domingo, 31 de agosto de 2008
Peça-poema
Peça Coração
Um- Posso pôr meu coração a seus pés.
Dois- Se não sujar meu chão.
Um- Meu coração é limpo.
Dois- É o que veremos.
Um- Eu não consigo tirar.
Dois- Você quer que eu ajude?
Um- Se não incomodar.
Dois- É um prazer para mim. Eu também não consigo tirar.
Um- (Chora)
Dois- Vou operar e tirar para você. Para quê que eu tenho um canivete. Vamos dar um jeito já. Trabalhar e não desesperar. Pronto – aqui está. Mas isto é um tijolo. Seu coração é um tijolo.
Um- Mas ele bate por você.
Heiner Müller (poeta e dramaturgo alemão)
A propósito
Não, nenhuma referência ao imbróglio que envolve dona Yedinha. Trata-se de literatura de ficção, com várias versões sobre um romance relâmpago entre um ator norte-americano e uma jovem espanhola. Também uma história sobre o ato de escrever.
A autora é a jornalista e escritora Rosa Montero, que tem fixação em anões.
Recomendo a leitura.
sexta-feira, 29 de agosto de 2008
Vendem-se imóveis (e almas)
Hoje o advogado Pedro Ruas, representando o P-SoL, irá entregar ao Tribunal de Contas do Estado, cópia da revista Imóvel Class (março de 2006), onde consta o anúncio (acima) da venda do imóvel que depois foi adquirido pelo casal Crusius, em 6 de dezembro de 2006, poucos dias antes de Yeda Rorato Crusius tomar posse como governadora do Rio Grande do Sul.
Na revista especializada, a casa estava sendo anunciada por R$ 1,45 milhão, mas a governadora assegura (sem provas) que pagou apenas 750 mil reais, ou menos da metade do preço anunciado.
Até hoje, o casal Crusius não conseguiu explicar como foi essa simples (ou complexa) aquisição imobiliária. Para defendê-la das acusações, a governadora tucana contratou um advogado não especializado em direito imobiliário, mas um criminalista, Paulo Olímpio de Souza.
Milícias lucram mais com cobrança de pedágio que com venda de drogas
O não-Estado do Rio de Janeiro
Quando toma uma van para ir ao curso de pós-graduação, o advogado nem estranha mais a parada no cruzamento da Avenida Campo Grande, principal artéria do bairro, com a Rua Vitor Alves. Depois de entregar dinheiro a um homem que veste um colete preto, o motorista segue seu caminho. Também é familiar a presença de um policial, a aproximadamente 10 metros, alheio à cobrança corriqueira do “pedágio”.
“Só posso pensar que ele divide a grana com o policial. Se o motorista não paga, sofre as conseqüências. Já vi colocarem fogo nas kombis e em vans durante a noite”, disse o advogado, em entrevista à Agência Brasil. Temendo represálias, ele pediu para não ser identificado.
O principal lucro das milícias, e também do tráfico atualmente, é com o transporte alternativo. De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Autônomos em Transporte Alternativo do Rio de Janeiro, Guilherme Biserra, para circular nas áreas dominadas pelo tráfico e pelas milícias, cada veículo precisa pagar R$ 50 por dia.
“Uma cooperativa com cerca de mil carros, que é a média, vai ter que desembolsar por mês R$ 1,2 milhão. Com isso, o cooperado acaba andando todo irregular, deixa de pagar licenciamento do carro, deixa de fazer manutenção, e fica doido atrás de passageiros para tirar o prejuízo. É uma extorsão”, reclama Biserra.
Além do “pedágio”, Biserra denuncia a tomada de algumas cooperativas pelos chefes das milícias. “As cooperativas se transformam em cooperfraudes. Têm CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), registro, mas, na verdade, os cooperados acabam trabalhando para uma pessoa, um dono, ligado à milícia ou ao tráfico. São na verdade grupos que se constituem em cooperativas de fachada para extorquir dinheiro dos trabalhadores. O interesse dessas cooperativas é cobrar taxas diárias para poder rodar”, denuncia.
As “cooperfraudes” e as denúncias de cobrança de pedágio foram citadas em um relatório entregue ao ministro da Justiça, Tarso Genro, no ano passado, mas, segundo Biserra, o governo federal não tomou qualquer providência. “Os trabalhadores em transporte alternativo esperam uma ação da Polícia Federal para combater essa prática. Não dá para contar com a Polícia Militar, porque muitos dos seus integrantes fazem parte desse esquema, coordenam esse esquema”, disse.
Conforme estimativa do setor, os lucros do tráfico e das milícias com a cobrança do pedágio podem chegar a R$ 150 milhões por mês, mais que o obtido com a venda ilegal de entorpecentes. “Com certeza, o transporte alternativo é o que mais rende lucro para os grupos organizados”, destaca o deputado Marcelo Freixo, presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Milícias, que funciona na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro.
“Milícia é grupo armado, formado e liderado por agentes públicos, prioritariamente integrantes ou ex-integrantes da Polícia Militar, com domínio de território, com grande lucratividade em atividades econômicas extorsivas. A extorsão se dá tanto de forma direta, como no caso da cobrança por segurança, até extorsão por meio do controle do gás, dos aluguéis, da água, do transporte alternativo (vans), mototáxi, controle da netcat, também conhecida como gatonet (TV a cabo pirata)”, explicou o deputado.
