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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?

terça-feira, 30 de setembro de 2008

É preciso fazer a disputa pelo discurso do colapso


Aqui, Lula é o culpado

Slavoj Zizek já havia chamado a atenção para isso. Começam as primeiras disputas de discurso para saber quem levou quem ao colapso.

Aqui no RS, a abelhinha operária da lúmpen-burguesia guasca (porque toda ela dependente e comendo das migalhas dos centros dinâmicos do capital) já escolheu o Judas da derrocada do capitalismo financeiro norte-americano. O Judas, claro, é Luís Inácio Lula da Silva.

Está no jornal Zero Hora de hoje, que não me deixa mentir (acima).

Como lembra Zizek, no final da década de 20, na Alemanha, um Gefreiter, ex-pintor de parede, assexuado e ressentido, escolheu os judeus como responsáveis pela crise do capitalismo alemão, pela derrota na Primeira Guerra, pela pobreza das pessoas e até pela unha encravada que cada um escondia dentro dos sapatos. Tudo eram os judeus os culpados, para o pessoal de Hitler.

Hoje, tudo é Lula – para o pessoal da RBS (me disseram há duas horas, que a Globo também está ensaiando esse discurso).

Acho interessante as manifestações de Lula, à propósito da queda do Império. Ele está fazendo a disputa. Passaremos a assistir uma guerra de discursos daqui para frente. Lula está largando na dianteira. É isso mesmo que se espera de uma liderança do Hemisfério Sul. A intuição de Lula está sendo apropriada e incisiva. Precisa continuar. Isso é uma corrida de quem tem mais fôlego. Basta apenas um pouco mais de consistência e articulação conceitual para que o presidente brasileiro possa sair mais fortalecido no plano externo, o que deve rearranjar inúmeras forças e variáveis também no plano interno.

Quando Stiglitz diz que estamos assistindo a uma “queda do muro de Berlim do liberalismo” não está fazendo retórica vazia. Em novembro de 1989, um muro caiu sobre a esquerda, mesma a que não estava no poder. Em setembro de 2008, cai a muralha mundial do liberalismo sobre o poder do Império.

Isso não é pouca coisa.

Guerrinha fria


Proença versus Villaverde

Está boa a guerrinha fria entre as raposas felpudas, deputado Nelson Proença (PPS) e o deputado Adão Villaverde (PT).

O porta-voz do brittismo reafirma que houve sim uma reunião em Brasília, meses atrás, para tratar da possível coligação PT-PPS em Porto Alegre. Estavam presentes, ele próprio, Proença, o deputado petista Villaverde e a deputada federal Maria do Rosário (PT).

Deduz-se que Maria do Rosário era a candidatura preferencial do brittismo guasca, e que a pós-comunista Manuela foi o que sobrou para o PPS, de insignes lideranças como Busatto, Paulo Odone, e o notável ex-governador Antonio Britto, de tão triste memória.

Aliás, a candidata Manuela (PCdoB-PPS) caminha de forma acelerada e inexorável para constituir-se num raro fenômeno nestas eleições municipais: a mais nova candidatura arcaica da subpolítica brasileira ou o mais novo anacronismo da subpolítica guasca – como vocês quiserem.

Ardil editorial de ZH visa prejudicar candidata Maria


Jornal dá aula de sacanagem eleitoral

De plano, como dizem os rábulas de anel de formatura no dedo e unhas envernizadas, quero informar que nunca fui e jamais serei eleitor de Maria do Rosário, pelos motivos (objetivamente políticos) já fartamente expostos aqui neste blog de província.

Mas é de admitir que o jornal Zero Hora está ardilosamente prejudicando a candidata petista ao Paço Municipal de Porto Alegre. É mais que flagrante, gritante!

Para concordar de que há de fato um estratagema subliminar montado para minar a petista com cara de mártir de litografia católica, basta olhar a página seis do jornal da RBS, de hoje (acima).

Mais editorializado, impossível. Os caras (os auto-intitulados "jornalistas formados") dão uma aula de como depreciar uma candidatura indesejada pelos patrões imediatos (RBS) e mediatos (arco de aliança formado pelo PMDB, PCdoB, PPS, especuladores do solo urbano, investidores imobiliários, etc).

A manchete no alto da página “Executiva do PT decide hoje destino de candidatura” está grudada à fotografia do palanque petista organizado para o comício de ontem. Só que a manchete não diz respeito à disputa de Porto Alegre, mas de Gravataí, onde o candidato petista foi alijado pelo TSE. Para agravar a má-fé, é usado o substantivo feminino “candidatura” (de Maria) no lugar do substantivo masculino “candidato” (que designaria o ex-candidato Bordignon, de Gravataí).

Assim, fica parecendo que a candidata Maria está sendo questionada, de alguma forma, pelo próprio núcleo dirigente petista. Sugere - remota e subliminarmente - que a eterna “briga das correntes petistas” (que povoa o imaginário do senso comum) está colocando em xeque a candidata de Porto Alegre.

Não sei não, mas intuo que isso é caso de recurso à Justiça Eleitoral. Só que é preciso ter consciência que haverá briga com a RBS – algo que duvido que o PT vá querer encarar.

Duvido.


Massacre dos Carajás



Policiais que participaram de chacina são promovidos

O governo do Estado do Pará promoveu a cabo os soldados que participaram do massacre de Eldorado dos Carajás (fotos), em 1996. Até noventa policiais foram beneficiados por uma alteração na lei promovida pela governadora Ana Julia Carepa (PT). A informação é da Agência Chasque.

Ela permitiu que soldados também pudessem subir de cargo mesmo sendo processados, benefício que já era concedido a major e capitão. Os soldados respondem a processo pelo assassinato de 19 trabalhadores sem-terra quando bloqueavam uma rodovia em 1996, em protesto pela lentidão da reforma agrária no País.

