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sexta-feira, 18 de maio de 2012

A tortura já foi política de Estado, saibam disso


Eu diria que está boa a entrevista do ex-preso político, ex-deputado Carlos Franklin Paixão Araújo (ex-companheiro de Dilma Rousseff) concedida, ontem, à rádio Gaúcha (grupo RBS), de Porto Alegre.

Não classifico de ótima pelo seguinte motivo: Araújo fala em tortura, em torturador, como se fosse uma relação bilateral e episódica entre o preso político e o policial ou o militar. Não foi. A tortura foi uma política de Estado no Brasil, durante a ditadura civil-militar de 1964/85. (É necessário sempre, à exaustão, repetir acerca do caráter igualmente civil da ditadura, que abrange apoio de ampla base social, intelectuais, parcela da Igreja, a totalidade da imprensa, empresários da indústria, proprietários rurais, sindicatos patronais, bancos, etc.)

Agentes públicos - policiais civis e militares das três armas, Marinha, Exército e Aeronautica - cometeram crimes em nome do Estado, muitas vezes portando o uniforme da sua arma, ou o crachá da sua repartição policial.

A forma como Araújo fala, fica parecendo para os mais jovens (ou mais alienados) que havia sujeitos tresloucados que insistiam - de vontade própria - em arrancar confissões (ou ficções) na base do sofrimento do preso político.

Ora, isso é tudo o que não ocorria, pela simples vontade própria e unipessoal de indivíduos de caráter deformado. Havia, sim, um sistema público e estatal de segurança e repressão lastreado em método, organização, hierarquia e disciplina. Portanto, havia uma racionalidade de Estado, por trás e à frente deste espetáculo de horror e miséria humana. Tanto havia, que continua havendo. A própria Lei da Anistia emana deste sistema, e foi editada (unilateralmente) visando assegurar impunidade permanente aos operadores do terror oficial.

As corporações policiais e militares até hoje não conseguem fazer a catarse do horror que promoveram, enquanto instituições estatais.

Por que o Exército, por exemplo, não emite um documento oficial onde possa esclarecer que repudia essa prática que atenta contra os direitos humanos e condena - ainda que na palavra - os ex-agentes que foram artífices do terrorismo de Estado?

Mais: por que as Forças Armadas não auxiliam a Comissão da Verdade?

Sabem por que essas duas perguntas são ingênuas? Porque suas respostas são muito óbvias. Não é a cidadania que compete respondê-las, mas a anticidadania - que ainda está muito viva e presente em nosso meio social.

5 comentários:

Maria Lucia disse...

Oi, Cristóvão,
acho que o Araújo teve pouco tempo para falar. Escuta a entrevista que ele deu para a Band há duas semanas (a RBS não poderia ficar atrás...).
parte 1:http://www.youtube.com/watch?v=r4AXkzwocnA
parte 2:http://www.youtube.com/watch?v=y2ITV5F5ktI
Abraço

Nelson disse...

E eu digo mais, Feil.
É preciso que informemos aos "mais jovens (ou mais alienados)" que muito, se não tudo, deste "sistema público e estatal de segurança e repressão baseada em método, organização, hierarquia e disciplina" é um legado que devemos à tão decantada democracia estadunidense. É preciso que os informemos sobre a existência da Escola das Américas que treinou muitos dos torturadores que vieram desgraçar as vidas de muitas famílias latinoamericanas.

Anônimo disse...

Hannah Arendt,filósofa política alemã de origem judaica, uma das mais influentes do século XX, proferiu que os nazista alemães fizeram foi: que seja EFICAZ, essas pessoas que trabalharam na matança/tortura não eram sanguinarios e fascinoras, mas sim pessoas normais que chegavam em casa beijavam a esposa e crianças, se fosse hoje estariam assistindo a novela horario nobre.

Anônimo disse...

O lado civil da ditadura e o apoio dos EUA vao provavelmente ficar de fora da comissao da verdade? Espero que nao.
Marcelo

Anônimo disse...

Sempre digo isso Nelson. Mas esse é um tema em que não se toca. É uma clá
usula pétrea, inclusive para a esquerda. Jamais se cosegurá entender a natureza dessa ditadura enquanto se continuar omitindo o papel central dos EUA nessa barbárie.

Eugênio

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