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Surf no lixo contemporâneo: a que ponto chegamos! E que mundo deixaremos de herança para Keith Richards?

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O puro cálculo de márquetim do governador eleito


A contabilidade eleitoral sustenta somente o cálculo puramente pessoal, mas desconsidera a política do real

Domingo pela manhã, estando longe de casa, vim de carro para Porto Alegre, com o objetivo de exercer meu dever cívico e votar faceiro na candidata Dilma Rousseff, amiga de três décadas. Rádio ligado, ouço o prefeito de São Leopoldo e coordenador estadual da campanha de Dilma, o petista Ary Vanazzi. Descendente de imigrantes italianos de quarta ou quinta geração, sei lá, Vanazzi não perde o forte sotaque peninsular, que lhe empresta um charme extra junto à comunidade oriundi e muitos votos nos pleitos que disputa. Cada um faz a persona que mais lhe agrada na dramaturgia da vida, ora.

Dizia, o coordenador eleitoral: "A campanha de Dilma cresceu muito neste segundo turno, cresceu tanto que já não conseguimos controlar seu crescimento... acho que já passa dos 60% das preferencias eleitorais dos gaúchos...".

O prefeito/coordenador (e controlador de crescimento eleitoral, como confessou) errou feio. Dilma, no RS, não fez "mais de 60% dos votos". Reuniu 49,06% das preferências sul-rio-grandenses. Perdeu para Serra, que logrou conquistar 50,94%.

Essa contabilidade eleitoral no Rio Grande do Sul está em aberto. As contas das urnas não fecham, não há conciliação com a política. Algo está solto, sem aderência com o real. Como explicar a vitória do candidato petista no primeiro turno, a vitória de Dilma, igualmente no primeiro turno no RS, e a derrota de Dilma na cidade de Porto Alegre? Como entender que Dilma ganhou com uma vantagem de 400 mil votos no primeiro turno, e tenha feito 118 mil votos a menos que Serra no segundo turno? Como explicar que em Porto Alegre Dilma tenha perdido no primeiro turno por cerca de 10 mil votos, e perdido no segundo, desta vez por inquietantes 93 mil votos?

Não se escutou nenhuma avaliação do coordenador Vanazzi, nem do governador eleito, Tarso Genro. Ao contrário, dias antes da votação do segundo turno, o prefeito de São Leopoldo estava plantando nota numa conhecida coluna melífera de Porto Alegre, onde - de forma despreocupada e voluntarista - se lançava a ocupar cargo na esfera federal. Já o governador eleito, contrariando acerto prévio com partidários e aliados, anunciava nomes de titulares de secretarias estaduais em sua futura administração. Ora, quem dedica tempo e energia para projetar seu próprio nome às especulações ministeriais, e quem promove negociações legítimas, mas intempestivas sobre futuros auxiliares de gestão não pode - de fato - conquistar votos para a sua candidata presidencial. Ou se faz campanha eleitoral para valer, em tempo integral, ou se antecipa o calendário e se constrange a todos com uma agenda impertinente porque descabida para o momento.

Em ambos os casos, seja do coordenador eleitoral, seja do governador eleito, sobressai a solar preferência pelo cálculo do márquetim pessoal, acima de tudo.

Ao coordenador-prefeito-controlador-de-crescimento-eleitoral o que importa é o brilho do nomezinho na lista especulativa do jornalismo de bombachas.

Para o governador eleito - às favas com a eleição presidencial - o que vale é a agenda da pequena pátria guasca, deslizar na onda conjuntural enquanto esta lhe favorece, soltar pequenos factóides a cada par de dias, liberar nomes como quem alimenta peixinhos de aquário. Mal se dá conta, que agindo assim está tão-somente aceitando - pavlovianamente - a pauta do jornalismo ficcional.

Mais: os senhores Ary e Tarso organizaram um grande ato eleitoral no centro de eventos do hotel Plaza São Rafael, em Porto Alegre, a 14 de outubro último, uma quinta-feira de primavera. O ato foi um frentão, onde discursaram líderes do PMDB, o senador Zambiasi, líderes do PDT e o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, bem como líderes de diversas igrejas evangélicas.

Observem, se no primeiro turno, Dilma ganhou com 400 mil votos de diferença, no segundo turno, depois da constituição deste referido frentão eleitoral, perdeu-se a disputa regional por quase 120 mil votos. Ou seja, mais de meio milhão de votos migraram para a direita, em franca desobediência às "fulgurantes" lideranças do frentão ary-tarsista de (maus) resultados.

