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quarta-feira, 7 de outubro de 2009
O barão do suco de laranja e a reforma agrária
Ministro Cassel escolhe o lado, o lado do barão
A televisão tem mostrado repetidas vezes um breve vídeo feito desde um helicóptero da Polícia Militar de São Paulo onde aparece um trator atropelando alguns pés de laranjeira, no interior paulista. A ação é atribuída a militantes do MST, que invadiram a propriedade de cinco hectares de laranjais e estavam limpando uma área para fazer roças de milho e feijão, para subsistência do acampamento de sem-terras, próximo dali, na região de Bauru, a cerca de 320 km de São Paulo.
A área de laranjais de cinco hectares está localizada numa imensa gleba de 10 mil hectares e pertence à União federal. Foi grilada (invadida) pela empresa Sucocítrico Cutrale Ltda., de propriedade da família Cutrale, oriundos da Sicília, sul da Itália, há muitos anos. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já teria se manifestado em relação ao conhecimento de que as terras são realmente da União, mas nenhuma providência legal foi tomada pelo órgão federal.
Segundo a Folha, edição de hoje, "a Cutrale, defendida com veemência por deputados e senadores depois de ter visto um de seus laranjais destruído pelo MST, injetou R$ 2 milhões em campanhas de congressistas nas eleições de 2006".
A revista Veja, em maio de 2003, publicou matéria com chamada de capa sobre a empresa Cutrale. Para a insuspeita revista da família Civita, "o brasileiro José Luís Cutrale e sua família detêm 30% do nercado global de suco de laranja, quase a mesma participação da Opep no negócio de petróleo".
Assim, a Cutrale não é cachorro pequeno, como pode parecer a quem não conhece a sua história, suas conquistas e seus feitos. É preciso, pois, contar um pouco desses fatos, para que o senso comum não pré-julgue a partir das imagens do vídeo da PM paulista (ou da própria Cutrale).
A partir deste parágrafo, as informações que passaremos foram extraídas da Veja, edição 1802 (14 de maio de 2003). Ninguém desconhece a marca direitista e conservadora do semanário da Abril, portanto, insuspeitos de estarem distorcendo informações sobre um player agressivo do nosso capitalismo tupinambá, como veremos.
A produção mundial de laranjas e derivados se reduz a duas regiões pontuais do globo terrestre, interior de São Paulo, no Brasil, e interior da Flórida, nos Estados Unidos. Cerca de 70% do suco consumido no mundo é plantado e industrializado por brasileiros (números conservadores de 2003).
A Cutrale vende suco concentrado para mais de vinte países, entre os quais os Estados Unidos, todos os da Europa e a China. Seus clientes são grandes companhias do padrão da Parmalat, da Nestlé e da Coca-Cola, dona de uma das marcas de suco de laranja mais populares nos Estados Unidos. O principal segredo do negócio consiste em adquirir fruta a um preço baixo – preço de banana, brincam os fornecedores –, esmagá-la pelo menor custo possível e vender o suco a um valor elevado - informa a Veja.
Em 2001, ainda no governo FHC, a Receita Federal se interessou pela questão enigmática da altíssima lucratividade da Cutrale (nos anos 80, a empresa teve taxas de retorno na ordem de 70%, um fenômeno raro) e teve dificuldade em analisar as contas do grupo. Fiscais de Brasília e São Paulo procuraram entender como a Cutrale ganha tanto dinheiro. Não localizaram nenhuma irregularidade. Uma autoridade da Receita relatou a Veja que a estratégia para elevar a lucratividade do grupo passa por contabilizar uma parte dos resultados por intermédio de uma empresa sediada no paraíso fiscal das Ilhas Cayman. Com isso, informa a autoridade da Receita, a Cutrale conseguiria pagar menos imposto no Brasil. Trata-se de um mecanismo legal. Foi o que a Receita descobriu ao escarafunchar as contas da organização da família Cutrale.
A agressividade gerencial da família Cutrale é uma lenda no interior paulista. Os plantadores de laranja no Brasil têm poucas opções para escoar a produção. Há apenas cinco grandes compradores da fruta e Cutrale é o maior deles. Por essa razão, acabam mantendo com o rei da laranja uma relação que mistura temor e dependência. Por um lado, precisam que ele compre a produção. Por outro, assustam-se com alguns métodos adotados por Cutrale para convencê-los a negociar as laranjas por um preço mais baixo. Produtores ouvidos por Veja afirmam que a família Cutrale costuma fazer enorme pressão para conseguir preços melhores na fruta ou mesmo adquirir fazendas. "Empregados deles nos visitavam e queriam que a gente vendesse nossa propriedade. Do contrário diziam que seríamos prejudicados na safra seguinte", afirmou um produtor que passou pela experiência de negociar com os Cutrale. Outro fazendeiro relata história semelhante, pois também foi procurado para vender sua fazenda de laranja. "Antes de eu ser abordado, minha fazenda foi sobrevoada algumas vezes por um helicóptero da companhia", diz.