......

Se o PT continuasse sendo o partido que uma vez foi, no mínimo, convocava a governadora Ana Julia (identificada com a corrente interna DS) para prestar esclarecimentos à Comissão de Ética da legenda. No mínimo.

Seminário debate finalidade da produção acadêmica


Pra que(m) serve o teu conhecimento?

O "Levante Popular da Juventude" e a "Muralha Rubro-Negra" realizam, hoje, terça-feira (30) o seminário "Pra que(m) serve o teu conhecimento?" na sala Pantheon do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) - Campus do Vale, em Porto Alegre.

O evento inicia às 14h e terá a participação de Eliane Moura, integrante do Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD); José Carlos Gomes dos Santos, representante do Movimento Negro; Dario Melo, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); Leonardo Leitão, dos cursinhos populares e um representante do movimento indígena.

O objetivo do seminário é debater a finalidade do conhecimento acadêmico produzido nas universidades, principalmente as públicas. Recentemente, um grafite (foto) em uma parede de um prédio da UFRGS, no Campus do Vale, vem sendo alvo de muita polêmica, de matérias em jornais e até mesmo de ação no Ministério Público. O grafite em que constava a frase "Pra que(m) serve o teu conhecimento?" foi feito pela estudante da UFRGS e integrante do “Levante da Juventude” Juliane da Costa Furno. Desde então, a estudante e os diretores da UFRGS que autorizavam o grafite vêm sofrendo pressão de estudantes contrários.

Além da produção acadêmica, o debate pretende problematizar o acesso das populações mais carentes às universidades públicas. Em 2008, foi o primeiro ano de vigência da política de reserva de cotas sociais e raciais na UFRGS, que também gerou polêmica e encontra muita resistência de setores mais conservadores da universidade e da sociedade.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Gilmar Mendes, um obcecado sebastianista


Maníaco monotemático

O presidente do STF, Gilmar Mendes, está obcecado com o papel a que se auto-destinou na história do Brasil. Trata-se de um sebastianista convicto. Uma espécie de Antonio Conselheiro togado. Quer restituir ao País o passado oligarca que se perde na fumaça do tempo, mas que ainda acusa presença residual nos criminosos do colarinho branco, objeto de tanto zelo do tucano Mendes.

Admira que ele encontre eco à sua cruzada passadista no jornal Folha de S. Paulo, o único órgão da mídia brasuca que acredita piamente que Gilmar Mendes sofreu de fato um grampo telefônico ao conversar com o senador goiano com cara de porquinho da Índia.

Coisas da vida.


VIII - Por que o Rio Grande do Sul é assim


A militarização do castilhismo

Quando se fala em militarização do castilhismo rio-grandense não deve ser confundido como algo ligado à corporação militar brasileira, recém saída da Guerra do Paraguai (1864-1870). O espírito militarista que predominava no PRR resulta da própria situação meridional de fronteiras rebeldes e instáveis, mas também da arguta visão macropolítica de Júlio de Castilhos. É esta que nos interessa.

No Segundo Reinado, o Exército foi sempre desprestigiado, as oligarquias nunca precisaram de intervenção armada, a não ser pontualmente em algumas regiões definidas, como foi o caso do Rio Grande do Sul no decênio 1835-1845, para assegurarem-se da hegemonia política. Entretanto, com a guerra no Paraguai, o Exército adquire prestígio e como que representa uma certa presença da classe média emergente no panorama institucional do Império. Tanto assim que, um dos fatores que contribuiram decisivamente para a queda da monarquia foi a chamada “questão militar”.

Othelo Rosa escreveu, talvez com algum exagero, que “a questão militar, no seu sentido político, que é o seu verdadeiro aspecto histórico, quem criou foi Júlio de Castilhos” nas folhas impressas do diário republicano A Federação.

A verdade é que a “questão militar”, de um simples incidente entre um alto oficial militar que homenageou quem protegia escravos fugidos e um Ministro civil do gabinete monárquico que o destituiu pelo gesto ousado, se transformou num processo político que precipitou não só a Abolição quanto a própria República. Castilhos alimentou a contradição entre militares e o gabinete monarquista, dando espaços diários aos fardados, já prevendo um desfecho favorável às pretensões republicanas provinciais e nacionais.

Com o advento da República, Castilhos volta-se aos temas regionais e de reconstrução do Estado em novas bases legais e institucionais. Prepara a revolucionária Constituição de 1891 e, ato contínuo, dá novos contornos ao chamado Corpo Policial do Estado do Rio Grande do Sul que, apesar de ter sido instituído em 1837 ainda não se consolidara como força pública de efetiva valia ao poder civil.

Em 1892, quando Castilhos firma-se no poder, trata de montar um dispositivo militar engenhoso: consolida o que chama de Brigada Militar estatal e forma nos municípios – cerca de setenta, então – milícias paramilitares de 300 a 500 militantes políticos do PRR. Estas unidades civis, administrativamente, chamavam-se Corpo Auxiliar, mas a população chamava-os de “provisórios”. Os intendentes (prefeitos), não raro, eram ao mesmo tempo chefes políticos locais e chefes militares. Havia plena harmonia entre os chefes militares provisórios (civis) e os comandantes militares profissionais da Brigada Militar, que atuavam sob o comando do Presidente do Estado.

A partir de 1898, o Presidente passou a ser Borges de Medeiros (foto), que havia sido preparado por Castilhos para ocupar a chefia dos republicanos no Estado. Borges, na sua preparação para o exercício do poder, fôra Chefe de Polícia, que significava a rigor controlar o serviço de informações e espionagem mantido pelo governo do PRR nos municípios, bem como os postos avançados de Montevideo, Buenos Aires e Rio de Janeiro. Tinha também a incumbência de controlar movimentos e recolher informações nos Estados de Santa Catarina, Paraná e nas vias fluviais e ferroviárias da região Sul.