Pois, é na linha objetiva deste malogrado frentão de 14 de outubro é que o futuro governador está montando a sua nominata de auxiliares para governar o Rio Grande. Tarso Genro quer que a árvore do fracasso lhe renda bons frutos. Impossível.

Pode ser prematuro, mas continuo achando que a contabilidade eleitoral não está sendo conciliada com a velha e boa política. O fracasso (conjuntural) de uma não pode querer aconselhar a construção (inteligente) da outra.

27 comentários:

jose grisa disse...

Tarso e as alianças para a governabilidade. Faltou citar um partido nas negociações - a RBS - que ocupa no momento as sublegendas chamadas PP e PDT.
O deputado da RBS não eleito Afonso Motta via para Câmara Federal, pois Tarso vai abrir este caminho, chamando um deputado eleito do PDT para alguma secretaria. Afonso Motta na câmara federal tem 2 tarefas. Impedir junto com outros companheiros a tramitação de qualquer lei que regule os meios de comunicação, e outra destinar verbas para o agronegócio. Enquanto aqui Tarso exije um mar calmo no trato da mídia guasca, com o seu governo de "todos".
Quem viver verá.

edu disse...

Boa Feil.

O PT bom ficou naquela previa...tarso sempre foi o muro de Berlin do PT Gaucho, nasceu para dividir, sua facçao interna sempre foi "simpatica" à acordos com a velha elite corrompida.

O novo governador nao é pior que os outros dois, isso nao, mas os 20% que ele possui na largada ( em comparaçao com rigoto e yeda) nao garantem longa vida...ainda mais começando assim...

Grande abraço

Anônimo disse...

É o Tarso...

Domingos.

Hermes Vargas dos Santos disse...

Muito bom teu comentário, Cristóvão! Essa questão, da derrota local no segundo turno não está sendo avaliada, talvez por conveniência. Um dos poucos que falou a respeito foi o Adeli Sell, presidente do PT municipal. Limitou-se a "constatar" que o eleitorado gaúcho é conservador ... No primeiro turno esse eleitorado era progressista? Piada. Votei na Dilma, e dei carona para o Tarso. Andaram "beliscando minhas linhas", antes do segundo turno, e tive que lembrar aos interessados que qualquer conversa só podia ser feita após o segundo turno - antes tínhamos que eleger Dilma! Depois, vieram novamente, mas agora quero saber os nomes, para aferir se vale a pena "pegar na lingada". Não estou gostando do que está acontecendo - oportunismo, carreirismo, guerra por cargos e alianças "amplas" (muito amplas, pro meu gosto). Aqui também não vai ter calmaria, e já fiz a peação da carga no convés e no porão ...

Cristóvão Feil disse...

Grisa, te asseguro que aqui não haverá mar de calmaria, nem em relação ao RS, nem em relação ao Brasil.

Abç.

CF

Juarez Prieb disse...

Criar a Secretaria do Agronegócio e entregar pra RBS é o fim da picada.

Entregar secretarias importantes pros lúmpens do PTB e do PDT é ir além do fim da picada.

Stringhini disse...

Feil avisa ao Tarso que as eleições terminaram, ele pode apear do palanque.

Anônimo disse...

Comentário preconceituoso e totalmente desnecessário sobre o sotaque gringo do cara.

Devemos nos envergonhar do nosso sotaque? Esse blog frequentemente tem resvalos de um teor altamente fascista, revelados numa frase ou outra supostamente sem importância.

Anônimo disse...

Caro Feil,

Espero que a Presidente Dilma esteja bem ciente da falta de empenho dos seus correligionários no RS, que tiveram tempo para reuniões com presidente do TJ,
com a Ajuris, etc.

Sds.,

Anônimo disse...

Caro Cristóvão!

O Governador eleito Tarso Genro disse em entrevista à Carta Maior que a coligação para a eleição do governo do RS é de esquerda. Disse, ainda, que iria negociar para atrair os partidos de centro para a proposta de governo do PT. Por favor tem dois "equivocos" ai nestas declarações. Primeiro: o PT, a muito tempo deixou de ser um partido de esquerda, é social-democrata de centro direita. Só se compara ao governo FHC e não com os governos de Chavéz e Evo. Aliciou os movimentos sociais(a paz que a burguesia sempre almeja). Segundo: partidos como o PP e PTB, são partidos tradicionalmente de direita e não de centro.
Portanto, o PT através do Sr. Tarso Genro(prática corrente no PT), usa de uma retórica para passar por esquerda e um pragmatismo pequeno burguês para enganar a grande massa de trabalhadores e do povo excluído, firmar seu agrado a ideologia burguesa prestigiando a hegemonia do grande capital. Isto é pratica de partido de esquerda?

