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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Via religiosa fica estreita para tratar da agenda moral


Por isso, religiosos apostam na via política para impor seus velhos temas morais

Muitos líderes católicos e evangélicos falam abertamente em nome de uma “maioria moral” cristã. Muitos deles querem impor sua moralidade estrita ao conjunto da sociedade brasileira pela via política, já que a via religiosa se mostra relativamente limitada para tanto. Quanto a isso, basta considerar que a maioria das centenas de milhares de abortos no país é realizada por católicos e evangélicos. Da mesma forma, a esmagadora maioria de homossexuais brasileiros é composta por católicos e evangélicos. E, boa parte deles, certamente gostaria de ter o direito à união civil e também ao casamento civil e tornar seus direitos equitativos aos de heterossexuais.

Dirigentes católicos e evangélicos engajados nessa cruzada moral não têm o menor apreço pelos direitos sexuais e reprodutivos defendidos por feministas e homossexuais. Preferem ignorar a pluralidade e os direitos das minorias, no caso da união civil de homossexuais, e os direitos de autonomia sobre o próprio corpo no caso das mulheres que optam por interromper uma gravidez indesejada por motivos diversos.

Para tentar assegurar sua moralidade tradicionalista e estrita para o conjunto da sociedade, católicos e evangélicos procuram pressionar candidatos, partidos e governantes em momentos eleitorais para que assumam compromissos morais e políticos estabelecidos por esses religiosos. Isso revela que dirigentes católicos e pentecostais têm grande presença, influência e poder na esfera pública brasileira. Caso contrário, os candidatos não obedeceriam como cordeirinhos, como fizeram Dilma e Serra, às ordens e exigências destes religiosos.

Outra forma de tentar fazer valer sua moralidade para todos consiste em eleger representantes religiosos para o Congresso Nacional, como têm feito evangélicos e católicos, sobretudo os da ala carismática. Outra estratégia empregada com esse fim é o uso sistemático da mídia religiosa, especialmente a eletrônica, para opor-se ao aborto, à união civil de homossexuais e defender uma moral cristã. Tais campanhas impedem que tais questões, sobretudo a do aborto, sejam debatidas a partir de perspectivas seculares da área da saúde pública, da medicina, dos direitos reprodutivos. Isto é, criam sérios obstáculos à secularização desse debate e ao tratamento racional e humanitário dado a este grave problema de saúde pública. [...]

Trecho de entrevista do sociólogo Ricardo Mariano concedida ao portal IHU/Unisinos. Mariano é professor da PUC/RS e autor da obra "Neopentecostais: Sociologia do novo pentecostalismo no Brasil".

3 comentários:

Anônimo disse...

O avanço, sobre a sociedade brasileira, do obscurantismo religioso em seus diversos matizes, é um fenômeno extremamente preocupante e q ficou escancarado nessa campanha eleitoral.
Ainda vamos pagar o preço por isso, se o estado republicano ñ conseguir impor-se a essas hordas religiosas. Há um perigo muito grande de retrocesso da vida institucional brasileira.
A provável vitória da Dilma ñ indica q estaremos livres disso. Enquanto o campo progressista ñ conseguir arrancar das mãos das máfias religiosas a bandeira de guardiões da moral, questões como a do aborto estarão sempre em pauta nas nossas disputas eleitorais, com pleno apoio das manadas de devotos e da classe média hipócrita e cínica.
Dilma precisa resolver essa questão de uma vez por todas, pois o tema certamente voltará nas próximas eleições.

Eugênio

Cristóvão Feil disse...

Sim, é preocupante, Eugênio. Mas veja a entrevista acima, que postei de propósito para contrapor a essa ameaça latente.

Os moralistas invadem a cena político-eleitoral justamente porque não encontram interlocutores e ouvintes na faixa (estreita) da religião. A meu ver, com isso eles se danam. Politizar a religião é um erro primário, especialmente numa democracia republicana. OK, nem tão democracia, nem tão republicana, mas não somos o Turcomenistão.

Esse debate é "bão".

Abç.

CF

Lucas Jerzy Portela disse...

"a esmagadora maioria de homossexuais brasileiros é composta por católicos e evangélicos"

um contra-senso! se a desvinculação radical entre prazer sexual e reprodução sexuada que a homossexualidade, e só ela (como escolha exclusiva), proporciona serve para algo, deveria servir para junto com o mito da paternidade jogar fora o mito do Pai.

Como se vê, a maior parte dos homossexuais não são dignos de sê-lo. E nem estou computando os ainda em maior número heterossexuais que eventualmente transam com homens, os enrustidos, os bissexuais por desculpa moral, etc etc.

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