Os governos castilhistas-borgistas estavam sempre aprimorando suas forças militares, tanto estatal, quanto seus corpos provisórios. Tinham permanentemente contratados instrutores de guerra da França e da Alemanha (duas escolas de guerra distintas) e renovavam seus armamentos, a ponto que, quando ocorre a Revolução de 1923, a Brigada, e mesmo os corpos provisórios, portavam armas que haviam sido lançadas na Primeira Guerra Mundial, em 1914.

O castilhismo, ao contrário dos Farroupilhas, nunca perderam uma só rebelião armada, e foram apeados do poder pelo voto, já que o cenário de classes também se modificará bastante naqueles quase quarenta anos de exercício do poder.

Mercado detecta algo nas papeleiras


Ações da Aracruz e Votorantim Celulose despencam

As papeleiras Aracruz e Votorantim Celulose e Papel tiveram suas ações altamente desvalorizadas na Bolsa de Valores de São Paulo - Bovespa. As ações da Aracruz despencaram mais de 19%. As ações da VCP caíram 9%.

Entre os motivos para a queda dos valores, está o anúncio dos prejuízos da Aracruz com a valorização do dólar e a demissão de seu diretor-financeiro. Segundo Pedro Galdi, da SLW corretora, o fato da papeleira não informar o valor do prejuízo pode significar que as perdas são muitos maiores. A informação é da Agência Chasque.

........

Como disse o bardo:

- Há algo de podre no reino da Dinamarca... ou melhor, no reino guasca das fábricas de papéis.

Mas o mercado pode ficar tranqüilo e sereno, os “jornalistas investigativos” da RBS já estão diligenciando para descobrir tudo e depois publicarão nas páginas de ZH. Doa a quem doer.

Esperemos sentados.


domingo, 28 de setembro de 2008

Os deuses


Os deuses caminham entre coisas pisoteadas, segurando

as pontas dos seus mantos com gesto de asco.

Entre gatos podres, entre larvas abertas e acordeões,

sentindo nas sandálias a umidade dos farrapos corrompidos,

os vômitos do tempo.


Em seu céu despido já não moram, lançados

fora de si por uma dor, um sonho turvo,

estão feridos de pesadelo e lama, parando

para recontar seus mortos, as nuvens ao contrário,

os cães de língua quebrada,


a espreitar invejosos o abismo

onde ratos eretos disputam chiando

pedaços de bandeiras.

Julio Cortázar

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Chefe da campanha de Fogaça é investigado


Ex-secretário de Yeda está enroladíssimo

A compra de dois imóveis de luxo levou o deputado estadual Luiz Fernando Záchia (PMDB) a ser investigado pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Rio Grande do Sul por suspeita de enriquecimento ilícito. A informação está na Folha, de hoje.

Ex-presidente da Assembléia Legislativa gaúcha e ex-chefe da Casa Civil da governadora Yeda Crusius (PSDB), Záchia é o coordenador da campanha à reeleição do prefeito de Porto Alegre, José Fogaça (PMDB).

As suspeitas recaem sobre a compra de um apartamento em Porto Alegre e de uma casa no município de Xangri-lá, balneário 130 km ao Norte da capital. Nenhum deles está registrado no nome do deputado.

Propriedades similares nos locais valem, somadas, entre R$ 1,4 milhão e R$ 1,6 milhão, segundo imobiliárias - mais do que o triplo dos bens que Záchia declarou à Justiça Eleitoral antes de concorrer à reeleição, em 2006 (R$ 438 mil).

O apartamento de Porto Alegre, onde Záchia vive atualmente, foi adquirido no ano passado, quando o deputado estava na Casa Civil, coordenando a articulação política da governadora tucana.

O imóvel tem 234 m2 e fica num bairro de classe média alta. Imóveis estão à venda no mesmo prédio por valores entre R$ 800 mil e R$ 1 milhão.

No cartório, o apartamento está em nome de Durafa Empreendimentos Imobiliários, que construiu o edifício.

Já a casa tem 222 m2 e fica no Carmel (foto), um condomínio fechado que conta com um lago particular, próximo da praia de Atlântida, uma das mais badaladas do litoral gaúcho. Záchia comprou o terreno no condomínio em 2004 e construiu a casa.

Clique na imagem para ampliá-la.

VII - Por que o Rio Grande do Sul é assim


O castilhismo e a chamada “liberdade de imprensa”

Se um dos medidores da democracia formal é de fato a liberdade de imprensa, então, Porto Alegre tinha mais democracia no final do século 19 do que na presente conjuntura.

No final do Império acontecia um vivo e candente debate democrático entre os órgãos de imprensa local, divididos entre publicações religiosas e não-religiosas, e estas subdivididas entre republicanos radicais, liberais monarquistas e liberais republicanos.

Hoje, este debate está morto. Não temos mais pluralidade nos órgãos de comunicação. Atualmente existe uma única linguagem político-ideológica. A pluralidade é apenas numérica e segundo a modalidade da mídia. De resto, temos uma mídia una e indivisível, a mídia do partido único da mercadoria. Que confunde deliberadamente (ideologicamente) cidadão com consumidor. A democracia que apregoa fica reduzida à miséria espiritual de se escolher entre um celular A, B ou C. Os consumidores são laureados “vencedores”, os não-consumidores são indexados como “perdedores”. A velha bandeira liberal-burguesa da cidadania é substituída pelo audór colorido e iluminado do consumidor unidimensional. A proclamada “liberdade de imprensa” é a liberdade embrutecida do consumidor, não do cidadão esclarecido e autônomo.

