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terça-feira, 25 de setembro de 2007


Por que o Rio Grande do Sul é assim – parte VIII

A militarização do castilhismo

Quando se fala em militarização do castilhismo rio-grandense não deve ser confundido como algo ligado à corporação militar brasileira, recém saída da Guerra do Paraguai (1864-1870). O espírito militarista que predominava no PRR resulta da própria situação meridional de fronteiras rebeldes e instáveis, mas também da arguta visão macropolítica de Júlio de Castilhos. É esta que nos interessa.

No Segundo Reinado, o Exército foi sempre desprestigiado, as oligarquias nunca precisaram de intervenção armada, a não ser pontualmente em algumas regiões definidas, como foi o caso do Rio Grande do Sul no decênio 1835-1845, para assegurarem-se da hegemonia política. Entretanto, com a guerra no Paraguai, o Exército adquire prestígio e como que representa uma certa presença da classe média emergente no panorama institucional do Império. Tanto assim que, um dos fatores que contribuiram decisivamente para a queda da monarquia foi a chamada “questão militar”.

Othelo Rosa escreveu, talvez com algum exagero, que “a questão militar, no seu sentido político, que é o seu verdadeiro aspecto histórico, quem criou foi Júlio de Castilhos” nas folhas impressas do diário republicano A Federação.

A verdade é que a “questão militar”, de um simples incidente entre um alto oficial militar que homenageou quem protegia escravos fugidos e um Ministro civil do gabinete monárquico que o destituiu pelo gesto ousado, se transformou num processo político que precipitou não só a Abolição quanto a própria República. Castilhos alimentou a contradição entre militares e o gabinete monarquista, dando espaços diários aos fardados, já prevendo um desfecho favorável às pretensões republicanas provinciais e nacionais.

Com o advento da República, Castilhos volta-se aos temas regionais e de reconstrução do Estado em novas bases legais e institucionais. Prepara a revolucionária Constituição de 1891 e, ato contínuo, dá novos contornos ao chamado Corpo Policial do Estado do Rio Grande do Sul que, apesar de ter sido instituído em 1837 ainda não se consolidara como força pública de efetiva valia ao poder civil.

Em 1892 quando Castilhos firma-se no poder, trata de montar um dispositivo militar engenhoso: consolida o que chama de Brigada Militar estatal e forma nos municípios – cerca de setenta, então – milícias paramilitares de 300 a 500 militantes políticos do PRR. Estas unidades civis, administrativamente, chamavam-se Corpo Auxiliar, mas a população chamava-os de “provisórios”. Os intendentes (prefeitos), não raro, eram ao mesmo tempo chefes políticos locais e chefes militares. Havia plena harmonia entre os chefes militares provisórios (civis) e os comandantes militares profissionais da Brigada Militar, que atuavam sob o comando do Presidente do Estado.

A partir de 1898, o Presidente passou a ser Borges de Medeiros, que havia sido preparado por Castilhos para ocupar a chefia dos republicanos no Estado. Borges, na sua preparação para o exercício do poder, fôra Chefe de Polícia, que significava a rigor controlar o serviço de informações e espionagem mantido pelo governo do PRR nos municípios, bem como os postos avançados de Montevideo, Buenos Aires e Rio de Janeiro. Tinha também a incumbência de controlar movimentos e recolher informações nos Estados de Santa Catarina, Paraná e nas vias fluviais e ferroviárias da região Sul.

Os governos castilhistas-borgistas estavam sempre aprimorando suas forças militares, tanto estatal, quanto seus corpos provisórios. Tinham permanentemente contratados instrutores de guerra da França e da Alemanha (duas escolas de guerra distintas) e renovavam seus armamentos, a ponto que, quando ocorre a Revolução de 1923, a Brigada, e mesmo os corpos provisórios, portavam armas que haviam sido lançadas na Primeira Guerra Mundial, em 1914.

O castilhismo, ao contrário dos Farroupilhas, nunca perderam uma só revolução armada, e foram apeados do poder pelo voto, já que o cenário de classes também se modificará bastante nos quase quarenta anos de exercício do poder.


Foto: ex-governador Antônio Augusto Borges de Medeiros (1863-1961), governou em dois longos períodos, de 1898 a 1908 e de 1913 a 1928. Em 1932 apoiou a Revolução Constitucionalista dos paulistas contra o presidente Getúlio Vargas, seu ex-companheiro do PRR.

Certa feita, quando governador, aproximou-se dele um chefe político de Santa Maria dizendo: “Doutor Medeiros, eu penso que...”, quando foi interrompido pela voz firme e calma de Borges, “Meu filho, tu pensas que pensa, mas quem pensa aqui sou eu”. Morreu com 98 anos de idade, em 1961.


Um comentário:

Anônimo disse...

...esse chefe político de Sta. Maria seria o Jobim, ou talvez o Genro?

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