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quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

As três pragas que corroem a educação


O que sobrou da sala de aula

Já foi o tempo em que a educação fazia parte do cardápio de otimismos que se costuma apresentar nas passagens de ano. No último meio século, a educação pública e gratuita, que garantira a formação de grandes nomes e grandes competências nas várias profissões, que assegurara o grande salto da sociedade escravista à sociedade moderna, foi progressivamente diminuída e até injustamente satanizada em nome de interesses que não são os do bem comum. O estado de anomia em que se encontra a educação brasileira pede, sem dúvida, a reflexão crítica dos especialistas, mas uma crítica que a situe na trama própria de tendências problemáticas da modernidade sem rumo para que seja compreendida e superada.

A educação brasileira foi atacada por três pragas que subverteram a precedência do propriamente educativo na função da escola e do processo educacional: o economismo, o corporativismo e o populismo. O economismo na educação não distingue entre uma escola e uma fábrica de pregos. A pedagogia do economismo confunde aluno com produto e trata a educação e o educador na perspectiva da produtividade, da coisa sem vida, da linha de produção. Importam as quantidades da relação custo-benefício. Não importa se da escola não sai a pessoa propriamente formada, transformada. Importam os números, os índices, os cifrões. Presenciei os efeitos dessa mentalidade na apresentação de um grupo de militantes da causa das cotas raciais perante o conselho universitário de uma das três universidades públicas de São Paulo, de que sou membro. Aliás, nenhum deles propriamente negro: "Não queremos vagas em qualquer curso; queremos em engenharia e medicina, cursos que dão dinheiro", frisaram.

Quer o governo que os royalties do pré-sal sejam destinados à educação e nem temos certeza de que isso acontecerá. Os políticos têm outras prioridades, especialmente a das urnas. Já estamos gastando o dinheiro que ainda não saiu do fundo do mar. Mas não sabemos em que esse dinheiro fará o milagre de transformar, expandir e melhorar a educação brasileira e de elevar substancialmente o nível da formação cultural das novas gerações. Dinheiro não educa. Quem educa, ainda hoje, é o educador. É inútil ter máquinas, computadores, tecnologia, maravilhas eletrônicas na sala de aula se, por trás de tudo isso, não houver um educador. Se não houver aquele ser humano especializado que faz a ligação dinâmica entre as possibilidades biográficas do educando e os valores e requisitos de um projeto de nação, a nossa comunidade de destino. Se não houver, sobretudo, a interação viva entre quem educa e quem é educado, se não houver a recíproca construção de quem ensina e de quem aprende. Se não houver a poesia deste verso de Vinicius de Moraes: "E um fato novo se viu que a todos admirava: o que o operário dizia, outro operário escutava".

corporativismo transformou o professor de educador em militante de causa própria porque a serviço da particularidade da classe social e não a serviço da universalidade do homem. Não há dúvida de que o salário que valorize devidamente o educador e a educação é uma das premissas da revolução educacional de que carecemos. Do povoado do sertão ao câmpus universitário da metrópole, o educador tem carências que não são as carências do Fome Zero. Educação não é farinha de mandioca. "Quem não lê, mal fala, mal ouve, mal vê", dizia Monteiro Lobato, em relação a um item da cesta básica do educador. Fome de educador não é fome de demagogo nem pode ser. Privá-lo dos meios para se educar, reeducar e poder educar é desnutri-lo.

A partidarização de todos os âmbitos da sociedade brasileira, até da religião, levou para dentro da educação os pressupostos da luta de classes. O militante destruiu o educador, drenou da educação a seiva vital que lhe é necessária para ser instrumento de socialização, de renovação e de criação social. A educação só o é na perspectiva dos valores da universalidade do homem, como instrumento de humanização e não como instrumento de segregação e de polarização ideológica, instrumento do que separa e não instrumento do que junta. Na escola, a ideologia desconstrói a escola em nome do que a escola não é.

populismo, por sua vez, transformou a educação em meio de barganha política, instrumento de dominação, falsificação de direitos em nome de privilégios. O direito que nega a universalidade do homem nega-se como direito. Pela orientação populista, o importante não é que saiam da escola alunos bem formados, capazes de superações, gente a serviço do País. Nas limitações desse horizonte, o importante é que da escola saiam votos, obediências, o ser carneiril das sujeições, e não o cidadão das decisões.

A escola vem sendo derrotada todos os dias, do jardim da infância à universidade, pela educação difusa e extraescolar dos poderosos meios de produção e difusão do conhecimento que já não estão nas mãos do educador. A escola é cada vez mais resíduo de poderes e vontades que estão longe da sala de aula.


Artigo do sociólogo José de Souza Martins, publicado no Estadão, edição de 30/dez/12.

8 comentários:

Carlos Eduardo da Maia disse...

A educação também tem de preparar não apenas para a necessária cidadania, mas também para o mercado. Esses são os dois objetivos e desafios.

O que fica complicado é o corporativismo dos sindicatos que, como é o caso do CPERS, quer manter um plano de cargos da década de 70 para uma educação do século XXI.

Anônimo disse...

Quando um burro fala, Maia, os outros...
Ainda mais quando é um burrão desses bem preparado, bem escolado, e que já viu muito do mundo diante de si.
Nessas horas os burros, ainda mais os que vêem o mundo pelo monitor do computador, devem baixar bem as orelhinhas e escutar com todo o respeito.
E reler com atenção o que foi ensinado, quantas vezes for preciso.

Anônimo disse...

Nosso País é uma vergonha mesmo. Empossar como Deputado Federal um criminoso condenado pela mais alta corte, jurando cumprir a Constituição? Morro e não vejo tudo.

irton fel disse...

Anônimo das 15:31 você já morreu e viu tudo. Você viu a privataria tucana, do teu querido FHC, e não falou nada, ficou em completo mutismo. Agora vem escrever bobagens em um dos melhoes blog do Brasil.
Tenha dó...

Anônimo disse...

Morro e não vejo tudo.
Juiz da "mais alta corte" dando carrinho em zagueiro, cabeceando a gol, apitando e cobrando penalti só para fazer a alegria dos recalcados da tucanaria.
Esse trubufu jurídico eleitoreiro, a mais "alta corte" posta a serviço do calendário tucano faz a alegria dos Maias da vida.
Pessoalmente, deveria ser motivo de vergonha para que tem um neurônio livre pensador.

Anônimo disse...

O que Anônimo disse é bobogem por que Sr. Irton? Até o Sr. prove em contrário o que ele disse, trata-se da mais pura verdade.

Anônimo disse...


Eu também as vezes discordei de decisões da "mais alta corte" e tive que acatar. Por exemplo quando o amigo e advogado do PT Márcio Thomaz Bastos era Ministro e arquivou sumariamente o processo contra o Olivio Dutra e sua atuação no Clube da Cidadania que os petista juram, a exemplo do mensalão, que nunca existiu.

Anônimo disse...

@ irton fel
O teu comentário é um exemplo da partidarização sem sentido que assola o país.

Me explique onde que o colega Anonimo das 15:31 se mostrou PSDBista ou admirador do FHC. Me aponte onde ele se defende a omissão em relação ao mensalão tucano.

Me parece que no teu mundo preto e branco é muito complicado imaginar alguém que tem vê os acontecimentos pelo prisma da política e da ética e não pelo partidarismo.

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