O jornal mais exaltado na propaganda republicana no Rio Grande do Sul sem dúvida foi o diário A Federação. Foi fundado praticamente junto com o Partido Republicano Rio-grandense (PRR) no início da década de 1880. Chama a atenção, pois, o relêvo que era dado pelos positivistas à questão de uma imprensa partidária atuante e combativa. Seu redator, Júlio de Castilhos, compreendia essa importância estratégica desde os tempos de estudante, quando já mantinha uma pequena publicação de divulgação e debate político. Antes disso, ainda, os estudantes Castilhos e Assis Brasil, então aliados e íntimos companheiros de ideais republicanos, haviam fundado o “Clube 20 de Setembro” com a intenção de criarem um círculo de estudos dos ideais Farroupilhas. Destes estudos coletivos resultaram dois trabalhos publicados em 1882: História popular do Rio Grande do Sul, de Alcides Lima (já uma preocupação com a categoria popular), e História da República Rio-Grandense, de Assis Brasil.

Castilhos se dedicou integralmente ao jornal A Federação, fazendo deste diário um instrumento forte de combate à monarquia. Em janeiro de 1885, ano que seria marcado por “sensacionais combates de Imprensa”, segundo um autor, chegam a Porto Alegre, o Conde D`Eu e a princesa Isabel, sua esposa. Castilhos mostra toda a convicção política e a sua “audácia irreverente em face de membros da família imperial, tanto mais grave por deflagrar num ambiente de província, em meio à aura de bajulação que envolvia o passeio propagandístico dos sucessores do trono” de Pedro 2º.

Júlio de Castilhos escreveu em A Federação: “O 1º Reinado foi a violência. O 2º é a corrupção. Que será o 3º? O 3º não constituirá mais do que uma esperança dos príncipes que atualmente nos visitam, esperança que há de ser infalivelmente malograda”.

E prossegue nas suas acertadas previsões:

“A Monarquia há de baquear. O Brasil pertence à América e a América pertence à República. O sr. Conde D`Eu , em vez de fazer tentativas contra a solução republicana, e a bem do 3º Reinado, devia ter presente sempre ao seu espírito estas palavras que o Rei Luís Felipe, seu avô, disse ao Ministro Guizot: ‘Não consolidaremos jamais a monarquia na França, e um dia virá em que meus filhos não terão pão’.

Que fecunda lição para um príncipe! Medite sobre ela o sr. Conde D`Eu. A experiência ensina!” – advertiu o jovem e corajoso militante republicano.

Menos de quatro anos depois suas palavras tornaram-se realidade e abria-se um largo caminho de conquistas para o PRR que, a rigor, permaneceria no poder até a década de 30.

A Federação não seria um diário singular na luta política do PRR, inúmeros outros jornais e publicações republicano-positivistas foram criadas nos quase setenta municípios do Rio Grande do Sul e se constituíram em instrumentos estratégicos de criação e consolidação do poder castilhista-borgista por quase quatro décadas. De outro lado, os opositores do castilhismo, do Partido Federalista, também tinham suas inúmeras publicações de propaganda política, fazendo do Rio Grande do Sul um território de intenso debate e livre manifestação pela cidadania.

Já se vê que no quesito “liberdade de imprensa” o Rio Grande do Sul hoje está muito mais atrasado que no fim do século 19. Para não falar na qualidade de sua elite dirigente.

Foto: a família imperial brasileira, Conde D'Eu, Dom Pedro 2o, Teresa Cristina e a Princesa Isabel no final do Segundo Reinado – objeto de duras críticas de Júlio de Castilhos em A Federação.

Aliança de vento em popa


Novos quadros de velhas oligarquias

Deu na Folha, hoje, coluna "Painel":

Afinidades. Indicada pela governadora Ana Júlia (PT), Mara Barbalho, irmã de Jader [foto], foi aprovada pela Assembléia Legislativa para ser conselheira do Tribunal de Contas dos Municípios do Pará.

O impensável aconteceu


A palavra não aparece na mídia dos EUA, mas é disso que se trata: nacionalização

Perante as falências ocorridas, anunciadas ou iminentes de importantes bancos de investimento, das duas maiores sociedades hipotecárias do país e da maior seguradora do mundo, o governo federal norte-americano decidiu assumir o controle direto de uma parte importante do sistema financeiro.

A medida não é inédita. O governo interveio em outras crises profundas: 1792 (no mandato do primeiro presidente do país), 1907 (o papel central na resolução da crise coube ao grande banco de então, J.P. Morgan, hoje, Morgan Stanley, também em risco), 1929 (a Grande Depressão: em 1933, mil norte-americanos por dia perdiam suas casas para os bancos) e 1985 (crise das associações de poupança e empréstimo). O que é novo na intervenção em curso é sua magnitude e o fato de ela ocorrer ao fim de 30 anos de evangelização neoliberal conduzida com mão-de-ferro em nível global pelos EUA e pelas instituições financeiras por eles controladas, FMI e Banco Mundial: mercados livres e, porque livres, eficientes; privatizações; desregulamentação; Estado fora da economia, porque inerentemente corrupto e ineficiente; eliminação de restrições à acumulação de riqueza e à correspondente produção de miséria social.

Foi com essas receitas que se "resolveram" as crises financeiras da América Latina e da Ásia e que se impuseram ajustamentos estruturais em dezenas de países. Foi também com elas que milhões de pessoas foram lançadas no desemprego, perderam as suas terras ou os seus direitos laborais, tiveram de emigrar.

À luz disso, o impensável aconteceu: o Estado deixou de ser o problema para voltar a ser a solução; cada país tem o direito de fazer prevalecer o que entende ser o interesse nacional contra os ditames da globalização; o mercado não é, por si, racional e eficiente, apenas sabe racionalizar a sua irracionalidade e ineficiência enquanto estas não atingem o nível de autodestruição.