Em alguns áreas da chamada Grande Campo Grande, e da região de Jacarepaguá, a CPI já constatou grilagem de terras feita pelos milicianos. “Eles tomam as terras e acabam alugando para servir de depósito para lojas de material de construção”, relatou um comerciante de Bangu.
No caso das milícias, o pesquisador Ignácio Cano identificou na composição, policiais, agentes penitenciários, bombeiros ou outros agentes armados do estado, quase sempre em posições de comando. “Há também civis, moradores das comunidades, que colaboram com os milicianos em algumas ocasiões, e pessoas recrutadas entre narcotraficantes derrotados”, constatou.
No caso da venda de gás, por exemplo, há informações do setor que apontam lucro mensal de cerca de R$ 16 milhões. Segundo estimativas do Sindicato dos Revendedores de Gás GLP do Estado do Rio de Janeiro, existem 15 mil pontos de venda ilegais na cidade, muitos em áreas dominadas por milícias.
Em depoimento na CPI das Milícias, o representante do sindicato ressaltou que existem apenas 1.580 pontos regulares de revenda de gás na cidade do Rio de Janeiro. Ele citou que uma das empresas irregulares, localizada em Rio das Pedras, bairro considerado berço das milícias na capital, venderia 3 mil botijões de gás por dia em Jacarepaguá. O faturamento diário, apenas dessa empresa, pode chegar a R$ 25 mil.
Com TV a cabo os lucros podem podem chegar a R$ 120 milhões. As mensalidades cobradas, que variam de acordo com a região, vão de R$ 20 a R$ 35, com acesso a todos os canais.
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Apenas uma singela observação: e a todas essas o governador Cabral ainda insiste com a realização das Olimpíadas de 2016 na cidade do Rio de Janeiro. Afirma que para a cidade ficar “competitiva” para sediar os jogos basta apenas privatizar o aeroporto Tom Jobim. Certamente está sendo porta-voz de interesses ocultos e tão republicanos quanto os próprios milicianos que controlam extensos territórios da cidade e de grande parte da Baixada Fluminense.
quinta-feira, 28 de agosto de 2008
Governadora Yeda adverte
“Deu pra eles”
Dona Yeda Rorato Crusius ontem foi à Gravataí de helicóptero. Mas parece que o vôo lhe causou mais danos ao juízo.
Segundo o jornal Correio de Gravataí (acima), ela se excedeu. Modesta, comparou-se à seleção feminina de vôlei que ganhou ouro em Pequim, insinuou que será candidata à reeleição (traindo Padilha!), que nunca se escondeu na bruma (?), e que agora entra numa "fase de governadora agitadora”.
Finalmente, fez uma ameaça duplamente enigmática: “Deu pra eles”.
Na platéia atônita, as pessoas se entreolhavam incrédulas.
“Deu”, o quê?
“Eles”, quem?
Definitivamente, nada ou ninguém é tão ruim que não possa piorar.
É muito punk!
Como se explica isso?
Incra distribuía terras da União a grileiros
Segundo o ministro Ayres Britto, são nulas as titulações conferidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a não-índios, pois as terras “já eram e permanecem indígenas”. Os arrozeiros que passaram a explorar as terras partir de 1992 não têm, de acordo com o ministro Britto, qualquer direito adquirido sobre a terra. “A presença dos arrozeiros subtrai dos índios extensa área de solo fértil e degrada os recursos ambientais necessários à sobrevivência dos nativos da região.” – disse ontem o magistrado.
Agora, só resta ao Incra explicar como distribuía titulações de propriedade de terra da União a indivíduos não-indígenas. É uma forma direta de estímulo e legitimação à prática criminosa de grilagem em terras públicas, que se sabe, sempre vem acompanhada de inúmeras outras ações anti-sociais e criminosas.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Incra precisam explicar estes graves fatos ao País.
Desobediência ao ministro Jobim
Direção do PT cobra punição de torturadores da ditadura
A cúpula do PT ressuscitou a polêmica sobre a punição aos torturadores da ditadura militar (1964-1985). Em nota divulgada ontem, na véspera dos 29 anos da Lei de Anistia, a Executiva Nacional do PT cobrou a responsabilização dos militares que praticaram tortura, sob o argumento de que “crimes contra a humanidade não prescrevem” e saiu em defesa dos ministros Tarso Genro (Justiça) e Paulo Vannucchi (Direitos Humanos), enquadrados por Lula depois de comprarem briga com as Forças Armadas.
“A Comissão Executiva Nacional repudia os ataques difamatórios feitos por setores conservadores e antidemocráticos contra os companheiros Paulo Vannucchi e Tarso Genro”, diz a nota, numa referência à manifestação de oficiais e generais, no Clube Militar do Rio, há 21 dias.
O presidente do PT, Ricardo Berzoini (foto), disse que o partido tem autonomia em relação ao governo. “O PT tem posições políticas e não necessariamente o presidente Lula precisa se alinhar a elas”, afirmou Berzoini. Para ele, o retorno do tema não causa constrangimento ao Planalto. “A polêmica já ocorreu e no governo há várias posições”, justificou.
Na nota de 15 linhas, a Executiva do PT diz esperar que o Judiciário atenda às reivindicações das vítimas do regime militar, especialmente das famílias dos mortos e desaparecidos políticos. “A punição aos violadores de direitos humanos é tarefa da Justiça brasileira. A informação está no jornal Valor Econômico, de hoje.
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Mais vagarosa que tropeiro de lesma, a direção nacional petista pelo menos cumpriu com o seu dever político, ainda que num gesto meramente formal e episódico.
