reflexiva. Tudo acontece como um impulso irrefletido, sob as luzes feéricas do espetáculo triunfante. A "ciência como força produtiva" realiza o seu ciclo no mercado. Os mídias exultam bebendo vinho espumante. O Estado compromete-se mais e mais com requerimentos privatistas e de discutível legitimidade, priorizando agendas impostas de fora (e do alto).
Enquanto isso, a midiatização da nossa vida social se revela como uma mediocrização da nossa vida intelectual. É curioso que a mídia corporativa, parcialmente financiada pelo Estado brasileiro (por si só um escândalo!) faça demandas por qualidade digital na imagem da televisão, quando na velha palavra escrita e falada a distorção usinada seja a regra comum de trabalho. A partir de agora, então, teremos absoluta fidelidade na imagem digital do vídeo, mas o texto do áudio continuará de amargar, cada vez com mais distorções, chuviscos e discrepâncias entre os fatos e as versões editoriais. A imagem é o retrato do real, já o discurso mesmo continuará sempre sob o véu diáfano da fantasia e do mito.
A propósito: o PT em geral, e os petistas em particular, todos muito preocupados com a democracia em abstrato, têm algo a comentar sobre a tevê digital e a mídia corporativa sob o governo Lula?
Ontem foi inaugurado pelo presidente Lula o piloto da televisão digital no Brasil. Foi dada a largada para a completa e integral midiatização da nossa vida social. É hora, pois, de refletirmos sobre isso, afinal, não é ao entardecer que a coruja de Minerva levanta o seu vôo?
É curioso mas não é estranho que o presidente Lula, um ex-operário, ex-sindicalista combativo, tenha protagonizado esse conjunto de fatos que resultaram no ato público de ontem. Foi um ato espetacularizado, na linha do "por que me ufano do meu País", aliás, como sói acontecer no mundo midiático emergente. Na fala presidencial não há um grão de crítica ao sistemão de comunicação social que temos no País, sabidamente um sistema deformado e deformador, totalmente editorializado, inclusive nos programas mais tolos (eu diria, adredemente tolos), e missionário da religião do mercado, considerado como forma única, inexorável e final da existência humana.
O presidente Lula assimilou o grande fetiche da televisão. Não há dúvida. Está enfeitiçado pelo meio, supõe que o meio é a mensagem, adotando o vaticínio de Marshall McLuhan como máxima de bolso. Supõe que a televisão seja um festivo eletrodoméstico voltado para o lazer e o entretenimento das massas, e não uma arma poderosa de construção de mitos e ideologias. Talvez porque o mundo guttenberguiano, a cultura meramente tipográfica e visual da leitura/escrita, por ter sido vedada ao ex-retirante, lhe seja adversa, ele se entregue assim tão acriticamente ao novo mundo da integração sensorial da imagem/som televisiva. Seria a televisão a vingança branca e mansa dos iletrados? Quem poderá saber?
O fato é que o governo Lula está sendo pautado pelo fetiche tecnológico da mídia corporativa local e da grande indústria high-tech internacionalizada. Adota o gadget da hora sem qualquer contrapartida analítico-reflexiva. Tudo acontece como um impulso irrefletido, sob as luzes feéricas do espetáculo triunfante. A "ciência como força produtiva" realiza o seu ciclo no mercado. Os mídias exultam bebendo vinho espumante. O Estado compromete-se mais e mais com requerimentos privatistas e de discutível legitimidade, priorizando agendas impostas de fora (e do alto).
Enquanto isso, a midiatização da nossa vida social se revela como uma mediocrização da nossa vida intelectual. É curioso que a mídia corporativa, parcialmente financiada pelo Estado brasileiro (por si só um escândalo!) faça demandas por qualidade digital na imagem da televisão, quando na velha palavra escrita e falada a distorção usinada seja a regra comum de trabalho. A partir de agora, então, teremos absoluta fidelidade na imagem digital do vídeo, mas o texto do áudio continuará de amargar, cada vez com mais distorções, chuviscos e discrepâncias entre os fatos e as versões editoriais. A imagem é o retrato do real, já o discurso mesmo continuará sempre sob o véu diáfano da fantasia e do mito.
A propósito: o PT em geral, e os petistas em particular, todos muito preocupados com a democracia em abstrato, têm algo a comentar sobre a tevê digital e a mídia corporativa sob o governo Lula?
11 comentários:
Grande texto, Feil. O PT meu caro não tem nada a oferecer sobre o assunto das mídias. Está entregue. Como diz o teu artigo, o Lula está completamente pautado pelos "interésses" no sentido que Brizola dava ao termo.
Aragão
Discordo do blogueiro. É apenas o início de uma nova era e que vai ter como característica a interatividade. E o fato tem sim que ser comemorado com pompa e circunstância com vinho espumante brut, de preferência.
Ora, Maia, interatividade é o outro nome da vigarice institucionalizada da venda de bugigangas e badulaques supérfluos pela televisão. Um mega balcão.
A TV vai ser um super Shoptime da vida, um shopping center bombado e virtual inoculando necessidades nos pacatos cidadãos ingênuos e carentes.
Isso é lixo, rapá. Chamar isso de circo é um engano. Isso é lixo não reciclável, lixo atômico.
E pensarmos que lutamos para chegarmos a esse estágio: a Globo comandando as comunicações!
Ah, se Prestes, Florestan, Sérgio Buarque, e tantos outros vissem isso! Ainda bem que morreram antes.
Anônimo, quando o povo unido que jamais será vencido poderá ter a santa liberdade de escolher a mídia que ele quer interagir - a gente conversa. O que vocês querem que o Lula faça, que ele corte o livre fluxo da mídia? Chávez fez isso e perdeu sua primeira eleição. Vai chegar o dia em que cada vivente vai poder escolher o que é bom para sua tosse. Mas para certa esquerda esse "dia" não vai fazer parte da "história", porque a diversidade de informações e a liberdade de opção são incompatíveis para a construção de qualquer tipo de pensamento monolítico. E a esquerda precisa desse tipo de monopólio da informação para fazer a cabeça das pessoas.
Mainieri, sugiro que não uses o e-mail da instituição.
Vai por mim e toma café Jardim.
Televisão com imagem de qualidade de Primeiro Mundo e programação com intenções escusas e mercadológicas, compondo bem o que Altusser qualificava como AIE(aparelhos ideológicos do Estado)
Pena que a população, em boa parte, esteja mais atraída por essas novidades high-tech do que com a ampliação de seu "capital" intelectual...
Abs.
Ricardo Mainieri
Televisão com imagem de qualidade de Primeiro Mundo e programação com intenções escusas e mercadológicas, compondo bem o que Altusser qualificava como AIE(aparelhos ideológicos do Estado)
Pena que a população, em boa parte, esteja mais atraída por essas novidades high-tech do que com a ampliação de seu "capital" intelectual...
Abs.
Ricardo Mainieri
O PT e os petistas (grande parte dos partidos ditos de esquerda tb)não têm o que dizer sobre a TVD, porque NÃO PENSAM sobre o assunto. Provavelmente, acreditam ser mais uma novidade eletrodoméstica muito bacana, por sinal, um tanto cara, talvez. Ah! Chega a ser enfadonha a tarefa de discutir digitalização-capital-mídia-poder entre as esquerdas. A direita, ao contrário, entende muito bem do babado, porque ela é O PRÓPRIO babado!!! Excelente artigo, irei repassar à minha turma - eu ainda insisto na tecla da democratização da comunicação, com mais meia-dúzia de doidos varridos! :-)
Cláudia, democratização da comunicação para quem???? Para a elite do "movimento social"?
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