O delírio eleitoreiro Ptista! Sintoma do estado terminal desse partido que cresceu como rabo de cavalo desde que aprendeu com a direita a fórmula de ganhar eleições!

Abraço fraterno,
Raoul José Pinto

Omar disse...

Realmente ficou uma contradição eleitoral no ar que ninguém ainda conseguiu explicar adequadamente. Quem sabe o passar do tempo nos dê a isenção necessária para entender.
Apenas do ponto de vista eleitoral, quem pensou que a vitória de Tarso no RS traria de bandeja a Prefeitura da Capital nas próximas eleições - e foram muitos os que pensaram - pode ir botando a barba de molho...
Mudando de assunto, que me parecer que o bloguista está de implicância com o Prefeito de São Leo. hehehe

Anônimo disse...

Ô Urubuzada seu!

flavio

Maurício Santos disse...

Caro Feil, boa análise, como sempre, mas eu gostaria de pontuar o seguinte: qual seria a diferença de votos entre Serra e Dilma no RS se não houvesse a tal mobilização de 14 de outubro? Na sua opinião, parece que não haveria diferença ou, talvez, a diferença pendesse a favor de Dilma como no primeiro turno; é isso? Mas e se essa mobilização evitou uma diferença ainda maior a favor do odioso tucano? Não temos como saber, eu apostaria na última possibilidade: a mobilização foi boa, não consigo pensar razões para defender o contrário.
Já a explicação para esta diferença de votos nos dois turnos, pra mim, não necessita de grandes elocubrações sociológicas e de ciência política: uma parte considerável dos votos nas democracias representativas são altamente flutuantes, sem vínculos ideológicos ou mesmo reais (no sentido de relações sociais por categoria, classe etc.). É um fenômeno simplesmente imprevisível quanto a sua atualização ou quantificação; puro acaso pautado por percepções fragmentadas e emebebidas em marketing eleitoral de última hora, mais assaltos da mídia e mais um monte de fatorezinhos imponderáveis; tudo isso, é claro, emoldurado por uma terrível falta de formação política e acesso a informação altamente distorcida e direcionada (à direita). Acho que isso vai continuar ocorrendo por muito tempo em maior ou menor escala aqui no mundo sublunar, até que tenhamos diversidade nos meios de comunicação e cultura/educação realmente democratizados e altamente valorizados (o que pode acarretar em formação e participação políticas). Aí talvez a coisa melhore e uma parte maior dos votos siga algum tipo de racionalidade.

Anônimo disse...

Parabéns, Feil! Alguém precisa dizer isso! Na segunda-feira eu resumi a situação, em uma conversa familiar, da seguinte forma: "O Rio Grande do Sul hoje acordou vermelho ... de vergonha!" Que vergonha um discurso como o do Zé Chirico (de ultra-direita, religioso, hipócrita, canalha) ser o mais votado no RS! E isso que uma das princiais pautas da eleição era a questão do Pré-Sal (ou seja, havia um tema que se conectava com o velho trabalhismo, especialmente o brizolista). Ora, fazer campanha eleitoral no RS com um tema desses na mão é uma barbada! A Dilma já largava de uns 40%, no mínimo. E o PT (e o seu "frentão", como tu bem registras) conseguem a proeza de perder a eleição aqui? Haja desmobilização! Haja cargo sendo distribuído (vai ver o pessoal já estava muito ocupado procurando apartamento pra alugar em Porto Alegre para janeiro ...). E o grande responsável por isso, ao menos até prova em contrário, é Tarso Genro. Ele tem que assumir esse fiasco.
Carlos

Matheus M.H. disse...

Feil, fugindo da pauta, gostaria que fizesses uma síntese do que foi e do que promete o chamado "fenômeno Marina" (onda verde, coisa que o valha). Enfim, não parece nada de novo, mas, ainda assim, configura uma nova correlação de forças.
obrigado!

Anônimo disse...