Eleições 2008
No afã de justificar e manter a hegemonia na sociedade capitalista, os seus intelectuais e porta-vozes – no Brasil, identificados majoritariamente no PIG – tratam de se apropriar de palavras que traduzam e representem a realidade que nos cerca.
Resumindo: a nossa linguagem cotidiana está crivada de expressões e pequenas idéias que amarram os indivíduos à vasta rede mundial de dominação econômica e cultural dos setores hegemônicos (hoje, comandados pelo capital financeiro).
A inocente linguagem das ruas (a tagarelice), da publicidade (ratificadora de preconceitos e estereótipos), dos jornais, das televisões, das rádios, das escolas, dos bares e áreas públicas expressam essa quase inexorabilidade de nossos dias. Mas existem anteparos e resistências a esse fenômeno neocolonizador das sociedades de massa, que agem como as pedras côncavas e convexas de um rio turbulento e rápido: são as expressões artísticas autênticas, o cinema, as artes plásticas, a literatura crítica e o pensamento e a práxis políticas que não aceitam a ditadura do pensamento único e nem a passividade dos fatalistas.
Toda essa introdução (algo cabeça) para voltar a falar da pobreza constrangedora da nossa presente campanha eleitoral 2008. Como o debate de natureza política está (tacitamente) vedado – parece que houve um pacto de mediocridade entre os concorrentes para lograr tamanho êxito – a disputa fica no campo da aparência visual e de quem faz a melhor apropriação do linguajar senso comum (vale dizer, a linguagem consentida e incentivada para expressar a hegemonia que falamos acima).
Assim, o candidato (a candidata) – agora destituído de fibra política, pasteurizado e higienizado – trata apenas de passar uma imagem contrária àquela que sempre o identificou. Se o candidato tem o cabelo crespo, trata logo de alisá-lo. Se tem uma imagem combativa, trata agora de passar uma idéia angelical e plácida. E por aí vai. Mas é no discurso que se operam as maiores inversões. Vêem-se alguns que adotam por inteiro os cacoetes correntes, aquilo que Bourdieu chama de “automatismos do bom senso” (a moda agora é falar em atitude, seja lá o que isso queira dizer).
No eclipse da política, aparecem as intenções de neutralidade astuciosa. O mesmo sujeito que secretamente representa o interesse do capital imobiliário, candidamente surge afirmando bandeiras ambientalistas e preservacionistas. Os principistas e ortodoxos de ocasião desfilam – como no carnaval – com os seus contrários, sob máscaras de cores e simbologias diversas do original.
Onde a falsificação é uma regra, a simplificação é um dever. A retórica adquire moto próprio, se automatiza na lógica do vazio e do engano. O discurso eleitoral agora é quase uma secreção involuntária das glândulas, sai como que para cumprir o objetivo de naturalização da ordem e de normalização das diferenças.
O intrigante de tudo isto, entretanto, o que causa interrogação sincera é o seguinte: que fenômeno é esse que consegue tornar tão uniforme propostas de origem tão diversa? Me explico: candidatos (candidatas) sem a mínima chance de vitória eleitoral, ainda assim, renunciam a uma possível desforra política, no sentido mesmo de promover as suas organizações partidárias, com desempenho de denúncias, críticas, apontando contradições gritantes, etc. Ou seja, para além da derrota eleitoral que sofrem, ainda carregam a humilhação de terem renunciado àquilo que em outros tempos se chamava agitprop – agitação e propaganda.
Essa derrota dupla, mais que humilhante, é definitiva.
Grileiro provocador
Provocação barata de Paulo César Quartiero, arrozeiro e grileiro de terras públicas, depois do voto do ministro Carlos Ayres Britto, ontem, no STF:
“Como é difícil ser produtor rural neste país, e o que eu sinto mais vergonha na minha vida é que eu pago imposto para sustentar um monte de gente”.
Questionado sobre a afirmação de Quartiero, o ministro Ayres Britto disse que os produtores são beneficiados com isenção fiscal.
“Até onde eu sei, os rizicultores de Roraima têm isenção de ICMS, oferecida pelo governo do Estado até 2018”, argumentou Ayres Britto.
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
STF suspende julgamento
Foi brilhante o voto de Ayres Britto
O ministro Carlos Ayres Britto, relator da ação que contesta no Supremo Tribunal Federal (STF) a demarcação em área contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, votou pela manutenção da reserva conforme homologada em 2005 pelo governo federal, com 1,7 milhão de hectares. A informação é da Agência Brasil.
O ministro rejeitou argumentos de suposta falsidade do laudo antropológico e proliferação estimulada de comunidades. “Toda metodologia antropológica foi observadada pelos profissionais que detinham competência para fazê-lo. O estado de Roraima teve participação assegurada no grupo de trabalho da Funai [Fundação Nacional do Índio]. Não se confirma a informação de que houve expansão artificial de malocas. A extensão da área é compatível com as coordenadas constitucionais, e as características geográficas da região contra-indicam uma demarcação restritiva.”
Segundo o ministro, são nulas as titulações conferidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a não-índios, pois as terras “já eram e permanecem indígenas”. Os rizicultores que passaram a explorar as terras partir de 1992 não têm, de acordo com Britto, qualquer direito adquirido sobre a terra. “A presença dos arrozeiros subtrai dos índios extensa área de solo fértil e degrada os recursos ambientais necessários à sobrevivência dos nativos da região.”
