Você está entrando no Diário Gauche, um blog com as janelas abertas para o mar de incertezas do século 21.
Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?
terça-feira, 26 de janeiro de 2010
Nossos computadores trazem sangue coagulado
Você compra e usa o coltan?
Um grande problema dos primeiros cérebros eletrônicos foi o aquecimento dos circuitos. As velhas trapizongas precisavam funcionar em ambientes assépticos e refrigerados. Um dos motivos de serem tão volumosos e lentos, entre outros. O problema foi resolvido pela ciência. Os computadores ficaram menores, mais leves e mais velozes. A solução veio do emprego de um metal raro chamado coltan (fusão dos minerais raros columbita e tantalita), um eficiente condutor, capaz de resistir a temperaturas elevadas e que se resfria rapidamente com o uso de pequenos coolers embutidos em desktops e laptops. Hoje, o coltan está presente nos telefones celulares, notebooks, naves orbitais, estações espaciais, mísseis e demais armamentos modernos, bem como nos consoles de games infantojuvenis. É conhecido como o ouro azul, já que seus minerais valem cerca de 300 dólares/quilo in natura.
Mas se a ciência resolveu o impasse tecnológico da informática em geral, o mesmo não aconteceu com as decorrências morais e legais da extração, fabricação e uso do coltan. A valiosa substância está envolvida numa nuvem de crimes: assassinatos, golpes de Estado, máfias internacionais, limpeza étnica, guerras tribais, etc.
Quem diria que o nosso inocente computador caseiro traz sangue coagulado na sua composição ou que o PlayStation 3 das crianças participou de massacres de pequenos órfãos antes de morar na sua casa?
As reservas mundiais dos minerais que formam o coltan - cerca de 80% delas - estão nas areias da República Democrática do Congo (ex-Zaire), terra do líder africano Patrice Lumumba, assassinado em 1961. Na luta sangrenta pela posse e comercialização da riqueza natural se envolvem mercenários, tribos autóctones, exércitos nacionais regulares, populações urbanas, governos centro-africanos, fornecedores de armas e munições, máfias locais e máfias internacionais, pequenas gangues, escroques, políticos profissionais e líderes partidários. Na raiz das guerras civis que varrem ou que varreram Serra Leoa, os dois Congos, Angola e Ruanda (4 milhões de mortos e outros milhões de refugiados) está a cobiça por diamantes, petróleo, cobre, madeiras, ouro e os dois minérios para fazer o coltan. Movimentos rebeldes e disputas tribais, durante a Guerra Fria eram financiados pelo menos por um dos lados (não raro, os dois): Estados Unidos/OTAN e o Pacto de Varsóvia/União Soviética. Da década de oitenta até os dias de hoje, esses movimentos buscam financiamento nos recursos naturais de valor internacional, onde o coltan adquire cada vez mais importância estratégica.
É longo e poderoso o circuito que vai da extração mineral, processamento, transporte, fusão do metal coltan e a comercialização para os grandes consumidores como a Dell, HP, Sony, Nokia, Toshiba, Apple, etcetera, só para ficar nas linhas de produção de computadores, laptops e telefones celulares, sem esquecer a eletrônica das grandes montadoras mundiais, os fabricantes de aviões, de armamentos e de componentes para a indústria espacial e militar.
Paira uma mega sombra de suspeita sobre os produtores de alta tecnologia hoje no mundo, justamente pela necessidade de se identificar a origem do coltan usado nas suas traquitanas e gadgets, todos símbolos dourados do ponto mais alto da civilização da razão e do método científico, mas que estão indelevelmente marcados pelo sangue e o suor de milhões de inocentes e vítimas da corrida mundial pelo valor.
Existe um protocolo de certificação da origem do coltan africano, ao qual os governos ocidentais e principalmente os desenvolvedores de novas tecnologias precisam aderir, respeitar e cumprir. Não se trata de mais uma burocracia inútil, mas uma fórmula de mitigação do crime organizado e um mecanismo de distensão nos movimentos separatistas, tribais e de sublevação estimulada pelos contrabandistas de armas e drogas.
