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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
Os idiotas e as baratas são imbatíveis
Sobreviverão ao próprio planeta
Há um visível recrudescimento na idiotização das pessoas. A mídia é a principal usina de produção em série de idiotas e tolos de todos os calibres. O nivelamento por baixo e o achatamento geral do imaginário médio é a principal contribuição dos modernos meios de comunicação de massas. Hoje, é muito fácil encontrar o que eu chamo de idiota triunfante, aqueles sujeitos que se orgulham da própria ignorância e pobreza de espírito. O tolinho jactancioso tira prazer onanista da sua condição, e se basta.
O espírito de nossa época - o Zeitgeist, como diz apropriadamente o alemão - flutua numa emulsão formada por dois elementos: a ciência (as tecnologias) e a idiotice. Os idiotas de nosso tempo se projetam nos gadgets que encontram pelo caminho. Observem: todo o tolo que se preza porta pelo menos um artefato mecânico ou eletrônico. Não vive sem essas muletas. É a sua forma de se referenciar com o mundo, de comunicar a sua estupidez relativa ("afinal, estou conectado ao futuro!").
Mas o fenômeno não é original. Gustave Flaubert, o corrosivo crítico da burguesia, ainda no século 19 já havia detectado o fenômeno da tolice social. Para tanto, começou a colecionar os ditos correntes do senso comum e reuniu-os no famoso Dictionnaire des idées reçues ("Dicionário das ideias feitas", numa tradução livre). O escritor francês comentou - e publicou nesta pequena obra de pouco mais de cem páginas - todas as bobagens ditas pelas pessoas que queriam parecer inteligentes e atualizadas. Aliás, Flaubert seria o descobridor da tolice. Quem garante é Milan Kundera, para quem a tolice é a maior descoberta de um século - o 19 - tão orgulhoso de sua razão científica. Antes de Flaubert não se duvidava da existência da tolice, embora esta fosse compreendida de um modo diferente. A tolice era considerada como uma simples falha do conhecimento, um vazio provisório, passível de ser preenchido pela instrução. Mas Flaubert insiste, e praticamente sustenta a sua obra baseada no tema da tolice e da idiotia. Ema Bovary é uma tola que aspirava ser amada por todos os homens. Bouvard e Pécuchet são dois pequenos idiotas que aspiram conhecimentos enciclopédicos acerca de tudo. Leio agora na Wikipédia que Barthes considerou "Bouvard e Pécuchet" como "uma obra de vanguarda". A considerar a idiotia galopante de nossos dias, pode ser.
Kundera brinca afirmando que "a descoberta flaubertiana é mais importante para o futuro da humanidade que as ideias mais perturbadoras de Marx ou de Freud". Pois podemos imaginar o futuro do mundo - prossegue Kundera - sem a luta de classes ou sem a psicanálise, mas não a invasão irresistível das ideias feitas, estandardizadas, pasteurizadas, que, "inscritas nos computadores, propagadas pela mídia, ameaçam tornar-se em breve uma força que esmagará todo o pensamento original e individual e sufocará assim a própria essência da cultura européia dos Tempos Modernos".
O mais chocante - constatado pelos geniais romances de Flaubert - é que a tolice não se apaga diante da ciência, das altas tecnologias, da pósmodernidade (seja lá o que isso signifique). Milan Kundera ousa afirmar que "ao contrário, com o progresso, ela também progride!"
Arrisco a dizer que os bobalhões e as baratas sobreviverão ao próprio planeta.
"Coisas da vida" - como diria Kurt Vonnegut, outro escritor especialista em tolos e idiotas.
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10 comentários:
Impagável, me senti tolo, mas estou avisado pelo menos, eh eh eh.
Botei fora meu celular piratão eh eh eh
Um dos textos mais conservadores que já li na vida.
No que concerne "aqueles sujeitos que se orgulham da própria ignorância e pobreza de espírito", o penalista argentino Eugênio Raul Zaffaroni refere que a altivez referida seria fruto do estipulado senso "cool" de relacionamento social, onde anomia que caracteriza a sociedade atual teria vínculo direto com a expansão globalizada do modelo de grande mídia estadunidense. Aliás, e o que eu considero interessante, qual seria o adjetivo mais fiel para traduzir "cool"? Acredito que "cool", bem como explicou o penalista, tenha maior ligação com a palavra indiferença do que com qualquer outro adjetivo que destaque alguma característica meritosa, como as traduções brasileiras costumam vincular.
Abraço.
Todas nossas belas idéias são variações ou recombinações das idiotices médias.
O Homer é indestrutível porque a média sempre existe.
Achar que por ter alguns momentos inspirados o cara se salienta muito acima da média é falta de noção acerca da largura do desvio padrão ou confusão acerca do benefício do treino, que a especialização dá sobre o leigo em algumas áreas.
Essa média é como se fosse a sopa básica nutritiva, a matriz originadora de onde viemos.
Temos de ao menos ser tolerantes com a matriz média e se possível entender porque ela é assim.
Nada ocorre de graça.
O Cristovão se chateia com a média por que não a respeita, não a estuda, não a entende, e hoje ele está contrariado.
Concordo. Tenho um amigo que vive repetindo (nao sei se a frase eh dele) que "se os idiotas voassem, nunca mais veriamos a luz do sol".
Caro Feil,
Outro dia, um comentarista nosso deixou a seguinte observação, baseada, provavelmente, em Nelson Rodrigues: " O grande drama dos dias de hoje é que os idiotas estão perdendo a modéstia".
"Arrisco a dizer que os bobalhões e as baratas sobreviverão ao próprio planeta."
Uma máxima do meu pai, hoje já nonagenário, homem pouco letrado - cursou apenas os primeiros anos do que era chamado de curso primário -, mas que tem as suas "pegadas": "bobos eram dois, morreram três e ainda ficou todo este monte de bobos no mundo".
Gustave Flaubert foi um grande escritor... Escritor.
Repito novamente, Gustave Flaubert foi um ESCRITOR. Curiosamente, o texto trata Gustave Flaubert como o FILÓSOFO de seu tempo (do nosso tempo).
Sempre existiu e sempre existirá uma diferença entre o ESCRITOR e o FILÓSOFO. Enquanto o último procura a verdade e investiga como pode alguma coisa ser conhecida, o primeiro quer apenas e tão somente provocar uma reação no leitor.
Para o filósofo escrever é apenas um meio de comunicar suas indagações. Para o escritor escrever é sua atividade fim. A estética para o filósofo é a investigação do belo. Para o escritor a filosofia é apenas um material estético. Portanto, nada pode ser mais estranho do que tratar literatura como filosofia. Isto equivale a tomar a nuvem por Juno.
Se lesse o texto, provavelmente Gustave Flaubert esboçaria uma ponta de riso irônico e diria:
- OOOOOOOOOOhhhhhhh Eu sou escritor e faço filosofia? Ce charmant.
Em nenhuma parte do texto o autor afirma que Flaubert era filósofo.
Fábio sobreviverá.
Falando em idiota o que o articulista achou da fala do Lula na qual classifica a Dilma de "bichinha palanqueira"?
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