“O ato de demarcação foi meramente declaratório de uma situação jurídica preexistente, de direito originário sobre as terras. Preexistente à própria Constituição e à transformação de um território em estado-membro”, assinalou Britto. “Para mim o modelo de demarcação é contínuo, no sentido de evitar interrupção física entre o ponto de partida e de chegada”, acrescentou.
Britto argumentou que, em Roraima, há terra em abundância para toda a população do estado. “Tudo em Roraima é grandioso. Se há, para 19 mil índios, 17 mil quilômetros quadros, para uma população de menos de 400 mil não-índios há 121 mil quilômetros quadrados.”
Britto definiu como "falso antagonismo" a idéia de que demarcação de terras indígenas atrapalha o desenvolvimento. “O desenvolvimento que se fizer sem os índios ou contra os índios onde estiverem eles instalados à data da Constituição de 1988, será o mais profundo desrespeito”, afirmou o ministro. Ele afirmou ainda que não há impedimento jurídico para que o Exército não atue nas reservas para preservar a soberania nacional.
“Não vale o argumento de que a demarcação contínua acarreta a não-presença do Estado. Isso não pode ser imputado aos índios, que não podem pagar a futura por algo que não contraíram. A União deve cumprir o seu dever de assistir a todas as comunidades indígenas, inclusive com atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal em faixas de fronteira”, disse Britto.
Inicialmente, o ministro ressaltou que a Constituição Federal prevê tratamento diferenciado aos povos indígenas, como dispositivos suficientes para que os índios brasileiros não precisem recorrer a amparo jurídico estrangeiro.
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Após a apresentação do voto do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto, que deu parecer pela manutenção da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR) em área contínua, o ministro Carlos Alberto Menezes Direito pediu vista do processo.
O presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, disse que pretende retornar com a ação ao plenário "se possível ainda neste semestre".
Artigo
Raposa é terra indígena, sim!
A homologação de Raposa Serra do Sol é emblemática para as lutas indígenas no Brasil. Cabe ao Supremo Tribunal Federal exercer seu dever fundamental de garantir o que determina a Constituição, que afirma ser dos índios a posse e o usufruto exclusivo das terras tradicionalmente por eles ocupadas. As áreas invadidas pelos arrozeiros são terras tradicionalmente indígenas.
A decisão do STF favorável aos indígenas de Raposa é uma decisão que afirma a valorização da multiculturalidade brasileira e de um País que reconhece os direitos de seus povos originários. Não há razões que justifiquem uma decisão contrária. O procedimento demarcatório de Raposa obedeceu a todos os parâmetros legais.
Se dizem que “há muita terra para pouco índio”, a verdade é que Raposa tem 1,7 milhão de hectares, ou 7,5% do território de Roraima, onde vivem 194 comunidades.
Somando outras 31 terras indígenas no Estado, obtêm-se 46% de sua superfície demarcada. Nos 54% restante cabem os Estados do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Alagoas, onde vivem 22 milhões de pessoas. Porém, a população de Roraima não chega a 400 mil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
As terras indígenas não inviabilizam o desenvolvimento de Roraima. O “desenvolvimento” que praticam os invasores das terras indígenas comporta irreversíveis prejuízos sociais, ambientais e culturais. Os invasores são isentos de pagar impostos ao Estado até 2018 e suas lavouras não geram muitos empregos como dizem, pois os trabalhos são mecanizados.
Raposa Serra do Sol não coloca em risco a soberania nacional. Pela Constituição, as terras indígenas são patrimônio da União, que possui plenos poderes sobre elas.
A área Yanomami, seis vezes maior, não se tornou uma nação independente e não vai se tornar. Ao contrário, as terras indígenas conferem segurança ao País, por possuírem cidadãos brasileiros, os indígenas, em vigilância constante na região; por serem propriedades da União; e, quando em faixa de fronteira, terem proteção constitucional das Forças Armadas.
As terras indígenas são bens indispensáveis e inalienáveis. Prestam relevante função ambiental ao País ao protegerem florestas, rios e savanas. Raposa Serra do Sol é terra indígena, sim!
Artigo de Éden Magalhães, secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), publicado hoje no Estadão.
Foto: mulheres waimiri-atroari que vivem em tribos indígenas no Sul de Roraima.
O prazo ético-moral é hoje
O presidente da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, deputado Alceu Moreira (PMDB) está sendo investigado pela Polícia Federal a pedido do Ministério Público Federal e do STF.
A exemplo do que já ocorreu com o presidente do Tribunal de Contas do Estado/RS, conselheiro João Luiz Vargas, também investigado pela PF, e que pediu afastamento do cargo público funcional que ocupa, o presidente do Poder Legislativo deve igualmente pedir afastamento, sob pena de comprometer a própria instituição que preside e representa.
As investigações e diligências policiais podem exigir que sejam vasculhados locais de moradia e trabalho do deputado investigado, como suas residências,
Assim sendo, a Assembléia Legislativa estadual e seus deputados não podem ficar expostos – de forma passiva e solidária – junto com o deputado-presidente que é objeto de investigação policial constrangedora e desconfortável para todos. As suspeitas que ora recaem sobre o indivíduo Alceu Moreira (esq.) não pode contaminar a instituição e os demais parlamentares representantes populares.
A saída – ainda que temporária – do deputado peemedebista deve ser inadiável – hoje. Prazos ético-morais não precisam estar escritos para serem obedecidos, eles estão gravados na consciência autônoma da cidadania livre.
