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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Os ricos sabem disso e só comem alimentos orgânicos


Agrotóxicos no seu estômago

Os porta-vozes da grande propriedade e das empresas transnacionais são muito bem pagos para todos os dias defender, falar e escrever de que no Brasil não há mais problema agrário. Afinal, a grande propriedade está produzindo muito mais e tendo muito lucro.

Portanto, o latifúndio não é mais problema para a sociedade brasileira. Será? Nem vou abordar a injustiça social da concentração da propriedade da terra, que faz com que apenas 2%, ou seja, 50 mil fazendeiros, sejam donos de metade de toda nossa natureza, enquanto temos 4 milhões de famílias sem direito a ela.

Vou falar das consequências para você que mora na cidade, da adoção do modelo agrícola do agronegócio.

O agronegócio é a produção de larga escala, em monocultivo, empregando muito agrotóxicos e máquinas.

Usam venenos para eliminar as outras plantas e não contratar mão de obra. Com isso, destroem a biodiversidade, alteram o clima e expulsam cada vez mais famílias de trabalhadores do interior.

Na safra passada, as empresas transnacionais, e são poucas (Basf, Bayer, Monsanto, Du Pont, Sygenta, Bungue, Shell química...), comemoraram que o Brasil se transformou no maior consumidor mundial de venenos agrícolas. Foram despejados 713 milhões de toneladas! Média de 3.700 quilos por pessoa.

Esses venenos são de origem química e permanecem na natureza. Degradam o solo. Contaminam a água. E, sobretudo, se acumulam nos alimentos.

As lavouras que mais usam venenos são: cana, soja, arroz, milho, fumo, tomate, batata, uva, moranguinho e hortaliças. Tudo isso deixará resíduos para seu estômago.

E no seu organismo afetam as células e algum dia podem se transformar em câncer.

Perguntem aos cientistas aí do Instituto Nacional do Câncer, referência de pesquisa nacional, qual é a principal origem do câncer, depois do tabaco? A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) denunciou que existem no mercado mais de vinte produtos agrícolas não recomendáveis para a saúde humana. Mas ninguém avisa no rótulo, nem retira da prateleira.

Antigamente, era permitido ter na soja e no óleo de soja apenas 0,2 mg/kg de resíduo do veneno glifosato, para não afetar a saúde. De repente, a Anvisa autorizou os produtos derivados de soja terem até 10,0 mg/kg de glifosato, 50 vezes mais. Isso aconteceu certamente por pressão da Monsanto, pois o resíduo de glifosato aumentou com a soja transgênica, de sua propriedade.

Esse mesmo movimento estão fazendo agora com os derivados do milho.

Depois que foi aprovado o milho transgênico, que aumenta o uso de veneno, querem aumentar a possibilidade de resíduos de 0,1 mg/kg permitido para 1,0 mg/kg.

Há muitos outros exemplos de suas consequências. O doutor Vanderley Pignati, pesquisador da UFMT, revelou em suas pesquisas que nos municípios que têm grande produção de soja e uso intensivo de venenos os índices de abortos e má formação de fetos são quatro vezes maiores do que a média do estado.

Nós temos defendido que é preciso valorizar a agricultura familiar, camponesa, que é a única que pode produzir sem venenos e de maneira diversificada. O agronegócio, para ter escala e grandes lucros, só consegue produzir com venenos e expulsando os trabalhadores para a cidade.

E você paga a conta, com o aumento do êxodo rural, das favelas e com o aumento da incidência de venenos em seu alimento.

Por isso, defender a agricultura familiar e a reforma agrária, que é uma forma de produzir alimentos sadios, é uma questão nacional, de toda sociedade.

Não é mais um problema apenas dos sem-terra. E é por isso que cada vez que o MST e a Via Campesina se mobilizam contra o agronegócio, as empresas transnacionais, seus veículos de comunicação e seus parlamentares, nos atacam tanto.

Porque estão em disputa dois modelos de produção. Está em disputa a que interesses deve atender a produção agrícola: apenas o lucro ou a saúde e o bem-estar da população? Os ricos sabem disso e tratam de consumir apenas produtos orgânicos.

E você precisa se decidir. De que lado você está?

Artigo do economista João Pedro Stedile, integrante da coordenação nacional do Movimento dos Sem Terra (MST). Publicado na edição de hoje de O Globo.

6 comentários:

André de Oliveira disse...

Essa é uma batalha duríssima e uma nova etapa está chegando sem nenhuma crítica contundente: o governo federal está se ligando à Vale e a Eike Batista para montar um grande projeto nacional de produção local de fertilizantes, importante fosfato e potássio da Argentina e do Peru. Um tiro no pé, com consequência danosas para os próximos anos!
Repare bem a reportagem de hoje na Ag. Brasil: Expansão da agroindústria no Brasil exige redução da dependência externa de fertilizantes [http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2009/09/24/materia.2009-09-24.9456985472/view]. Não há nenhuma posição contrária a esse projeto na notícia, e fica por isso mesmo. Já existe propaganda da Vale na televisão, em horário nobre, defendendo essa idéia. É pra passar o trator do agronegócio em qualquer possibilidade de mudança na matriz agrícola brasileira. Eles estão cagados de medo que falte fertilizante nos próximos anos, com o assédio de China e Índia aos produtos. É tudo uma questão de money. Nenhum jornalão analisa a situação. Não há debate sobre isso. Essa situação é o maior reflexo do nosso total desligamento com a natureza. Não conhecemos o que comemos. Como diz o professor Valdely Kinupp, numa reportagem que fizemos sobre Plantas Alimentáicias não-convencionais: "Somos xenófilos: o brasileiro não come a biodiversidade que tem" - assista ao vídeo na página do Subverta! e note como estamos distante de uma dieta natural e compromissada com a nossa saúde. [http://agenciasubverta.blogspot.com/2009/06/conhecer-e-comer-nossa-biodiversidade.html].