Esta não é a crise final do capitalismo e, mesmo se fosse, talvez a esquerda não soubesse o que fazer dela, tão generalizada foi a sua conversão ao evangelho neoliberal. Muito continuará como dantes: o espírito individualista, egoísta e anti-social que anima o capitalismo; o fato de que a fatura das crises é sempre paga por quem nada contribuiu para elas, a esmagadora maioria dos cidadãos.

Mas muito mais mudará.

Primeiro, o declínio dos EUA como potência mundial atinge novo patamar. O país acaba de ser vítima das armas de destruição financeira maciça com que agrediu tantos países nas últimas décadas e a decisão "soberana" de se defender foi afinal induzida pela pressão dos seus credores estrangeiros (sobretudo chineses) que ameaçaram com uma fuga que seria devastadora para o atual "american way of life".

Segundo, FMI e Banco Mundial deixaram de ter autoridade para impor suas receitas, pois sempre usaram como bitola uma economia que se revela fantasma. Daqui em diante, a primazia do interesse nacional pode ditar, por exemplo, taxas de juro subsidiadas para apoiar indústrias em perigo (como as que o Congresso dos EUA acaba de aprovar para o setor automotivo).

Não estamos ante uma desglobalização, mas estamos certamente ante uma nova globalização pós-neoliberal internamente muito mais diversificada. Emergem novos regionalismos, já presentes na África e na Ásia, mas sobretudo importantes na América Latina, como o agora consolidado com a criação da União das Nações Sul-Americanas e do Banco do Sul.

Terceiro, as políticas de privatização da segurança social ficam desacreditadas: é eticamente monstruoso acumular lucros fabulosos com o dinheiro de milhões de trabalhadores humildes e abandonar estes à sua sorte quando a especulação dá errado.

Quarto, o Estado que regressa como solução é o mesmo que foi moral e institucionalmente destruído pelo neoliberalismo, o qual tudo fez para que sua profecia se cumprisse: transformar o Estado num antro de corrupção. Isso significa que, se o Estado não for profundamente reformado e democratizado, em breve será, agora, sim, um problema sem solução.

Quinto, as mudanças na globalização hegemônica vão provocar mudanças na globalização dos movimentos sociais e vão certamente refletir-se no Fórum Social Mundial: a nova centralidade das lutas nacionais e regionais; as relações com Estados e partidos progressistas e as lutas pela refundação democrática do Estado; as contradições entre classes nacionais e transnacionais e as políticas de alianças.

Artigo do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal). Publicado hoje na Folha.

Estréia hoje cinebiografia de Celso Furtado


O longo amanhecer

"O longo amanhecer - Uma biografia de Celso Furtado", vencedor de uma menção honrosa no festival de documentários “É Tudo Verdade” de 2007, traça um perfil aprofundado do economista paraibano, morto em 2004, aos 84 anos. O filme de José Mariani estréia hoje em Porto Alegre.

Bacharel em Direito, ele tornou-se doutor em Economia pela Sorbonne e esteve por trás de inúmeras idéias e projetos para o desenvolvimento do Brasil, especialmente a partir dos anos 1950.

Celso Furtado foi o mentor de planos de desenvolvimento regional, como a Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), sendo seu primeiro dirigente, em 1959. Nesse mesmo ano, publicou o livro "Formação Econômica do Brasil", até hoje considerado uma obra essencial para a compreensão do País.

Atuando em órgãos governamentais, foi presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento, BNDES, sob o governo Juscelino Kubitschek, tornando-se ministro pela primeira vez já na gestão de João Goulart, quando ocupou a pasta do Planejamento.

Depois do golpe de 1964, Furtado foi cassado por dez anos, exilando-se primeiro no Chile, depois viajando pela Europa e os Estados Unidos, onde se tornou pesquisador na prestigiada Universidade de Yale.

Contando com rico material de arquivo, o filme reconstitui a época de atuação de Furtado, que voltou ao Brasil em 1981, tornando-se novamente ministro, desta vez da Cultura, no governo José Sarney.

A espinha dorsal deste documentário está numa longa entrevista feita com o economista em 2004, cinco meses antes de sua morte.

Apesar da voz vacilante, Furtado mostra-se perfeitamente lúcido, discorrendo sobre seus temas da vida inteira, especialmente a necessidade do Brasil superar as desigualdades sociais em sua rota de desenvolvimento.

A avaliação da obra do economista é realizada através de entrevistas com intelectuais como Francisco de Oliveira, João Manuel Cardoso de Mello, Antônio Barros de Castro, Hélio Jaguaribe e outros.

As participações mais apaixonadas vêm da economista Maria da Conceição Tavares, que enfatiza a importância do legado de seu mestre, a quem chama carinhosamente de "Velho". O documentário tem 73 minutos de projeção.

Com informações do saite Cineweb.

Foto: Oscar Niemayer, Celso Furtado e Darcy Ribeiro.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

ZH faz jornalismo autista



Barriga ideológica da RBS

Sem comentários.

Navalha de Occam


Os recebíveis da Vila Carrapato

Recebi este e-mail, hoje:

O seu Biu tem um bar na Vila Carrapato, e decide que vai vender pinga “na caderneta” aos seus leais fregueses, todos bebuns, quase todos desempregados.

Porque decide vender a crédito, ele pode aumentar um pouquinho o preço da dose da branquinha (a diferença é o sobrepreço que os pinguços pagam pelo crédito).

O gerente do banco do seu Biu, um ousado administrador formado em curso de Emibiêi, decide que as cadernetas das dívidas do bar constituem, afinal, um ativo recebível, e começa a adiantar dinheiro ao estabelecimento, tendo o pindura dos pinguços como garantia.

Uns seis zécutivos de bancos, mais adiante, lastreiam os tais recebíveis do banco, e os transformam em CDB, CDO, CCD, UTI, PQP, OVNI, SOS ou qualquer outro acrônimo financeiro que ninguém sabe exatamente o que quer dizer.