Século 19 na Expointer 2008
Hoje, o jornal Correio do Povo deu um banho de realidade
Além disso, o CP informa na capa sobre as relações trabalhistas de século 19 encontradas pelo Ministério Público do Trabalho no Parque de Exposições de Esteio, sede anual da Expointer, a grande feira do agronegócio do Sul.
O MP notificou o Governo do Estado e pelo menos três cabanhas, somente ontem. A Superintendência Regional do Trabalho, Emprego e Renda (SRTE) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) detectaram irregularidades nas relações trabalhistas e as péssimas condições dos empregados dos fazendeiros-expositores, como alojamentos que não existem, problemas de higiene (peões fazendo refeições junto aos animais), insalubridade e periculosidade (os touros são animais violentos).
Suspeita-se também de jornadas excessivas de trabalho, já que os animais exigem permanente vigília dos seus tratadores. Depoimentos dos próprios cabanheiros (criadores de animais de raça) informam que contratam um peão por animal, sendo que este animal precisa de cuidados nas 24 horas do dia, portanto, paira a desconfiança de que os empregados rurais têm jornadas em excesso, bem além da jornada legal de oito horas, acrescida das duas horas-extras remuneradas. Assim, ficam faltando 14 horas de trabalho que não estariam sendo remuneradas pelos fazendeiros-empregadores, e que a fiscalização e auditagem do MPT e da SRTE irá constatar no decorrer da feira deste ano.
A Farsul (federação sindical do patronato rural do Estado) não se manifestou oficialmente sobre o caso. No limite, a Superintendência Regional do Trabalho, Emprego e Renda pode interditar o parque estadual de Esteio (área metropolitana de Porto Alegre).
terça-feira, 26 de agosto de 2008
Comovente!
Ontem, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o consagrado Farol de Alexandria, esteve
Farol veio ao Sul à convite de uma publicação pretensiosa de direita, “Voto”, para um evento cujo título serve de indagação à desnorteada oligarquia brasuca: “Brasil: o que fazer?”.
Chamou a atenção o discurso ambíguo (com um travo de alarmismo, bem ao estilo FH) do professor Cardoso, ao alertar para um possível risco de o País se transformar numa Venezuela, “caso enfrentemos momentos de dificuldades”.
Depois de regurgitar uma sortida coleção de tolices como essa, Farol foi para o aeroporto sozinho, nenhum tucano o acompanhou.
ONU alerta
O relator especial das Nações Unidas para os Direitos Humanos e as Liberdades Fundamentais dos Povos Indígenas, James Anaya, afirmou que o Brasil precisa avançar na questão dos direitos indígenas.
O relator ficou doze dias no Brasil a pedido de indígenas da reserva Raposa/Serra do Sol, de Roraima. A área hoje é disputada por arrozeiros, que se negam a deixar o local pertencente à União.
Anaya reconheceu que o governo tem se esforçado em cumprir com os direitos constitucionais. No entanto, apontou que são necessárias reformas para garantir o direito à auto-determinação, que é a possibilidade dos indígenas exercerem de fato o controle sobre suas vidas. O relator também mostrou preocupação com programas governamentais considerados paternalistas e afirmou a importância das obras do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, estarem em harmonia com a população assistida. A informação é da Agência Chasque.
Desenvolvimento sustentável local
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, o Consea, lançou abaixo-assinado em que reivindica mais agilidade na tramitação do projeto de lei sobre o Programa Nacional de Alimentação Escolar. O projeto, que tramita atualmente na Câmara dos Deputados, define que 30% dos recursos do programa sejam destinados à compra de alimentos da agricultura familiar local.
A medida abrange mais de oito milhões de estudantes do ensino médio e de escolas de alfabetização. O abaixo-assinado está na página de internet do Consea, e pode ser acessado aqui. Assine.
Fiasco em Pequim
As Olimpíadas de Pequim, recém encerradas, provaram a inutilidade do Ministério dos Esportes. Foi criado para abrigar o PCdoB no primeiro governo Lula. A legenda nanica (e conservadora), que insiste no auto-engano de se denominar "comunista", está lá até hoje. Para quê?
Foram à China, 277 atletas numa delegação de mais de 600 pessoas, tudo às expensas do Tesouro nacional. Ou seja, foram mais “perus” do que atletas, certamente, dirigentes, burocratas, aspones, jornalistas, cartolagem e pessoal de apoio aos atletas. Porém, uma atleta brasileira não encontrou a vara de salto em altura porque o apoio falhou, seja chinês, seja brasileiro.
Cada medalha de ouro custou 53 milhões de reais. Foram apenas 15 medalhas, no geral, três de ouro, o que nos garantiu o 23º lugar no ranking final de Pequim. Ficamos atrás de “potências” como Bielorússia, Jamaica, Romênia, Etiópia e Quênia.
O ministro Orlando Silva – que faz da cor da própria pele uma bandeira política a desfraldar em todos os momentos – chegou a contrariar o presidente Lula. Enquanto este dizia que tivemos um desempenho apenas razoável em Pequim, Orlando considerou que saímos muito bem. Óbvio, ele precisa justificar o elefante branco que tripula na Esplanada dos Ministérios.
Não entendi o significado de uma frase de Sua Excelência, o ministro do PCdoB, ontem, ao fazer um balanço de Pequim: “A formação de campeões é conseqüência dos campeões de vida. Por isso, o esporte é uma oportunidade”.
