Um documentário sobre a ideologia gaucheira
Está caindo de maduro se fazer um documentário cinematográfico sobre a ideologia gaucheira e farrapista. O Acampamento Farroupilha é um cenário pronto e acabado, com personagens expressivos e locações que clamam por um registro documental crítico.
Quem vai ao Acampamento com olhar crítico enxerga os requerimentos de filmagem gritando a nossa volta. Tudo é passível de registro, debate, documentação e análise. Mas não precisa ficar somente ali. Deve apanhar o desfile de 20 de setembro – amanhã – e entrevistar um rol de militantes e contra-militantes, estudiosos, professores, antropólogos, patrões de CTG, dirigentes do MTG e todo o entorno da causa gaucheira. Entrevistar alguém que acampa lá no Parque da Harmonia e saber onde mora, que imaginário cultiva, que visão de mundo tem ou não tem, a que sociabilidade pertence, que laços o trazem, que pialos o prendem àquele mundo de fantasia e abstração, etc.
Se observa no Harmonia muito funcionário público estadual. Tem muito brigadiano (policial militar estadual, corporação consolidada por Júlio de Castilhos), também. São pessoas rústicas, às vezes com uma infância na zona rural do Estado, e que identifica ali uma forma nostálgica de buscar o próprio passado, cultivando aquele receituário prêt-à-porter de gauchidade e farrapismo que julga subjetivamente confortável para estar no presente e garantir o futuro.
Penso que para este ano já não dê mais tempo, mas é de pensar e organizar essa empreitada. No mínimo, será divertido. Desde já, me candidato a roteirista do filme, aliás, eu já tenho algumas coisas rabiscadas.
Alô, Peralta, Guga Türck, Scharlau... quem vai encarar essa barbada! Se nós estivéssemos nos EUA já haveria como 118,5 filmes documentários sobre o movimento bombachudo. Aqui, temos quantos mesmo?
Registro parcial do desfile de 20 de setembro de 2005. Na foto superior, uma visão panorâmica do Acampamento Farroupilha, com o Centro de Porto Alegre no alto e à esquerda, e o lago Guaíba emoldurando tudo.
7 comentários:
Acho que a presença de brigadianos no parque levanta uma questão interessante - por que o braço armado do positivismo aderiu ao imaginário maragato? Como foi esse processo? Quais as condições dessa passagem? E quais os agentes tradutores dessa "traição"?
Cristovão:
acabaste de colocar o ovo em pé. Como é que alguém ainda não fes isto?
fez, fez, porra! (Maldito revisor).
Prezado anônimo, penso que não há nada ideológico ou cerebral aí neste caso. Os brigadianos de baixa patente aderem por que é algo popularesco, que sociabiliza o sujeito, identifica-o com "ideais altaneiros", de bravura, etc, etc. Não vejo "traição" tout court. Acho que isso é bem mais profundo e complicado. Não há um nexo causal tão fácil como parece. O fato é que, por algum motivo, os setores "maragatos", vamos dizer assim, a partir de meados do século passado, começaram a se apropriar do simbolismo farroupilha e fizeram uma tradução livre disso, com muita ideologia e muito mito. Eu diria que esses neo-farrapos (estudantes do colégio Julinho, ironicamente) deram uma de Mirabeau e se apossaram da imaginação popular, eles foram o "Departamento do Espírito" na renovação do pensamento maragato-estancieiro. O castilhismo tentou fazer isso no final do Império, mas conquistado a República, eles não tiveram tempo e imaginação para prosseguir a tarefa de povoamento do imaginário popular e a construção de um senso comum autônomo e emancipatório. E até hoje ninguém mais fez, só a direita.
Prezado Jens, te referes a quê?
Ao documentário cinematográfico, à construção de um senso comum emancipatório (como quer o professor Bento Monteiro), ou a ambos?
Esse filme futuro, poderia alternar imagens da "Farroupilha", com o 7 de setembro, assim como com a marcha gay (que alguém já chamou de nazista) e coroada com o desfile das escolas cariocas (que chatice!).
Desde que com a coordenação, direção e produção do MTG. Porque a gauchada "cetegística" não é muito chegada em releitura, contraponto, antagonismos, da historiografia guasca. Pois se o negócio não sair ao gosto deles, vai acontecer o que aconteceu com aquele livro "sacana" publicado nos idos do 80's que se chama "A Importância do Barranco na formação sexual do Gaúcho" em que houve queima de exemplares em praça pública, em uma manifestação bem nazista. Outro exemplo aconteceu com o livro do Maestri: Bento Gonçalves herói ladrão.
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