Esses adicionais instrumentos financeiros, alavancam o mercado de capitais e conduzem a operações estruturadas de derivativos, na BM&F, cujo lastro inicial todo mundo desconhece (as tais cadernetas do seu Biu).

Esses derivativos estão sendo negociados como se fossem títulos sérios, com fortes garantias reais, nos mercados de 73 países.

Até que alguém descobre que os bebuns da Vila Carrapato não têm dinheiro para pagar as contas, e o bar do seu Biu vai à falência.

E toda a cadeia sifu.

VI - Por que o Rio Grande do Sul é assim


A revolução vinda de cima

“Revolução vinda de cima” é uma expressão leninista que procurou identificar o caráter da revolução burguesa na Alemanha de Bismark. No Rio Grande, os positivistas também fizeram uma revolução por cima. Embora o processo sulino não tenha tido o caráter reacionário como o apontado por Lênin, na Alemanha.

Veja então que temos três modelos distintos de revolução burguesa: o modelo francês de 1789, uma revolução total, arquetípica, democrática e modernizadora em toda a sua expressão; o modelo alemão, reacionário (os de cima contra os debaixo), autocrático, e que operou a chamada modernização conservadora; e o modelo sul-rio-grandense de 1893 (não confundir com a guerra civil Farroupilha de 1835, que nunca foi uma revolução stricto sensu), autoritário, modernizador e progressista – mas sempre burguês.

A Constituição positivista pode ser classificada como de “tipo ideal”, que funda e orienta de fato e de direito uma nova ordem política e social. Ela “deu nascimento a um regime político único, tanto no Brasil, como no mundo”, como observa Targa. Assim, a transição capitalista na região meridional brasileira foi acelereda pelo episódio militar de grande violência política que praticamente esmagou os representantes do Estado patrimonial, eliminando as aspirações da fração de classe mais atrasada de capturar o Estado para torná-lo comitê dos negócios pouco dinâmicos e macroeconomicamente subordinados da oligarquia estancieira e pastoril.

Se os maragatos federalistas-gasparistas, orientados pelo líder bageense Gaspar da Silveira Martins (“idéias não são metais que se fundem”, e muito ligado a Pedro 2º), tivessem vencido a revolução de 1893-95, o professor Maestri teme que o Rio Grande se transformasse caricaturalmente “numa grande Bagé”.

Pode-se imaginar o cenário desolador, retrato guasca do “quinto círculo do Inferno”:

- grandes latifúndios despovoados e decadentes,

- economia subordinada e sem dinamismo,

- regime pastoril de baixíssima produtividade,

- agricultura estagnada,

- indústria inexistente,

- contrabando crescente,

- aparelho de Estado impotente e desautorizado,

- contas públicas deficitárias,

- confusão promíscua entre público e privado,

- assembléia de representantes loteando o território em zonas de interesse particularista,

- populações errantes perambulando em busca de trabalho e renda que jamais encontrariam,

- infra-estrutura ineficiente ou inexistente,

- isolamento e heteronomia do Estado,

- miséria generalizada,

- riqueza escassa e concentrada,

- possíveis invasões estrangeiras pela fronteira,

- aglomerações urbanas como viveiros privilegiados de doenças e epidemias,

- educação pública zero,

- territórios inteiros tomados por bandoleiros armados,

- bandidagem social,

- anomia social e política,

- guerra civil prolongada,

- razias, saques e prática corrente de aniquilamento de comunidades inteiras, extermínio étnico,

- intervenção federal militar e civil, etc.

Ilustrações de Goya (1806), mostrando selvagerias que coincidentemente ele chamou de "Série Maragato".

La Maragatería foi a região da Espanha de ondem migraram os futuros povoadores
de parte do território uruguaio, daí a denominação dos maragatos federalistas rio-grandenses - muitos deles recrutados na Banda Oriental do Uruguay.

Cobiça pelo pré-sal cria candidatura risível


Os pântanos no caminho da ministra

As minhas reservas de ceticismo com a candidatura da ministra Rousseff à sucessão de Lula em 2010 se renovam quando sou informado de fatos como esse que passo a relatar.

O presidente da Petrobras, fulano de tal Gabrieli (esq.), quer ser presidente da República, na sucessão do presidente Lula. [Prenda a gargalhada, por enquanto, caro leitor, prezadíssima leitora.] Isto é um fato, sobre o qual não cabe discussão. Por inútil, cansativa e elencada no vastíssimo repertório da vaidade humana, portanto, alheio ao campo objetivo da política.

Este senhor, vaidoso e baiano, articula seu projeto pessoal na carona das reservas submarinas do pré-sal. Ele e seu grupo avaliam que o óleo fóssil será o combustível da sua gloriosa ascensão para Brasília.

Dias atrás, o assessor do presidente Gabrieli, Vivaldo Barbosa, ex-parlamentar do PDT-RJ, lançou um factóide ao ministro Carlos Lupi (PDT-RJ) que o repassou à imprensa, no último final de semana. A notícia usinada no gabinete do presidente da Petrobras dava conta que o governo faria uma capitalização da estatal de energia com recursos do FGTS. Lula imediatamente reagiu desmentindo o seu próprio ministro do Trabalho, ora instrumentalizado por Gabrieli.

A manobra gabrielista visava fortalecê-lo na corrida por 2010, ele que surfa na onda de euforia do pré-sal, mas ao mesmo tempo se mostra indiferente às discussões sérias sobre os destinos da riqueza submarina brasileira.