Só se for "oportunidade" para o próprio PCdoB, que de oportunidade entende como poucos.
segunda-feira, 25 de agosto de 2008
Indiciados
A Superintendência da Polícia Federal (PF) no Rio Grande do Sul deverá iniciar nos próximos dias as investigações sobre os políticos gaúchos com foro privilegiado apontados pelo Ministério Público Federal ao Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, o inquérito em que estão indiciados os deputados federais José Otávio Germano (PP) e Eliseu Padilha (PMDB) já está com os agentes federais no Estado.
Apesar de não existir prazo estipulado para a conclusão das apurações, Mello acredita que, em 30 dias, a PF poderá apresentar algum resultado. 'Esta ação ainda é embrionária. O Ministério Público Federal não tem elementos suficientes para apresentar denúncia.
Agora, a PF dará prosseguimento às providências necessárias para esclarecer os fatos.' Os pedidos de quebra de sigilo deverão ser autorizados pelo Supremo.
O inquérito foi encaminhado ao STF no início deste mês pelo procurador da República do município de Canoas, Adriano Raldi. Também estão indiciados o presidente da Assembléia Legislativa, Alceu Moreira (PMDB), o secretário estadual de Habitação, Marco Alba (PMDB), e o secretário-geral de Governo de Canoas, Francisco Fraga. Além deles, são citados o prefeito de Sapucaia do Sul, Marcelo Machado (PMDB), seu chefe de gabinete, Renan Presser, e de um empresário gaúcho. O superintendente da Polícia Federal no Estado, Ildo Gasparetto, alega segredo de Justiça para não comentar o caso. A informação é do Correio do Povo, de hoje.
Horário eleitoral não é gratuito
A Receita Federal deixou de arrecadar R$ 713 milhões com a exibição e transmissão dos programas eleitorais gratuitos na televisão e no rádio, em 2006 e
De acordo com o Decreto 3.786, de 2001, as emissoras de rádio e de televisão podem abater, de seu lucro líquido, no imposto de renda, 80% do valor que seria pago por prováveis anunciantes nos horários de exibição desses programas. Com isso, o horário “gratuito” acaba sendo pago, indiretamente, pela União, ou pelo contribuinte.
O custo dos benefícios fiscais das eleições deste ano só será conhecido em 2009, mas nas últimas eleições, realizadas em
Lulismo diz que não cede
Secretários estaduais de Agricultura, parlamentares da bancada ruralista e representantes de entidades do agronegócio vão criar grupo de trabalho para elaborar documento que visa alterar o decreto da Lei de Crimes Ambientais. O texto terá doze propostas. Uma delas se refere à ampliação do prazo de registro em cartório do tamanho da área de reserva legal, que hoje é de 120 dias. A informação é da Agência Chasque.
O Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, afirmou que o governo estuda flexibilizar a lei, mas que isso não significa que esteja cedendo às pressões dos ruralistas.
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Essa observação do ministro Minc me deixa aliviado. Sério. Lendo a notícia, eu fiquei certo que o lulismo de resultados estava “amolecendo” para os agronegocistas que devastam o ambiente natural, de novo. Mas, a palavra do ministro Minc é uma garantia que me deixa – agora, sim - tranqüilo.
É mais fácil as vacas voarem do que o ministro lulista do Meio Ambiente ser pego na mentira. Sério.
"Jornalismo" adubado
Vai de vento em popa o consórcio RBS/papeleiras no Rio Grande do Sul. O jornal Zero Hora vem publicando uma série de matérias interessadas que visam ajudar a dissolver resistências simbólicas à expansão descontrolada da monocultura extensiva do eucalipto na Metade Sul. Como não há a menor oposição do poder público estadual, o consórcio trata agora de colonizar – de forma intuitiva - o imaginário do senso comum sul-rio-grandense.
Na construção de um novo mito não se omite nada, mas tudo se deforma. Assim, a função de ZH é falar do progresso (outro velho mito de guerra) trazido pelos eucaliptos. De um progresso purificado, redentor e inocente, onde há uma clareza não de explicação (como diz Barthes), mas de constatação. Como ser contra este cenário bucólico e pastoril de inocentes vaquinhas comendo à sombra de vastos maciços verdes de eucalipto? A intenção subjetiva é fazer com que as coisas percam a lembrança da sua produção.
A naturalização das imagens faz o senso comum esquecer a história da sua origem. Já não há mais papeleiras, há a silvicultura. Quem é contra o verde? Já não há mais monocultura extensiva, há esperança num futuro radioso. Já não há desequilíbrio ambiental, há emprego para todos. Já não há mais a devastação do que resta do bioma Pampa, há renda e consumo para todos. A extinção das espécies interdependentes – animais e vegetais – já não irá ocorrer, pois é apenas um sortilégio agourento dos inimigos do progresso e da harmonia entre os homens de boa vontade. É sensível e comovente: quase se ouve o batucar da esperança no peito dos mansos e humildes de coração.
A operação colonizadora do consórcio predatório RBS/papeleiras não é discursiva. É uma operação intuitiva que apenas constata de forma direta e imediata, sem explicar ou categorizar. Por isso é uma operação pedestre, no chão raso do assunto, sem qualquer mediação. E por isso precisa abolir o pensamento e sonegar o real.
Quem disse que não existem mais contos de fadas? ZH nos conta um, hoje. Com outros personagens, outros símbolos e o mesmo futuro encantado e risonho para todos.