Como diz o jornalista e escritor Misha Glenny, autor da obra McMáfia, "há uma interação complexa entre porções regulamentadas e desregulamentadas da economia global". Sem que o cidadão comum saiba, involuntariamente ele está vinculado a grandes indústrias criminosas, com elos tão estreitos que ele mal pode imaginar o quanto lhe é comprometedor. A criminalidade tece teias invisíveis para bem além da sua atividade oculta e o cidadão que se acha distante destes laços pode já estar enredado sem sequer suspeitar.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Contato com o blog Diário Gauche:
cfeil@ymail.com
Arquivo do Diário Gauche
-
▼
2010
(890)
-
▼
janeiro
(38)
- O Brasil precisa universalizar a internet banda larga
- A ideia de que estudar é suficiente para mudar a c...
- Isto é para vocês verem quem manda de fato no Brasil
- Tarso Genro quis desenhar um colibri, mas...
- Carta aberta ao Governo do Estado do Rio de Janeiro.
- Nossos computadores trazem sangue coagulado
- A propósito do post de ontem "Os idiotas e as bara...
- Presidente pop hoje em Porto Alegre
- Os idiotas e as baratas são imbatíveis
- Juventude inicia acampamento com debate político
- O tango de Roxanne
- O espetáculo da privacidade
- ZH usa bobalhão para fazer campanha eleitoral indi...
- "Lula não pode negociar quando se trata da dignida...
- De frente para o Guaíba
- A largada na temporada de bandalheiras 2010, no RS
- Juventude de organizações populares de todo estado...
- Políticas sociais para a juventude chegaram muito ...
- A nova derrota chilena
- Forças brasileiras no Haiti vigiam bancos e mansõe...
- Beirut
- Militares brasileiros no Haiti são cicerones fúneb...
- O grande Tom Waits
- País prepara uma bomba-relógio de curto prazo
- Com a metade da popularidade de Lula, Cristina abr...
- Há um evidente e completo colapso do setor público...
- Belíssimo!
- Yedão opta por pagar pela TV de Serra a receber co...
- Hans Magnus Enzensberger e Arnaldo Antunes
- Jobim agora ultrapassou o limite
- Yedão, o déficit zero e a ponte que caiu
- Isto é Chamamé
- O capitalismo se tornou hostil à vida
- Fotógrafos vampiros
- A mãe de todas as bandalheiras do yedismo de fraca...
- Serra, o que vale é a própria imagem
- ZH quer pirar o cabeção do bombachudinho médio
- Jobim, o pulha, quer mesmo é apoiar o tucano Serra
-
▼
janeiro
(38)
Links recomendados:
- Agência Brasil
- Agência Carta Maior
- Agência Pulsar
- Animot
- Biscoito Fino e a Massa
- Blog do Merten
- Blog do Nassif
- Blog do Planalto
- Blog Rádio COM
- Blogoleone
- Brasil de Fato
- Bullet Proof Blog
- Celeuma
- Cidadania.com
- Cloaca News
- Coletivo Catarse
- Coletivo Subverta
- Conversa Afiada
- Dialógico
- Diário Gauche (textos anteriores a Ago/2007)
- EconoBrasil - Economia Internacional
- Editora Expressão Popular
- Fórum de Reforma Urbana
- Grain.org
- Historiando
- Impedimento (Futebol)
- Instituto Humanitas - Unisinos
- Irã News
- Jornalismo B
- La Latina - Cinema
- La Vaca
- La Vieja Bruja
- Letteri Café
- Levante da Juventude
- Movimento Consulta Popular
- MST
- O petróleo tem que ser nosso
- Paideia Gaucha
- Partisan RS
- Pimenta Negra
- Ponto de Vista
- Porto Alegre Vive
- PT_Sul
- Página 12
- Pública, Jorn. Investigativo
- Radioagência NP
- RS Urgente
- Rádio da Universidade
- Sakamoto
- Sin Permiso
- Somos Andando
- Sátiro
- Tijolaço
- Varanda Cultural
- Vi o Mundo
- Via Campesina
Perfil do blogueiro:
- Cristóvão Feil
- Porto Alegre, RS, Brazil
- Sociólogo
2 comentários:
Muito interessante. Qual sua fonte?
+ um para saber a fonte, favor postá-la
Postar um comentário