Outra reclamação comum feita a Veja por produtores diz respeito aos termos de alguns contratos de compra de laranja. No ano 2000, 200 produtores acionaram em bloco a Cutrale. Acusavam-na na Justiça de descumprir um contrato pelo qual a empresa se comprometia a receber 5 milhões de caixas de laranjas. Segundo os produtores, nos dias em que eles tentaram fazer a entrega, os portões estavam fechados e a laranja começou a estragar. Os produtores quiseram ser ressarcidos pelo prejuízo, mas a Cutrale alegava que não lhes devia nada, já que não havia recebido a fruta. Os produtores receberam uma liminar para entregar o produto. Só depois disso a Cutrale aceitou a encomenda. "É difícil conseguir bons preços tratando com alguém que pode dizer não até sua laranja apodrecer", conta um produtor que por razões óbvias prefere não se identificar.
Essa linha dura já rendeu à Cutrale discussões legais por formação de cartel. De 1994 para cá [2003], Cutrale já foi alvo de cinco processos no Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade, a autarquia encarregada de preservar a concorrência. Ele não estava sozinho no caso. Foi investigado juntamente com outras grandes indústrias do setor. Jamais sofreu uma punição. Num desses processos, duas associações de produtores de laranja denunciaram ao Cade que Cutrale e outras indústrias estavam se reunindo para combinar preços, o que prejudicava os plantadores. O desfecho do caso foi amigável. As empresas assinaram um "termo de compromisso de cessação das irregularidades" com os fazendeiros, comprometendo-se a não se reunir para organizar preços. O Cade decidiu que as empresas de suco de laranja não poderiam se organizar dessa forma.
Em vários aspectos, a indústria de suco de laranja lembra as empreiteiras. Além de ser um mercado concentrado nas mãos de poucos gigantes, os dois setores mantêm uma longa história de dependência em relação aos governos.
...................................................
Considerados pela mídia como interlocutores do MST no governo federal, o ministro Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário) e o presidente do Incra, Rolf Hackbart, condenaram a destruição de pés de laranja numa área invadida pelo movimento no interior paulista. Cassel chamou a ação de "grotesca" e "injustificável". A informação é da Folha de hoje (fac-símile parcial acima).
"Uma imagem grotesca, injustificável sob qualquer ponto de vista", disse Cassel. "O movimento tem errado muito e espero que uma situação grotesca como essa o faça refletir sobre as suas ações. Ele tem se isolado, tem perdido o apoio social", completou o ministro petista. "A minha reação foi de indignação. Não tem razão para isso", disse Hackbart.
A ação, flagrada por cinegrafistas [seriam da PM/SP ou da própria empresa grileira?] numa área da Cutrale [grilada] terá um efeito colateral aos próprios sem-terra: para esfriar os ânimos e conter a indignação dos ruralistas, o Palácio do Planalto deve atrasar ainda mais o cumprimento da promessa de atualizar os índices de produtividade da reforma agrária.
Na minha modesta opinião, o lulismo de resultados, agora, vai usar esse fato como álibi para não atualizar os índices de produtividade, em definitivo (certamente com os "doutos" aconselhamentos do ministro Cassel).
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14 comentários:
Quando tratores e máquinas destroem barracos de áreas públicas ocupadas por famílias nas grandes cidade não s vê os nobres senadores, entre eles o Suplicy, falar uma vírgula em defesa do povo desamparado. Desde segunda aparecem todos, sem exceção batendo pesado nos sem terra, Devem esperar recursos prá campanha do ano que vem do sr. cutrale.
Para o Guilherme e o Rolph se posicionarem diferenetemente teriam que sair do governo.Aí o buraco é mais embaixo. Eles sabem perfeitamente a que tipo de governo servem. Fizeram uma escolha e a história os julgará, assim como tantos outros que se bandearam pro lulismo de resultados.
Com esse tipo de gente no governo federal a reforma agrária jamais vai andar como deveria.
Esse barão Cutrale leva caixas e caixas de charuto Cohiba pro Lula e pros ministros em Brasília já que é membro privilegiado do Conselho de Desenvolvimento Nacional, o Conselhão.
Ou seja, ele grila terra da União e se garante. Pronto, quem vai mexer com ele?
Os coitadinhos dos sem terra, que destruiram meia dúzia dos milhões de pés de laranja da Cutrale?
Cristóvão,
Com todo respeito, divirjo de sua opinião. O MST paulista já desserviu, em outros episódios capitaneados pelo José Rainha (um doido por mídia) à causa nobre da reforma agrária.
Estou contigo na condenação do latifúndio e do "barão da laranja". Mas, no momento em que os setores do PT mais próximos ao MST conseguem derrotar a tentativa dos latifundiários de criar a CPI do MST, no Congresso Nacional, uma ação equivocada dá toda margem a novos ataques, no palanque da mídia e nos espaços da política, institucional ou não.