STF julgará quarta-feira
O Supremo Tribunal Federal (STF) deixará margem jurisprudencial para futuras ações que contestem a demarcação de outras reservas no País se determinar, em julgamento na próxima quarta-feira, mudanças na demarcação em área contínua da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol,
“Tem que verificar as condições, se em certas circunstâncias é impossível reabrir processo. Mas a decisão do STF [pela eventual alteração da demarcação] iria redeterminar o paradigma da questão e abrir ensejo a outras ações. Por isso preocupa”, afirmou Souza. A informação é da Agência Brasil.
O STF vai julgar ações que contestam a demarcação na próxima quarta-feira (27). O objetivo dos requisitantes é garantir a permanência de grandes produtores de arroz e agricultores brancos na reserva.
Entretanto, segundo o jurista da UnB, não há na Constituição Federal base para uma decisão com viés conciliatório, no sentido de permitir a convivência de índios e não-índios na área de 1,7 milhão de hectares homologada pelo governo.
“Solução conciliatória a partir da Constituição, eu não enxergo. Há na concepção do direito um entendimento de que certos valores são irrenunciáveis, inegociáveis, na linha de recuar daquilo que é o seu princípio fundante. A questão indígena não pode ser vista dentro das regras correntes da vida cotidiana dos não-índios, como se fosse um contrato, um negócio, um acordo”, ressaltou Souza.
“Não há como negar a visão de que os índios formam uma outra cultura com o horizonte jurídico das suas tradições. Se eles deixam de ter essa dimensão, deixam de ser índios e isso beira um genocídio cultural”, acrescentou.
Na opinião do jurista, a demarcação da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol em área contínua é compatível com os marcos constitucionais internos e as normas internacionais de direitos humanos. Qualquer decisão em sentido contrário poderia ser contestada.
“Não há como imaginar que o direito originário sobre as terras tradicionais seja afetado. Esgotada a deliberação no plano nacional, existem mecanismos para o ingresso na Corte Interamericana de Direitos Humanos, que leva em conta que o princípio da tradição e os direitos imemoriais das comunidades indígenas sejam respeitados”, argumentou.
Foto: Há mais de quinze anos arrozeiros do Sul foram para Roraima, lá invadiram terras indígenas, desmataram e se apossaram ilegalmente de grandes áreas. Recentemente, o governo estadual de Roraima (PSDB) entrou com uma ação no STF questionando a homologação federal de terras contínuas aos indígenas da região. Quarta-feira, o Supremo irá julgar a ação.
domingo, 24 de agosto de 2008
Poeta 94
Faça como se estivesse em casa
Um esperança construiu uma casa e colocou-lhe um azulejo que dizia: Bem-vindos os que chegam a este lar. Um fama construiu uma casa e não colocou azulejo nenhum. Um cronópio construiu uma casa e seguindo o hábito colocou no vestíbulo diversos azulejos que comprou ou mandou fabricar. Os azulejos eram dispostos de maneira a que se pudesse lê-los
Julio Cortázar (1914-1984)
.....
Terça-feira próxima, 26 de agosto, Julio Cortázar (foto) se vivo fosse estaria completando 94 anos de idade.
Para ele, o nome das coisas nem sempre identificam o que está nomeado, às vezes é preciso virá-las do avesso para encontrar o seu significado. A “democracia” é uma dessas coisas-nomes-palavras. São quase cem anos de cronópios, famas e esperanças – os abstratos personagens mais caros do grande escritor, também chamado de Che Guevara da literatura (não me perguntem a razão).
Cortázar de fato foi revolucionário na sua narrativa, sempre procurando enxergar o mundo com olhos de poeta, embora vertendo em prosa os cenários mais estranhos contados por objetos familiares – copos, chaves, azulejos, cadeiras, velas. Tudo motivo para denunciar o absurdo da existência dentro do sistema-mundo.
Na sua obra O livro de Manuel (1973) denuncia os horrores da ditadura militar argentina. Cortázar era um argentino nascido acidentalmente em Bruxelas, mas um cidadão do mundo, um internacionalista da cepa. Amava as mulheres, a literatura, o jazz e, claro, a humanidade – suas mais saudáveis obsessões.
Na novela Rayuela (1963) o jazz é quase um personagem autônomo na história. Por isso, vamos lembrá-lo hoje com um clássico do jazz: Take Five, do não menos genial Dave Brubeck (e seu quarteto), em apresentação de 1966. Curta aqui.
sexta-feira, 22 de agosto de 2008
Justificações encabuladas
Como o lulismo conciliador de resultados é a expressão política do espontaneísmo e do pragmatismo mais desenfreado, faltam-lhe suportes conceituais que sustentem a sua condição política. O PT já é impotente para oferecer qualquer discurso forte que sirva de plataforma categorial a posteriori (uma vez que a liderança unipessoal de Lula se descolou do partido, deixando-o à deriva no deserto do real).
Resta, pois, àqueles que querem aderir ao lulismo apenas oferecer justificações abonatórias e, - como todos sabemos – estas, as justificações, sempre são produtos da retaguarda, sempre feitas a posteriori dos fatos e feitos.
No vazio intelectual do PT, no vácuo mesmo do silêncio constrangedor petista, surgem dois militantes respeitados e potentes: um, é o professor Juarez Guimarães, outro, é o também professor, Emir Sader. Ambos tentam – ainda que de forma encabulada e inconclusiva – justificar o estado da arte do lulismo conciliador de resultados. Tarefa solitária e quixotesca, a que se propuseram, talvez equivalente a engarrafar nuvens – mas sem a poesia desta.