Só uma questão: quando ganhamos, ganhamos, quando perdemos, só 'eles' perdem?
Ao deixar o Serra crescer e superar a Dilma, a falha foi nossa, de TODOS, não podemos simplesmente empurrar a culpa para cima do Tarso e do Ary.

Anônimo disse...

Em São Leopoldo, a Dilma ganhou com uma boa vantagem. A diferença pró Serra saiu principalmente de POA, Santa Maria e Caxias do Sul, três cidades que já administramos e que nas últimas eleições para a prefeitura optaram pela direita declaradamente anti-PT. Está na hora do mea culpa e, principalmente, da autocrítica.

Anônimo disse...

Em Livramento ganhou a Dilma!

Anônimo disse...

Perguntas que carecem de resposta. Não basta termos vencido. É preciso entender o que aconteceu no politizado estado do RS.

armando do prado

Jordi disse...

Pois é, meus caros, diferença pró-Serra em Caxias... alguém vai culpar automaticamente o Pepe Vargas? E por que o Aécio deu uma surra em Minas, mas a Dilma lavou a égua lá? Certamente não por ser mineira. Quanto a reuniões com TJ, etc, e distribuição de cargos, acho engraçado alguém perguntar se 'a Dilma está ciente'. O que acontece de diferente no governo Lula-Dilma? Inclusive apoiaram o rede-globista do Helio Costa, a Roseana, pelo visto seguiremos de Jobim, etc.
E alegar que o pré-sal é "tema que se conectava com o velho trabalhismo, especialmente o brizolista"? Pelo amor de deus, nossos avós já são uma pequena porcentagem do eleitorado, até onde se acha que essas relações políticas perduradão? Se fosse assim o PDT governaria por aqui, o que não faz desde o Collares. Deve ser por isso que perdemos para dois idiotas como Rigotto e Yeda...

O que não vi ninguém comentar é o preço que PDT-Fortunatti acham que vão cobrar pelo apoio ao governo estadual na eleição para a prefeitura de Porto Alegre.

Anônimo disse...

Frentão no Plaza, é? Bueno... carece de maiores explicações... outras épocas, outras figuras - Olívio,por exempo - seria no Tesourinha.

Flics

Anônimo disse...

Poxa...depois de ler o texto, penso que talvez teria sido melhor para o RS a Yeda ter sido eleita novamente...vai ser do contra lá na casa do c.

Em tempo: o comentário do sotaque foi lamentável e preconceituoso

atenciosamente

Bruno

Cavalca disse...

Importante avaliação, Feil. Esse pessoal se preocupa tanto com o lado eleitoral e competitivo da política e no entanto na hora de avaliar o quadro da conjuntura onde é preciso decompor o resultado eleitoral aí eles esquecem a voz das urnas e selecionam só o que lhes interessa.

guga disse...

excelente!!!!!!!!!!!!

SBENTENAR disse...

- Uma situação que me intrigou e me fez coçar a cabeça !! Vierinha da Cunha como Secretário da Justiça?? Não foi aquele algoz da famigerada "CPI da Segurança" ?? Aquele que em conluio com a RBS e a oposição raivosa propiciaram o mais escandaloso caso de descontituição da imagem de Olivio Dutra e de seu governo? Take off me the tube, como dizia o velho comediante!!

Gilmar Antonio Crestani disse...

Perfeito. Hão de se lembrar que para tirar Olívio da reeleição, Tarso & Vanazzi compraram aquela pesquisa de quintal do Hélgio Trindade, da Methodus. O Tarso é um Antonio Britto com camiseta do PT. Votei nele, de nariz tapado, como muitos gaúchos. Além do mais, Tarso é comensal do Sirotskys, em Ipanema, a quem vez que outra pede água. Leva um ponta-pé na bunda, mas sempre volta. É de sua natureza.

bragarowski disse...

Correto, a vitória do Serra/Yeda no segundo turno ainda carece de avaliaçao. Correto tb que a campanha foi frouxa. Deixamos a Ana Amélia/Perondi/Osmar Terra/PMDB mobilizarem suas "bases". Registro exceção na região Celeiro do RS, que dos quase 88 mil votos validos, Dilma fez ao redor de 60 por cento, nos 21 municipios. Ganhou em todos. Mas combinamos discutir a composiçao do futuro governo Tarso somente após a contagem dos votos no segundo turno.
Pelo jeito, vamos pegar as sobras das sobras...

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