Tenho admiração e respeito pela luta do MST. Porém, não podemos ser "acríticos" em relação aos métodos de luta. Determinadas ações são absolutamente condenáveis do ponto de vista político, como dar gratuitamente aos inimigos da reforma agrária essas imagens, que correram o mundo.
Nesse sentido, Cassel tem razão: só atrapalham a luta pela reforma agrária e jogam o governo Lula ainda mais pra uma posição defensiva, como é sua marca em quase oito anos.
Saludos democráticos,
Samuel Lima
Jornalista - Joinville/SC
Prezado Samuel Lima,
Diverge da minha opinião? Mas que opinião? Não fiz comentário algum sobre o ato do MST. Chamo a atenção para a identidade e o poder da empresa Cutrale, a "vítima de tão bárbaros atos". Chamo a atenção para a facilidade com que a mídia oligárquica consegue declarações do ministro do MDA contra qualquer ato do MST. Qualquer ato do MST, repito.
As conclusões são suas, mas por favor, não "crie" sobre o post.
Saudações!
CF
Ah, faltou dar a minha opinião (agora sim) sobre o citado José Rainha (ex-MST).
Um picareta! Um impostor!
Abç.
CF
A causa da reforma agrária é tão importante que apesar de burrices midiáticas como a de ontem, o MST nao consegue acabar c/ ela.
Caríssimo Cristóvão,
Sem querer polemizar contigo, até porque minhas convergências com a linha Diário Gauche são mais relevantes, quando falei "opinião" é o tom do post, as entrelinhas. Concordo com tua crítica contundente tanto ao governo Lula, neste particular, à atuação das autoridades que atuam no setor tem sido pífia (Cassel e Hackbart, quanto ao papel do latifúndio.
Como no caso da comunicação, nossa praia, a marca do governo Lula tem sido a covardia, sem meias palavras. Em todo caso, o baronato da mídia e toda catrefa da UDR, à frente a indefectível Kátia Abreu, babaram esses dois dias, sobre aquelas imagens do trator detonando a plantação de laranja. Desnecessário, meu camarada.
Abraços, mano velho.
Samuca
P.S.: De acordo quanto ao Zé Rainha. O povo do MST em SC, com o qual mantenho diálogo, nunca engoliu a linha daquela figura.
Aviso aos navegantes:
O Zé Rainha já foi defenestrado do MST faz é muito tempo.
Pessoal,
"Segundo a Folha, edição de hoje, "a Cutrale, defendida com veemência por deputados e senadores depois de ter visto um de seus laranjais destruído pelo MST, injetou R$ 2 milhões em campanhas de congressistas nas eleições de 2006"."
Nada mais normal do que do que os "Laranjas" defenderem o laranjal. Já pensaram se o povo resolve atacar do Laranjal do Legislativo?
E quanto ao Cassel, reforma agrária só para os da DS.
É de se perguntar ao nosso bravo ministro "o que é que tem a ver o cós com as calças", ou seja, o que é que tem a ver essa suposta ação do MST com os índices de produtividade.
Afinal, a atualização desses índices é, além de uma demanda da sociedade brasileira, uma questão de coerência, que deve ser implementada independentemente da existência do movimento.
Então, o ministro ameaça punir a sociedade toda em virtude de uma ação equivocada do MST?
Equivocado é o Ministrinho do Agronegocinho, quem devia defender o Cutrale é a pefelista Katia Abreu, a viuva mais esperrrrta do Brasil.
Irônica é minha situação: Lendo o post, tomando um suco de laranja(não industrializado) e lembrando da minha infância em Araraquara-SP, onde havia uma indústria da Cutrale bem próxima à minha casa.
Que a mídia criminaliza os movimentos sociais, isso não é novidade, mas hoje na Globo tive a impressão de que as acusações foram muito mais explícitas e fortes. O Alexandre Garcia, no Bom dia Brasil, chegou a dizer que era "eufemismo chamar os movimentos sociais dessa forma", botando todos os movimentos no mesmo saco, sejam eles qual forem, e deixando a opinião da empresa muito clara.
Bom lendo os post....me vem alguns pensamentos......
...é equivocado ocupar uma area que pertence a união (portanto a nós brasileiros e brasileiras).
...é equivocado arrrancar as malditas laranjas (com agrotoxicos que serão exportadas para malditos paises de 1° mundo) para plantar milho, feijão, legumes, verduras para sobreviver....
Equivocado está esse mundo...equivocados estamos nos, que não temos coragem de lutar por mudança.
Acreditamos filmente que nos diz a deus GLOBO, está que envenena nossas crianças, nossos jovens.
Quando vamos desligar o botão da tv e procurar informações verdadeiras na realidade, em livros......
Abraços,
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