Falo tudo isso, para indicar a leitura de entrevista do professor Sader ao jornal portenho Página/12, publicada domingo último (leia aqui).
Sader seguidas vezes tem falado em “hegemonia”. Nesta entrevista volta a mencionar a categoria, mas o faz de forma tão indeterminada que não ficamos sabendo a qual hegemonia se refere. Será aquela de corte leninista? Será a hegemonia gramsciana? Será a defendida por Ernesto Laclau? Ou a hegemonia pedestre dos jornalistas do PIG, equivalente singelo à conquista e manutenção de maiorias eleitorais tout court?
É interessante na entrevista, que o jornalista que indaga ao professor Sader, lá pelas tantas, flagra a militância de justificação do entrevistado e pergunta-lhe direto sobre a mesma. De qualquer forma, vale a pena a leitura das palavras de Sader, que, para além da doença infantil do lulismo, tem muitas passagens saudáveis.
Eu quero retomar aqui esse assunto da hegemonia, mais adiante. Apesar de estar na boca dos justificadores do lulismo, é um tema que não faz parte do vocabulário lulista oficial, cujos horizontes são meramente eleitorais, nada além disso.
Quem está remontando um processo de hegemonia, a rigor, é o movimento social no Brasil, que tem sabido tensionar pela esquerda o lulismo planaltino (sem trair aspectos políticos estratégicos), enfrentar vis-à-vis a direita e suas polícias de choque, e ainda pensar um projeto alternativo para o País (embora ainda careça de universalidade).
O projeto hegemônico se confunde com o projeto democrático, no seu sentido mais substativo e horizontal. Portanto, o lulismo, ao cobrar determinação e fixidez ao movimento social, conspira contra o caráter indeterminado e criativo (por isso democrático) dos movimentos sociais. Essa permanente tensão de contrários é que faz avançar o projeto democrático estratégico, porque incorpora direitos novos, demandas genuínas e novas formas de representação e participação (para bem além das duas instituições caducas, Parlamento e sistema eleitoral formal).
O lulismo, mesmo que não queira, mesmo sem saber, avança igualmente com os movimentos sociais. Mesmo a reboque. Mesmo sob um abstrato cabresto.
Foto: até a fotografia do professor Sader está encabulada, lateral, oblíqua no Página/12.
Depois de enquadrado, lulista ataca
O ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, deu uma entrevista à Agência Brasil, do qual extraímos o trecho final, abaixo:
Agência Brasil: Como o senhor vê o caso da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol?
Ministro Vannuchi: Raposa Serra do Sol é o mais importante dos procedimentos do governo Lula na temática indigenista. Há a resistência de um conjunto muito pequeno de produtores de arroz, liderados por um gaúcho que está lá há 20 anos, e que se insurgiu de armas na mão contra todas as regras do Estado democrático de direito. Explodiram bombas, fizeram assaltos à aldeia Surumu, agrediram, deixaram um carro bomba, que não explodiu, em frente à Polícia Federal durante a operação. A imprensa brasileira tratou isso como se fosse um legítimo recurso, um protesto. A ação da Polícia Federal foi interrompida por uma ação no Supremo. E, mesmo que a gente discorde da determinação do Supremo, vamos acatar. Nós argumentamos, trabalhamos, eu visitei ministros. Quando consultados sobre a visita do relator da ONU para questões indígenas [James Anaya] no período do julgamento, nós respondemos que o Brasil tem convite permanente para relatores, mas pedimos para que ele não viesse agora. Ele veio mesmo assim. Mas nós achamos que a presença do relator pode fazer o Supremo ficar tentado a demonstrar sua soberania e que não é por causa da presença de um relator que ele vai dar uma decisão favorável aos índios. Então, votos que estavam indecisos podem ser decididos sob essa influência, o que não é bom. Ele disse que se for o caso não vai comparecer ao julgamento. Quanto aos movimentos sociais, nesse caso, acho que eles acertam e erram. Condeno declaradamente o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) que tem uma posição estreita e sectária em relação ao presidente Lula. No episódio da decisão do Supremo [que suspendeu a operação da PF de retirada de não-índios do local] fizeram um editorial dizendo que a culpa era do Lula. A vontade de se opor partidariamente e politicamente suplantou o reconhecimento de que o presidente Lula determinou o cumprimento integral de uma bandeira [retirada dos arrozeiros] do Cimi, do Conselho Indigenista de Roraima (CIR). Mas nós não vamos criminalizar o Cimi, chamá-lo de ilegítimo. Apenas lamentamos.
..........
Não entendi a expressão de Vannuchi “a vontade de se opor partidariamente...”, referindo-se ao Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
O Cimi é uma entidade autônoma não-partidária que milita desde sempre pela emancipação completa dos indígenas brasileiros, inspirado nos princípios da solidariedade, dos direitos humanos e da democracia não-liberal. Não há oposição partidária, porque os indígenas não constituem partido político formal, nem o Cimi representa tal insinuação inconseqüente e despolitizada do ministro lulista.
Dias atrás, o ministro Vannuchi – por ter defendido (corretamente) o julgamento e punição aos torturadores e criminosos da ditadura civil-militar de 64-85 - teve as orelhas puxadas, em reunião ministerial no Palácio do Planalto.
Devidamente enquadrado pelo irrefreável espírito de conciliação lulista, Vannuchi agora só faz disputa com a esquerda. Este é o motivo de atacar duramente o Cimi.
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