Katarina Peixoto disse...

Texto muito bom. Não sei se os ricos só comem orgânicos, dada a maloqueiragem típica da elite brasileira e guasca. E no mais, tem dois aspectos desse embate que literalmente invadem as vidas privadas com violência: o primeiro é a luta que se tornou comer bem e de maneira saudável. Isso dá muito trabalho e custa mais, sim. Somos o tempo todo bombardeados para comer toxicamente; o segundo é a obesidade progressiva das classes trabalhadoras, lotadas de farináceos e impregnações tóxicas. Essas coisas cada vez são mais urgentes e violentas. Os quadros clínicos resultantes desse desastre estão aí. E as classes médias a obedecer os cretinos que dizem que o problema é o MST...

Nelson Antônio Fazenda disse...

Como de costume, o Stédile não tergiversa, vai no "xis" da questão.
Com o modelo agrícola que impera, que ousam chamar de moderno, as grandes empresas da indústria química atacam nas duas pontas. Primeiro, lucram um monte enchendo de agrotóxicos os alimentos que vão parar nas nossas mesas. Depois, ficam só esperando, para, anos depois, quando, devido a tanto veneno ingerido as "perebas" começam a aparecer, passarem a oferecer os remédios que supostamente nos irão curar.
Para essas empresas, lucro em dose dupla.
Já para nós sobram problemas em dose tripla: complicações com a saúde, destruição ambiental e o êxodo rural que engorda o cinturão de miséria nas médias e grandes cidades.

Nelson Antônio Fazenda disse...

Que respondam aqueles que deveriam estar zelando pela saúde do povo.
Se os transgênicos possibilitam o uso de uma quantidade menor de agrotóxico, por que foi preciso aumentar em 50 vezes, no caso da soja, a tolerância ao glifosato?

Vinicius disse...

Prezados amigos:

Certamente a busca por menor utilização de agrotóxicos é dever de todos é mais saudável e mais econômico. Porém creditar à agricultura familiar a produção de alimentos isentos de agrotóxicos é arriscado. Não tenho a mesma certeza do autor do texto. Vivo no campo e desafio que se faça uma pesquisa real para confirmar a tese descrita. Hoje se caminha para a utilização de princípios ativos registrados e se realiza análise de resíduos corriqueiramente, em laboratórios modernos e idôneos. O que se busca é minimizar os resíduos. Convenhamos, é melhor um alimento que passe por análise ou um alimento que sequer é submetido a testes? Quem pode afirmar que o fato de ser proveniente de agric. familiar é garantia plena da isenção de agrotóxicos? Para os nobres leitores esse fato é suficiente para consumir desprocupadamente qualquer alimento? Gostaria de ter respostas. Na prática, o que se vê, é que os índices de LMR(limite máximo de resíduos)vem baixando com o passar dos anos, exigindo mais cuidado dos agricultores sérios. Ao contrário do afirmado no texto. Quem produz alimentos respeitando a grade de produtos registrados para sua cultura, os prazos de carência de cada produtos, as dosagens recomendadas, o monitoramento de pragas e doenças, regula seus equipamentos, dá destinação correta aos vasihames usados, armazena adequadamente seu estoque, treina seus funcionários, respeita prazos de reentrada nas áreas tratadas e submete seu produto final á análise laboratorial rigorosa para determinar eventuais resíduos e, por fim, documenta e arquiva todos os procedimentos que envolvam produtos químicos usados na lavoura, submetendo sua propriedade a auditoria anual que verifica tudo isto, pode oferecer à sociedade um mínimo de garantia quanto ao seu produto. Além disto, quem produz alimentos orgânicos e também é auditado e aprovado pelas Certificadoras do Setor, são os ÚNICOS que podem se dizer produtores de produtos totalmente limpos. Fora disso tenho minhas dúvidas.

Valeriobrl disse...

1)tem que ser valorizada a produção agrícola BIO dos pequenos produtores, isto tem um custo;
2)tem que ser informado o consumidor final da categoria dos agrotóxicos utilizados nos brocolis, tomate, morango..etc, isto também tem um custo;
3)tem que ser feita uma VERDADEIRA fiscalização das aguas perto dos lugares de produção agrícola (arroz, milho etc..) para entender o nível de poluição, isto tem um custo;
...e muitos outras coisas.
O povo está disponibilizado em aceitar este custos adicionais?
Sono italiano e peço desculpa pelo meu péssimo português.

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