Tanto assim, que Gabrieli se filia a uma corrente que quer dar tratamento meramente fiscalista ao tema do pré-sal. Isso significa dizer que o presidente da Petrobras está aliado àqueles, como os senadores governistas Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo Lula no Senado, e Francisco Dornelles (PP-RJ), que alegam não importar quem fará a apropriação da riqueza do pré-sal, desde que os seus lucros sejam gravados com pesadas taxações e impostos que por sua vez se destinariam à educação, saúde e demais áreas de resgate da dívida social brasileira.

A proposta meramente fiscalista atende aos interesses das grandes empresas transnacionais de energia, uma vez que, a prevalecer essa posição que trai o interesse nacional, tais companhias privadas estrangeiras poderão explorar as megabacias de Tupi e Iara em situação de igualdade, seja com a Petrobras, seja com outra empresa estatal que porventura possa ser criada pelo governo Lula para a exploração daquele óleo.

Já se vê, que a ministra-candidata tem muitos pântanos para transitar e vencer – dentro do próprio arranjo instável de governo – até se consolidar como a sucessora preferencial (e indiscutível) do lulismo de resultados à corrida de 2010.

Monocultura não é floresta


Ambientalistas pedem à FAO mudança de critérios

O Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais pediu ao órgão das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, a FAO, que altere seus critérios e não considere monoculturas extensivas de árvores como florestas. A medida inclui pínus e eucaliptos.

O pedido é assinado por mais de cem profissionais de 29 países. Os ambientalistas afirmam que a implantação destas imensas monoculturas têm destruído as verdadeiras florestas, degradando o solo, consumindo água e eliminando a biodiversidade das espécies. Floresta é sinônimo de biodiversidade e equilíbrio, e as plantações artificiais de árvores estão longe de serem consideradas como um ambiente florestal natural. A informação é da Agência Chasque.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Titanic


Daniel Paz

V - Por que o Rio Grande do Sul é assim


Uma Constituição revolucionária e republicana

Júlio de Castilhos (imagem) e seus companheiros da vanguarda comtista intuiram que o Rio Grande do Sul estava pronto para se modernizar, mas que essa necessidade histórica não se realizaria por si só.

O “espírito revolucionário” exige ações revolucionárias estratégicas materializadas em instrumentos institucionais-constitucionais decisivos.

Neste sentido, em primeiro lugar, era preciso um marco jurídico-constitucional para a nova ordem, em segundo, era preciso uma imprensa partidária combativa, e terceiro, uma força militar estatal auxiliada por corpos provisórios politizados e treinados militarmente, a partir de militantes locais do PRR, com capilaridade em todo o território sulino e mesmo no Exterior (o PRR mantinha agentes de análise política e inteligência em Montevideo, Buenos Aires e Rio).

A Constituição castilhista de 1891 é um marco legal singular. Trata-se de uma peça jurídica que garante um governo autoritário, cerebralmente autoritário, uma vez que não previa a divisão dos três poderes, segundo o modelo liberal clássico, atribuindo ao Presidente (hoje, governador) o direito de legislar e editar decretos que se referenciavam diretamente na Constituição e não em leis ordinárias escritas por uma Assembléia de Representantes.

A Constituição sul-rio-grandense e a prática político-administrativa do castilhismo por quase 40 anos, garantiram ao Estado funcionar praticamente como uma República autônoma do resto da Federação brasileira. Desta forma, o PRR cumpria agora o ideário Farroupilha de 1836, quando da decretação da malograda República Rio-grandense em Piratini.

Como assinala muito bem Luiz Roberto Targa, “essa constituição inédita e original não se baseou na dos Estados Unidos da América, como foi o caso das outras constituições brasileiras, tanto a da União, quanto a dos Estados”.

Os positivistas tiveram uma administração marcadamente anti-oligárquica e anti-patrimonialista, com ações políticas, segundo Targa, que mostravam concretamente uma ruptura com a ordem latifundiária, tais como: transparência das contas públicas, coincidência entre o orçamento previsto e o realizado, política de proteção ao consumo das classe baixas (pelo contigenciamento de bens de primeira necessidade passíveis de serem exportados), pela estatização não-patrimonialista de dois dos mais importantes portos sulinos (Porto Alegre e Rio Grande) e de toda a rede férrea do Estado (de uma empresa francesa, mas explorada por norte-americanos), a realização de obras essenciais em infra-estrutura somente nas zonas minifundiárias e coloniais, tendo-se negado a privilegiar áreas de interesse da pecuária de exportação, bem como políticas de proteção fiscal e tarifária à indústria nascente das regiões de imigração européia.

Outro marco importante da gestão castilhista do Estado foi a reforma fiscal, cujo ponto central foi a substituição do imposto de exportação (quase sempre sonegado) pelo imposto territorial. Para tanto, era fundamental discriminar a esfera pública da esfera privada. Na prática, tratava-se de impor medidas efetivas de o Governo retomar as terras públicas ilegalmente apropriadas pela oligarquia rural nas últimas décadas do Império. Retomadas as terras, no período compreendido entre 1895-1906, legitimado pela vitória na guerra civil e com força militar suficiente para garantir o cumprimento da lei e da ordem pública, o Governo castilhista entregou lotes rurais a posseiros, a companhias de loteamento e a novos pequenos proprietários.

Essas medidas cada vez mais afirmavam a consolidação do Estado burguês moderno, qual seja a de tornar autônoma a esfera estatal da esfera privada das oligarquias rurais tradicionais e atrasadas.

No Rio Grande do Sul isso foi conquistado a ferro, fogo e vontade revolucionária organizada e materializada em instrumentos concretos de mudança social.

Amanhã, a parte VI: “A revolução vinda de cima”

Consumo é um dos flagelos da atualidade


Crianças ficam reféns precocemente da publicidade e do marketing

A publicidade e o marketing para as crianças, atualmente, estão entre os principais fatores que levam a distúrbios alimentares - como a obesidade e a anorexia -, à sexualização precoce, a comportamentos agressivos e a problemas familiares. O alerta é da professora e pesquisadora de Harvard, a norte-americana Susan Linn, que está no Brasil para o 2º Fórum Internacional Criança e Consumo - que termina amanhã. A informação é da Folha, de hoje.

