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sexta-feira, 21 de setembro de 2012

A revolta sulina jamais pode ser chamada de revolução farroupilha



Em "A Ideologia Alemã", casualmente escrito entre 1845/46 (quando se encerrava a guerra sulina de 1835-45), Marx e Engels definem o que seja um processo revolucionário autêntico. Eles falam do chamado "salto cataclísmico" de um modo de produção para o seguinte, provocado pela convergência de conflitos entre as velhas instituições e as novas forças produtivas que lutam para se impor.

Ora, nos conflitos do decênio farrapo jamais foi cogitado algo semelhante. A própria ideia de república era uma consigna anêmica e mitigada. Portanto, a institucionalidade era conservadora e o modo de produção continuaria baseado nas vastas estâncias pastoris tocadas a trabalho escravo. Onde se encontram, então, os elementos necessários para a ocorrência de uma revolução autêntica e genuína?

Marx no belo texto que lhe é peculiar, cheio de pequenas anedotas, espírito agudo e fina ironia, ainda observa que em qualquer revolução é preciso "limpar as estrebarias de Áugias que estão transbordando de estrume" - referindo-se aos doze trabalhos do herói mítico Hércules que desviou dois rios para limpar num só dia as cocheiras fétidas de um velho reino grego.

As estrebarias do Rio Grande do Sul, pois, ficaram simbolicamente mais sujas, depois de 1845. Uma velha classe de civis e militares se revezaram vegetativamente no poder provincial, como xerifes vigilantes da imperial família Bragança. Enquanto isso, sua base social de sustentação política - o latifúndio pastoril (de tão atrasados, sequer cultivavam a terra, no RS não havia agricultura) de exportação - se apropriava de tantas terras públicas quanto fosse possível. As oligarquias - um fenômeno mundial - têm origem precisamente na apropriação não consentida das terras públicas. A acumulação primitiva dessas camadas sociais, que depois viram "elites", é feita na forma do roubo. Esse capital econômico apropriado pela violência, depois se transforma em capital político, base de sustentação da hegemonia social e cultural que vai perdurar e adentrar o século 20.  

Essa farra latifundiária sem limites e com licença para roubar terminou somente em 1891, com a Constituição escrita pelo jovem republicano Julio Prates de Castilhos, dando início, assim, a um novo ciclo político modernizador e revolucionário (este sim, revolucionário de corte burguês e autoritário) que vai durar mais de trinta anos no Rio Grande do Sul - onde explodiram dois conflitos sangrentos - 1893/95 e 1923/24 - sempre provocados pela reação maragata (estancieiros ex-monarquistas).

Um comentário:

Daniel disse...

Notaste que eles falam em lugares "mitológicos"? Eles já nem sabem mais separar a história do mito.

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