"Hoje, elas [as crianças] são bombardeadas por uma série de estímulos para que consumam cada vez mais", afirma. De acordo com a pesquisadora de Harvard, em 1983, o gasto com publicidade voltada para crianças nos Estados Unidos era de US$ 100 milhões por ano. Atualmente, afirma Linn, esses valores chegam a US$ 17 bilhões por ano.

“Hoje em dia, - diz a pesquisadora norte-americana – qualquer pessoa precisa estar preocupada com a saúde do planeta e com o aquecimento global. Quem tem esse tipo de preocupação tem que estar atento ao consumo, porque é ele que tem que mudar. Isso está muito claro. Os hábitos começam com a criança e hoje em dia elas são bombardeadas por uma série de estímulos para que consumam cada vez mais” – completa Susan Linn.


O sétimo selo


Angeli, baseado na clássica cena do filme “O sétimo selo” (1957), de Ingmar Bergman. Essa história se passa no século 13 e trata do fervor religioso, que tortura, caça bruxas e ímpios, alimentando a Morte através das fraquezas humanas. O culto ao capitalismo é também uma forma de religião pagã, onde a divindade é o dinheiro.


Pescaria miúda


Agora, vai

Deu no Correio do Povo, de hoje:

Ministro da Pesca, Altemir Gregolin, desembarca hoje em Porto Alegre para apoiar a candidatura da petista Maria do Rosário.


terça-feira, 23 de setembro de 2008

Corrida eleitoral em Porto Alegre


Coligação imobiliária já venceu a eleição

A corrida eleitoral em Porto Alegre está irremediavelmente pautada pelos especuladores do solo urbano (o nome da Natureza na formalidade civil do governo local). Com o agravante de que uma grande empresa de comunicação de massas tem igualmente um braço operacional na indústria da construção civil e na incorporação seriada de business imobiliários, formando um amplo arco de interesses que necessitam do poder público local para a realização de seus capitais.

Neste sentido, antes mesmo de corrida a carreira – que deve ocorrer em 5 de outubro, em primeiro turno – a coligação de interesses imobiliários já tem os seus objetivos praticamente contemplados.

Na prática, como isso aconteceu? Do desdobramento de dois êxitos líquidos, já registrados:

1) O completo banimento da política dos temas eleitorais. Os problemas urbanos são reduzidos a dificuldades de natureza gerencial, operacional ou metodológica – menos política. A discussão política significaria a indeterminação e o descontrole da pauta por parte da coligação imobiliária que galvanizou (de forma invisível) o processo eleitoral. Todos os candidatos (as) majoritários acatam essa determinação tácita.

2) Duas candidaturas preferenciais da coligação imobiliária – Fogaça e Manuela (foto) – disparam na feira de apostas, garantindo com grande antecipação um resultado favorável ao projeto dos especuladores associados.

A conjuntura macroeconômica exige que os militantes do urbanismo de resultados sejam vitoriosos neste pleito em Porto Alegre. Por dois motivos:

1) Depois de quase três décadas estagnada, a indústria da construção civil no País dá um salto de crescimento extraordinário, exigindo agressividade no mercado, relações amigáveis no setor público local, e novas formas de apropriação privada dos bens públicos.

2) A Copa Mundial de Futebol de 2014 projeta novas oportunidades de negócios para os quais é exigido igualmente administração local pró-ativa e propósitos convergentes.

Mas existem dois complicadores que certamente preocupam os vitoriosos por antecipação: a criminalidade do bas-fond organizada em torno do comércio de drogas e o domínio de territórios móveis na periferia da cidade, bem como, as comunidades cidadãs subtraídas e sonegadas de direitos pela inação e negligência do poder público local.

Analisando rapidamente a retórica televisiva dos candidatos Fogaça (PMDB-PDT-PTB) e Manuela (PCdoB-PPS do ex-governador Britto), verificam-se acentuadas convergências de propósitos, quase constrangedoras.

Ambos, porta-vozes e intérpretes burocrático-administrativos da coligação imobiliária, propugnam – sem ousar dizê-lo – por uma cidade-empresa que se constitua num território privilegiado de formas de gestão, eliminando o antigo (porém atual) conceito de cidade como suporte de identidades políticas.

Ambos – Fogaça e Manuela – propugnam claramente pela aceleração do processo de encolhimento dos espaços públicos na cidade, em favor de espaços censitários. Uma perfeita tradução disso é o Projeto Pontal do Estaleiro, na área do extinto Estaleiro Só, para citar exemplo único. A área será híbrida: nominalmente, continuará sendo uma área pública, com vias de acesso, equipamento urbano público instalado, circulação consentida, mas o privilégio de apropriação do landscape é privado, segundo as regras não escritas do poder aquisitivo, renda, etc. Portanto, censitário.

A estratégia dos espaços censitários não-públicos deve ser prática usual da coligação imobiliária, em toda a extensão da cidade, nos próximos anos.

Ambos – Fogaça e Manuela – adotam o discurso dos empreendedores da construção civil urbana que, se repetidos acriticamente (como o são), resultam em mais e profundas diferenças sociais e econômicas na cidade, porque hierarquizam e estratificam concretamente o perfil urbano.

No momento em que Porto Alegre se prepara para grandes transformações na superfície de seu território urbano, haja vista o já referido boom da construção civil brasileira, e se mantidas as atuais correlações sociais de profunda desigualdade, isso irá significar uma super-transferência de riqueza e oportunidades econômicas, das comunidades cidadãs em geral para os grupos especuladores e rentistas, sejam daqui, sejam d'alhures.

Coisas da vida.


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